Mais de 85% da população está vacinada contra o SARS-Cov2, mas as infeções voltaram a aumentar. Dizem-nos que a culpa é parcialmente dos que se não quiseram vacinar e mantêm por isso o vírus em circulação. Há, claro, a questão dos menores de 12 anos, também não vacinados, que convivem uns com os outros e transportam o vírus para dentro de suas casas, mesmo que eles próprios não fiquem doentes. A verdade é que bastam esses 15% não vacinados da população para manter a pandemia ativa e esta, perdida a esperança da imunidade de grupo, poderá recrudescer conforme formos perdendo os anticorpos ou a eficácia da vacina for diminuindo. Iremos receber a terceira dose, depois a quarta e assim sucessivamente todos os anos, ou todos os semestres, vaga após vaga após vaga.
Em Glasgow havia uma oportunidade para tomar as medidas necessárias ao abrandamento do aquecimento global. Sabe-se já que há danos que serão irreversíveis, com glaciares perdidos para sempre, espécies extintas, desertos que não voltarão a recuar. As dúvidas que havia sobre a influência humana nesse aquecimento desapareceram. O último relatório do IPCC, já de 2021, é claro nessa conclusão. Se não há dúvidas, se sabemos que as consequências serão catastróficas, porque não atuar já? Há quem não queira, como a Índia, que quer continuar a produzir e queimar carvão e à última hora se comprometeu apenas a reduzir a sua utilização. Mais uma vez é uma minoria a condicionar o futuro de todos.
Sabe-se que o combate contra as alterações climáticas passa pela mobilidade elétrica. O hidrogénio ainda vem longe e não se mostram resolvidas as questões de segurança. Precisamos por isso de veículos elétricos e de baterias de lítio. Portugal tem importantes reservas de lítio e a sua exploração poderia beneficiar o ambiente e a nossa economia, mas há problemas na sua extração porque as populações das regiões ricas em lítio opõem-se a que seja explorado, ironicamente em nome do ambiente. É um pouco como nos tempos da coincineração: tudo bem, desde que não seja no meu quintal.
Temos assim que se sabe o que é preciso fazer para combater as alterações climáticas, todos percebem a urgência da ação, mas a verdadeira palavra de ordem é “ainda não e que não seja aqui”.
O orçamento geral do Estado para o próximo ano é um dos mais importantes de sempre. É o orçamento que vai procurar relançar a economia depois destes dois anos de crise grave, com a possibilidade de distribuir os milhares de milhões que vêm da União Europeia. O orçamento apresentado pelo Governo tinha de certeza muitos defeitos, e muitos desses defeitos seriam certamente muito graves. Nenhum deles era apesar disso tão grave que pusesse o todo irremediavelmente em causa, ou que não pudesse ser corrigido na discussão na especialidade. Mesmo assim foi chumbado na votação na generalidade. O PSD votou contra porque votaria contra qualquer orçamento do PS, o BE votou contra por razões que nada tinham a ver com o orçamento, o PCP votou contra porque estava cansado da geringonça e possivelmente pela sua matriz leninista. Todos os que votaram contra esqueceram nesse momento os verdadeiros interesses do país e da esmagadora maioria da população.
Vamos agora ter de esperar mais quatro meses, pelo menos, pela aprovação do orçamento. Muitas medidas essenciais para o combate às alterações climáticas ou à pandemia vão ficar suspensas, o aumento das pensões e do salário mínimo pode não acontecer já em janeiro do próximo ano, investimentos essenciais para a economia ficarão suspensos de um OGE que pode aparecer, na melhor das hipóteses, em abril e na pior em junho. Tudo isto sem qualquer garantia de desbloqueio da crise política. O défice não é só financeiro, é agora também cognitivo.
Bloqueios
“Iremos receber a terceira dose, depois a quarta e assim sucessivamente todos os anos, ou todos os semestres, vaga após vaga após vaga.”