Uma das conquistas do 25 de Abril, o Serviço Nacional de Saúde (SNS), não pode ser consecutivamente alvo de ataques por parte dos responsáveis no desinvestimento na prestação de cuidados de saúde públicos, mais ainda quando, numa análise rigorosa do trabalho realizado nestes últimos dois meses, das experiências recolhidas, das necessidades identificadas e dos meios necessários para combater o surto epidémico e regularizar a atividade normal do SNS, se constata pela necessidade de intervenção imediata com um plano de emergência para reforço do SNS. Mas o que vemos, infelizmente, são biliões para o setor financeiro e uns meros 500 milhões para reforço do SNS. Analisando detalhadamente, verificamos a porta aberta aos interesses instalados com a proliferação do setor privado da saúde tentado mais uma vez capturar o Orçamento de Estado.
Há opções ideológicas claras por parte do PS, PSD e CDS, agora com a ajuda dos extremos de direita fascista, para castrar decisões políticas com vista ao reforço das transferências OE para o SNS e acabar com a aplicação da lei dos compromissos na saúde.
É urgente acabar com o subfinanciamento crónico a que foi sujeito por sucessivos governos, torna-se premente que sejam reforçadas as transferências do OE (no mínimo e no imediato, 25% do orçamento do SNS, tendo em conta que os meses de março, abril e maio foram dedicados apenas à Covid-19) para dotar os serviços dos montantes necessários à prestação de cuidados e de investimento, bem como a autonomia das unidades de saúde.
É fundamental terminar com a aplicação da lei dos compromissos neste sector.
Quais as razões da não mobilização e modernização da capacidade de diagnóstico e terapêutica instalada no SNS? Quem liquidou a capacidade instalada no Hospital Nª Sra. da Assunção, em Seia? Quem desinvestiu nos CSP? Quem encerrou extensões de saúde? Quem encerrou ou concentrou serviços públicos de saúde? Uma singela resposta: os sucessivos governos do PS, PSD e CDS, juntos ou sozinhos, e com a aplicação administrativa dos sucessivos CA da ULS da Guarda, nomeados pelos respetivos governos e com a conivência de interesses corporativos instalados, estes assentes na proliferação da promiscuidade público-privado.
Não compreendo quando conseguimos na Universidade da Beira Interior a instalação da Faculdade da Ciências da Saúde, quando reforçámos a mobilização e modernização da capacidade de diagnóstico e terapêutica nos hospitais do interior do país, seja pela via da imagiologia, seja pela excelente capacidade instalada no nosso laboratório de saúde pública ou o laboratório da ULS Guarda, como outrora a disponibilidade instalada no HNSA, e não haja vontade política dos decisores políticos e dos seus nomeados para que haja um efetivo alargamento da resposta pública, designadamente através da internalização nos hospitais dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica (incluindo de forma gradual a hemodiálise) e em articulação e contratualização com centros de investigação e desenvolvimento, em particular associados a unidades públicas de ensino superior na Beira Interior.
A quem interessa manter ou degradar a capacidade de resposta pública do SNS?
É fundamental uma revolução na alocação dos recursos humanos do SNS, não bastam processos de contratação, recorrendo sempre que possível às listagens de ordenação de candidatos de procedimentos concursais já efetuados; ou a conversão dos contratos dos trabalhadores contratados no âmbito do combate ao surto da Covid-19 para contratos com vínculo efetivo, é fundamental que haja coragem política, mesmo no meu partido, de sermos audazes ao impulsionar a obrigatoriedade de períodos de prestação no SNS após o investimento público formativo de médicos, enfermeiros e demais profissionais para que não haja a captura por parte dos grandes grupos privados ou a proliferação da subcontratação dos jovens profissionais através de empresas privadas para trabalharem nos serviços públicos de saúde.
Haja a convergência reivindicativa de todas as organizações coletivas de trabalhadores na defesa efetiva da generalização do vínculo público efetivo e da valorização das carreiras profissionais a todos os trabalhadores que o desejem com possibilidades de acréscimo da remuneração e dos dias de formação associado ao tempo de serviço.
Se há centenas de jovens que emigram para se formarem em Medicina em Espanha, República Checa ou noutro país, devemos garantir o seu regresso para fortalecer o SNS, nomeadamente na especialidade de Medicina Geral e Familiar, bem como fomentar a efetiva criação dos enfermeiros de família e não ficarmos por projetos-piloto. OS CSP são fundamentais para o reforço da promoção da saúde e prevenção da doença, um esteio fundamental na poupança a longo prazo do orçamento público.
É urgente a dedicação exclusiva ao SNS e sobretudo por parte de quem gere a causa pública, para que não preste cuidados de saúde no privado e em concorrência. É fundamental – e estratégico – para a soberania nacional dispormos de uma capacidade instalada para garantir e salvaguardar o acesso a medicamentos essenciais pelo SNS mediante a adoção de uma estratégia nacional de produção de medicamentos alicerçada na capacidade efetiva de fabrico de medicamentos pelo Laboratório Militar (no futuro Laboratório Nacional do Medicamento), ou promovendo parcerias estratégicas com as empresas de capital nacional que assegurem essa capacidade.
Reforçar o SNS como serviço público, universal, geral e gratuito, eficiente e eficaz, atribuindo ao sector social e privado um papel supletivo, é o caminho que melhor serve os interesses do país e dos portugueses na genuína coesão social e territorial. Trata-se de outras opções ideológicas por uma sociedade mais justa e fraterna para o nosso povo.
* Militante do PCP