1. Costa tem feito progressos notáveis ao nível dos recursos de expressão corporal e gestual. Um esforço que favorece a eficácia comunicacional das suas intervenções públicas. Vejamos como: a) Gestos amplos, com boa rotação dos braços; b) Gestos verticais, cadenciados, a acompanhar afirmações mais assertivas, pensando no prime time desse dia; c) Postura corporal afirmativa, puxando o centro de gravidade para a frente; d) rotações amplas com o tórax; e) Fácies confiante e enérgico, deixando escoar emoções nos momentos certos; f) Discurso estruturado de modo a combinar o mérito das propostas e soluções alvitradas com críticas ao oponente, num compasso binário excelente para comícios. Só falta adoptar aquele recurso muito utilizado nas campanhas eleitorais americanas, e que consiste em, no início ou no fim do discurso, o candidato apontar para a plateia simulando que está a cumprimentar individualmente alguns dos seus eleitores. Este último “truque” faz todo o sentido num país erguido, em grande medida, sob a filosofia política de Locke e o “seu” “Contrato Social”. Em Portugal, país paroquial, corporativo e afeito ao compadrio, fala-se para as massas a partir de um púlpito. O indivíduo é uma realidade desprotegida e atípica. Quase como no Oriente.
2. A maioria das sitcom ou são gravadas ao vivo, ou, mais comum, na mistura sonora são colocadas risadas pré-gravadas, a seguir às deixas consistentemente cómicas. E se acontecesse o mesmo, embora com sinal inverso, nos dramas realmente trágicos? Imaginemos uma cena com um coração destroçado, um luto prolongado, um romance impossível, uma morte brutal, crianças negligenciadas, ou animais de estimação abandonados. Porque não abrir um espaço para, em fundo, se ouvir um coro de carpideiras? Não estaria mais de acordo com as regras da tragédia clássica?
3. E porque não alterar radicalmente a lei das autarquias locais? Basicamente, deixaria de haver executivos municipais eleitos directamente. Substituídos por comissões de gestão, constituídas por gestores profissionais, urbanistas e um visionário. A sua designação seria efectuada pela assembleia municipal, único órgão eleito por sufrágio directo e universal, sob proposta da Comissão Europeia. Para bloquear o caciquismo partidário, haveria uma lista de impedimentos ao exercício do cargo, nomeadamente os membros da comissão não pertencerem a qualquer partido político, não residirem no concelho, nem aí terem interesses de qualquer tipo. O gabinete teria poderes plenos para executar o programa de que foi incumbido e só responderia diante da CCDR respectiva. A AM seria um órgão meramente consultivo, podendo ainda assim apresentar propostas. Quanto às freguesias, disporiam de uma Junta proporcional à população, designada pela comissão executiva, com parecer da AM. Todos os concelhos com menos de 15.000 habitantes seriam agregados.
4. Estamos sempre um bocadinho à frente do abismo, um palmo atrás do lugar onde desejaríamos estar e quase tão alto quanto os sonhos permitem. No primeiro caso, só olhamos para o caminho para escapar ao tempo. No segundo, só o fazemos para chegar ao destino antes que a noite caia. No terceiro, só mesmo para não tropeçarmos na berma. Alguns, poucos, não olham. Caem. Esquecem. Voam. Nem sempre por esta ordem.
5. Recentemente, li o seguinte nos classificados de um jornal local: “Homem só busca romance consigo mesmo”. Como é de supor, o autor não deixou contactos. Geralmente, delegamos a responsabilidade de brindarmos afecto a outras pessoas e enfadamo-nos quando não obtemos o que desejamos. E ainda que pareça pretensioso, queremos dar-nos isso que ninguém nos pode outorgar. Porém, ignoramos o que é que desejamos realmente de nós para nós. Imaginei logo um bom começo para um romance. Significa muito saber que nos buscamos de forma autêntica. Quem sabe o que se irá passar quando nos encontramos? Parece absurdo, mas talvez seja esta uma das inúmeras maneiras de tolerar o isolamento no mundo contemporâneo. O mais provável é que esteja a exagerar, como sempre. Qual será a seguinte cena: um encontro às cegas, flores no trabalho, chocolates, cinema, sexo…? Tudo é possível…
* No calendário ogham celta, significa “hera”
** O autor escreve de acordo com a antiga ortografia