Nos tempos que correm e nas circunstâncias que ocorrem, socorro-me da frase de João Guimarães Rosa: «Medo não, mas perdi a vontade de ter coragem».
Estamos em plena campanha eleitoral de um plebiscito que deveria ter sido evitado, que irá reposicionar tudo mais ou menos na mesma, e que a partir de 30 deste mês serão atribuídas culpas a esmo, e logo se irá ver quem aparecerá assim como o dragão no nevoeiro escocês de Loch Ness.
“Ninguém experimenta a profundidade de um rio com os dois pés” é um provérbio bantu que exprime um pouco a situação prevalecente. Uns porque queriam reafirmar poder pessoal, outros afirmarem o seu “grupo de status”, uns quantos a tentarem dar resposta a sensibilidades internas, poucos a tentarem forçar o mando sozinhos, e também alguns que tendo tudo um pouco a ganhar fazem o estardalhaço habitual contra uma democracia que lhes dá visibilidade e palco, para abastardização dos valores de solidariedade e liberdade. Sobre estes últimos lembro a frase de Hélia Correia: «A ameaça da ignorância muda de face, mas não muda de maldade».
Não estou entusiasmado, melhor estou quase abúlico, em relação a um processo eleitoral que nada augura de bom e que tem sido de uma confrangedora falta de ideias e propostas, pelos intervenientes de sempre nalguns casos e de há muito noutros.
Os raros debates que vou vendo são entediantes, os que viraram comentadores andam sempre em volta dos lugares comuns, e a prepararem-se para dizer em breve tudo ao contrário do que previram com o mesmo ar cândido com que hoje vertem verdades absolutas.
Ao interior lá aparecem com um ar sorridente, mas simultaneamente enfatuado, os que encontraram com assinalável esforço de encosto as prebendas de um lugar de fato e gravata, que me faz sempre lembrar o anúncio da lisboeta Rosicler nos anos 60 do século passado: “A loja que veste hoje o homem de amanhã”!
Em suma, vem oferecer milhões para milhares de coisas, sem que haja alguém que faça a comezinha pergunta: como se obtém dinheiro para tudo isso?
É o folclore habitual do muito que virá, mas que se perde no caminho.
Por falar em idas e vindas, e como sou um utilizador de comboios, resolvi um destes dias voltar a Lisboa pela renovada Linha da Beira Baixa. Apanhei o Intercidades na Guarda e lá fui até Lisboa. Como vinha no mesmo dia resolvi fazer o percurso inverso, que me pareceu adequado. Porque preciso de uma ficha para utilizar o PC, e só a 1ª classe disponibiliza o serviço, utilizo-a com frequência, embora até ao Entroncamento não seja fácil arranjar bilhete nessa carruagem porque é ocupada por funcionários da CP e familiares, o que acho no mínimo ridículo, que quem paga o serviço fica sem a poder utilizar. A verdade é que até à Covilhã o comboio vinha composto, daí até à Guarda dei-me conta que era o único passageiro num percurso em que o comboio parou em cinco ermos, ou apeadeiros, e demorei 55 minutos. De Lisboa à Covilhã o comboio para em 8 estações e demora 3h40.
Poderia alongar-me, sobre a falta de limpeza, sabão e papel nas casas de banho, mas acho que é estoico fazer-se uma viagem a Lisboa de comboio, em que um passageiro anda 9 horas se quiser ir e vir no mesmo dia!
Como diz Gonçalo Miguel Tavares: «A impaciência dos passageiros não pode acelerar o comboio».
Bom Ano de 2022 e vamos tentando despandemizarmo-nos!
Despandemizemo-nos rapidamente!
“Em suma, vem oferecer milhões para milhares de coisas, sem que haja alguém que faça a comezinha pergunta: como se obtém dinheiro para tudo isso?”