Enquanto houver estrada para andar

Escrito por Pedro Fonseca

“Sejamos claros, Portugal vira à direita e dá a um partido antissistema o maior número de deputados, sem ser PS e PSD, desde os anos 80. O número falhado de políticas públicas permitiu capturar um eleitorado que se estende desde as pessoas mais iletradas aos professores mais descontentes, apelando à falta de condições dadas nos últimos anos a estes, passando pela polícia e pelas Forças Armadas, com o desrespeito significativo que têm vindo a sofrer. “

A frase é do genial Jorge Palma e, à partida, a gente vai continuar. Mas este texto é pouco genial ou sequencial, dado que os resultados eleitorais deixaram a sociedade portuguesa na incerteza das decisões.
Sejamos claros, Portugal vira à direita e dá a um partido antissistema o maior número de deputados, sem ser PS e PSD, desde os anos 80. O número falhado de políticas públicas permitiu capturar um eleitorado que se estende desde as pessoas mais iletradas aos professores mais descontentes, apelando à falta de condições dadas nos últimos anos a estes, passando pela polícia e pelas Forças Armadas, com o desrespeito significativo que têm vindo a sofrer. E é para esses que Ventura fala, quando no fim se propõe mudar o país. Através de uma grande capacidade retórica, acompanhada de uma crescente tendência nas redes sociais para aliciar jovens a votar no partido que tem resultado, e, assim, o Chega passa de um partido pequenino, sem assento parlamentar em 2019, para uma força com quase 50 deputados em 2024. Então, mas quem ganha? Provavelmente ninguém. A Iniciativa Liberal e o Livre foram aqueles que, graças a uma grande campanha de Rui Rocha e Rui Tavares, tiveram a melhor capacidade de se autoproclamar como vencedores, com a manutenção e subida de deputados, respetivamente. Mas mesmo esses perdem, não transformando os votos úteis num Parlamento ligeiramente mais moderado.
Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos saem como perdedores, no sentido em que os portugueses não reconheceram as valências necessárias para liderar um país aflito pela inflação e pela crise económica. Nem as entradas de ex-líderes partidários, como Durão Barroso, Pedro Passos Coelho ou António Costa, conseguiram mudar a perceção do país e, ao que parece, prejudicaram mais. Costa abafou Pedro Nuno com a sua participação no Porto e em Lisboa, enquanto os históricos da AD colocavam Montenegro em condições difíceis com declarações polémicas. Mesmo tendo sido os mais votados, saem como derrotados.
Em 2016, Ricardo Araújo Pereira referia, relativamente ao número de campeonatos ganhos pelo Porto ao Benfica em 30 anos, que «alguém andou a dormir». O mesmo se pode aplicar às duas grandes forças, que estiveram impreparadas para lidar com as causas que um furacão destes traz à sociedade portuguesa. Não sejamos iludidos, se os partidos moderados quiserem acordar, tem de ser agora. Até porque André Ventura começou a campanha no dia das eleições e 9 de julho (eleições europeias) está mesmo aí à porta.

Pedro Fonseca, aluno de doutoramento em Ciência Política pela Universidade de Aveiro

Sobre o autor

Pedro Fonseca

Leave a Reply