Faça-se luz: Humphry Davy

Escrito por António Costa

Nos primeiros anos do século XIX, muitos cientistas construíram pilhas voltaicas cada vez maiores e mais potentes para gerar “correntes galvânicas” mais poderosas e duradouras. Em Londres, não muito longe de Piccadilly Circus, nascera a Royal Institution com a intenção de se transformar no organismo de investigação e divulgação científica mais importante no mundo. No seu laboratório, um jovem químico em ascensão, chamado Humphry Davy (1778-1829), dedicava-se à construção de pilhas enormes para os seus estudos inovadores.
Davy é uma personagem interessante, porque exemplifica a transição da ciência amadora para a ciência profissional que se deu naqueles anos. De formação autodidata, a sua assombrosa intuição científica levou-o de modo fulgurante para muito longe da sua origem rural. Aos 23 anos era professor de química da Royal Institution e seu principal conferencista. Foi um dos últimos cientistas amadores e um dos primeiros profissionais. As suas conferências, preparadas com grande sentido do espetáculo e clareza extrema, atraíram não apenas investigadores, mas também curiosos, ricos e artistas. Como era atraente e carismático, a sala enchia-se de jovens senhoras com vestidos elegantes para o ouvirem falar sobre os abstrusos mistérios da eletricidade e da química.
Foi Davy que, em 1807, demonstrou que a eletricidade produzida pela pilha voltaica provinha de interações eletroquímicas. A seguir, depois de construir uma pilha com duas mil placas duplas, demonstrou que o contrário também era verdadeiro: os compostos químicos podiam decompor-se nos seus elementos básicos através da eletricidade, mediante o processo que viria a denominar-se eletrólise. Decompôs compostos de magnésio, bário e estrôncio, isolando estes elementos químicos, e também isolou elementos totalmente novos, como o potássio e o sódio. No ano seguinte, foi nomeado diretor da Royal Institution e recebeu o título de “Sir”.
Mas a descoberta elétrica visualmente mais espetacular de Sir Humphry foi o arco elétrico. Na sua conferência mais brilhante – em sentido literal – utilizou uma bateria potente para transmitir energia a dois bastões de carvão aguçados que segurava nas mãos. Quando a eletricidade começou a fluir pelo primeiro bastão, Sir Humphry tocou com ele na ponta do segundo, tendo-se produzido uma faísca ofuscante. A audiência ficou ainda mais assombrada quando, ao separar progressivamente os bastões, a faísca foi-se alongando até formar um arco brilhante de luz azulada, tão resplandecente que magoava a vista.
A emocionante descoberta de que uma corrente elétrica potente podia viajar num arco elétrico e gerar um brilho lumínico muito intenso desencadeou uma corrida a nível mundial para produzir comercialmente a luz do arco. Mas o desafio tornou-se pouco fácil. Naquele momento, nem sequer havia baterias que pudessem fornecer energia de modo rentável a essa luzes durante as horas necessárias. A arte da eletricidade ficou paralisada, enquanto cientistas e experimentadores frustrados tentavam, ano após ano, decifrar a montanha de segredos que a eletricidade ainda escondia. Os tempos pioneiros dos sábios, que se tinham dedicado à experimentação por conta própria, davam lugar à era moderna dos cientistas universitários e dos inventores organizados em oficinas, tendo como alvo a rentabilidade comercial.

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António Costa

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