E agora?

“E agora são estes contributos da sociedade portuguesa que o próximo governo não pode ignorar e que juntamente com a sua dinâmica política, poderão contribuir para o esbater das assimetrias regionais que minam profundamente a sociedade portuguesa. “

Volvido este intenso período eleitoral e apurados os resultados finais da eleição de 10 de Março, a vida quotidiana soma e segue e nós por aqui, nestes territórios de baixa densidade, mas de elevado potencial, cá vamos sobrevivendo, alimentados pela esperança mas extorquidos pela realidade.
Das eleições legislativas de 2022 para as de 2024 decorreram pouco mais de dois anos, no entanto, os eleitores inscritos no círculo eleitoral da Guarda diminuíram cerca de 3%, passando de 145.852 para 141.431. Neste curto período a nossa capacidade eleitoral diminuiu em 4.421 cidadãos, ou fazendo a comparação por outra via, é o equivalente a perder o concelho de Fornos de Algodres. Assustador!
Levando esta análise ao limite do absurdo e mantendo-se esta ordem de grandeza ao nível da tendência, daqui a 64 anos não restaria ninguém no distrito da Guarda ou, dito de outra forma, se esta propensão tivesse começado em 1960, hoje seríamos um deserto humano com 5.518 quilómetros quadrados. E o que se passa com a Guarda pode perfeitamente ser transposto para qualquer outro distrito raiano, pois, infelizmente, a realidade é semelhante.
Daqui decorre que a coesão territorial deverá ser um urgente desígnio nacional, uma vez que, se resolvermos os problemas do interior, estamos seguramente a contribuir para a resolução dos do litoral. O programa eleitoral da AD diz-nos que «…a coesão territorial e a descentralização são as bases da coesão social, da dinamização económica e da participação cívica. Queremos um território equilibrado, que reduza as assimetrias regionais, que promova a mobilidade e a acessibilidade, e que reforce a solidariedade entre o litoral e o interior. Queremos uma descentralização efetiva, que aproxime os cidadãos dos centros de decisão, que fortaleça o poder local e regional…». E este “mantra” deverá estar sempre presente na acção política do próximo governo que tomará posse no dia 2 de Abril.
Em 2017, um conjunto de personalidades políticas, académicas e empresariais, partilharam e associaram-se à visão inovadora de Álvaro Amaro, formando um movimento inorgânico, transversal à maioria do espectro político nacional, autodenominando-se de “Movimento pelo Interior”. Fruto desse trabalho, foi produzido um documento notável, no qual foram apresentadas 24 medidas, distribuídas por três eixos e que ainda hoje, de um modo geral, mantém a sua validade e pertinência. Mais recentemente, em Fevereiro de 2024, alguns dos signatários do referido movimento, voltaram à carga, pedindo aos partidos políticos em pré-campanha que se pronunciassem quanto à actualidade e execução das medidas então propostas, pois entendiam que nos últimos cinco anos, a acção governativa nesta matéria foi “tímida”.
E agora são estes contributos da sociedade portuguesa que o próximo governo não pode ignorar e que juntamente com a sua dinâmica política, poderão contribuir para o esbater das assimetrias regionais que minam profundamente a sociedade portuguesa.
E agora, que um novo governo se avizinha, lanço a sugestão para a criação de um Fundo Nacional para a Coesão, que se constituísse como uma das fontes de financiamento dos territórios de baixa densidade e fizesse jus à tão elementar solidariedade territorial que o centralismo de Lisboa tanto gosta de apregoar.
E agora, aguardemos…

* O autor escreve ao abrigo dos antigos critérios ortográficos

Sobre o autor

Ricardo Neves de Sousa

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