Ensinavam-nos em Direito Fiscal que um dos assuntos que não deviam ser submetidos a referendo eram os impostos. Ninguém aprovaria um aumento de impostos e a percentagem daqueles que não os quereriam de todo é tão grande que o país ficaria rapidamente ingovernável. Por isso não confia o Estado na nossa sensatez em muitos assuntos.
Na discussão do Orçamento é a mesma coisa, mas aqui é a oposição que faz a figura do eleitor em busca apenas do seu próprio prazer: aumento de despesa, diminuição de receitas, exigências que os próprios não poderiam satisfazer se fossem eles a governar.
Os populismos vivem disso e de mais alguns truques. É da natureza humana procurar um culpado quando alguma coisa corre mal. Se fizemos asneira é por causa de alguém, não das nossas imperfeições, nunca da má avaliação que fizemos da nossa capacidade para acabar um trabalho a horas, de cumprir as prestações de um empréstimo, da distração que nos levou a bater com o carro ao fazer uma manobra. Isso tranquiliza-nos e deixa o nosso ego incólume.
Por isso é tão fácil ser político quando há inimigos e por isso necessitam esses políticos de encontrar quem culpar pelo que há de mau na sociedade, ou de encontrar remédios miraculosos para todos os males.
Hitler tinha os judeus, Trump os mexicanos, Ventura os subsídio-dependentes e os ciganos. Todos resolvem o problema da criminalidade com o aumento das penas ou o acesso fácil às armas. Todos falam da diminuição dos impostos e em geral recusam decisões difíceis, como políticas ambientais restritivas do desenvolvimento económico. Bolsonaro e Trump acham que o aquecimento global é uma fraude, Ventura omite cuidadosamente o assunto. Os populistas em geral pensam que a imigração é um problema grave e escondem atrás disso ideias de eugenia e preservação da raça. Bolsonaro não fala muito sobre o assunto, mas o Brasil é o que é.
Este discurso fácil chega facilmente à cabeça de muitos. Todos gostam de ouvir coisas simples e remédios instantâneos para problemas graves. O comprimido miraculoso dado pelo homem providencial, quem não gosta? Goebbles sabia isso e todos os populistas atuais bebem da sua cartilha.
À esquerda também há disso, claro. Quando se pedia que os (poucos) ricos pagassem a crise (toda), ou quando se pede agora que se esqueçam ao mesmo tempo o défice e a dívida quer-se afinal um milagre. A facilidade atual de acesso à informação, seja ela credível ou não, a perda generalizada de espírito crítico, levaram-nos a isto: não se pensa e acredita-se cegamente naqueles que se propõem pensar por nós.
Há aqueles que se fazem ouvir e apontam as incongruências dos populistas. Bolsonaro e Trump, com remédios miraculosos contra a Covid-19, catastroficamente desmentidos no terreno, não podem sobreviver com uma imprensa livre. Dão por isso aos seus informação filtrada, que no fundo não passa de propaganda, como no caso da Fox News ou, melhor, das redes sociais. Quando lhes desmascaram mentiras falam em ofensas à sua liberdade de expressão, no fundo reclamando liberdade para mentir e para divulgar as mentiras que lhes fazem ganhar o voto dos tontos.
As derrotas de Trump e Bolsonaro foram uma boa notícia, mas não nos vamos iludir. Foi apenas uma pausa na vaga de populismo que aí vem.
Apenas uma Pausa
“As derrotas de Trump e Bolsonaro foram uma boa notícia, mas não nos vamos iludir. Foi apenas uma pausa na vaga de populismo que aí vem.”