Afinal, para que servem as Câmaras Municipais?

“Não tenho nenhum prazer em criticar o senhor presidente ou a Câmara. Uma vez eleita, o desejo de todos nós é que tudo funcione. E bem. Política à parte. E, todavia, ao assistir constantemente a episódios verdadeiramente insólitos não posso ficar calado, até pelas responsabilidades políticas e cívicas que tenho.”

Sim, é uma pergunta legítima depois de termos tido conhecimento de uma estranha viagem turística dos senhores presidentes da Câmara, da Assembleia Municipal, das Juntas e Assembleias de Freguesia a Torre de Moncorvo (!), a uma central fotovoltaica e a uma Quinta, com comes e bebes à fartura, pagos pelo Município (5.220 euros, cerca de 105 euros pessoa, considerando os dados da autarquia, cerca de 50 autarcas, entre outras despesas não contabilizadas). Ou ao espetáculo “solidário” (!) do senhor Tony Carreira no NERGA (e por que razão não se realizou no TMG?), que custou à solidária Câmara 19.000 euros.
O que justifica este investimento, este gasto de dinheiros públicos? É esta a vocação da Câmara? Promover viagens turísticas e pagar espetáculos, ainda por cima fora dos equipamentos municipais? Não há coisas mais importantes para fazer? Tratar dos serviços da Câmara para os tornar mais eficazes e rápidos? Preparar o dispositivo para a prevenção e o combate aos fogos florestais que aí vêm? Informar a Autoridade Tributária das alterações ao IMI para não prejudicar os munícipes? Aceitar fundos do Estado central para a cultura, em vez de os rejeitar? Promover a resolução do grave problema da habitação, aderindo ao programa da renda acessível de forma consistente? Resolver o problema do “arraial minhoto” que temos nas nossas aldeias, com fios do telefone, da eletricidade e da fibra ótica e antenas, tudo pelo ar, desordenado, num espetáculo deprimente de país de terceiro mundo?
Não, o que se começa a perceber, já com alguma consistência, é um comportamento político padrão do senhor presidente da Câmara: tudo transformar em campanha eleitoral para garantir um segundo mandato. Festas, turismo, animação, espetáculos popularuchos. Dar ao povo aquilo de que o povo parece gostar. Política-espetáculo?
Não tenho nenhum prazer em criticar o senhor presidente ou a Câmara. Uma vez eleita, o desejo de todos nós é que tudo funcione. E bem. Política à parte. E, todavia, ao assistir constantemente a episódios verdadeiramente insólitos não posso ficar calado, até pelas responsabilidades políticas e cívicas que tenho.
Passaram quase dois anos desde que esta gestão autárquica assumiu a responsabilidade de governo do município. É, pois, tempo de avaliar a gestão. E, infelizmente, os episódios a que temos vindo a assistir já nos permitem constatar que estamos perante, por um lado, uma gestão errática e insistente em erros de palmatória e, por outro, uma gestão com a única preocupação de (através de festarolas, espetáculos e turismo) levar por diante uma campanha eleitoral permanente com os recursos do município. Por que “carga de água” foi promovida esta estranha viagem a Torre de Moncorvo ao mesmo tempo que os munícipes se viam obrigados a pagar um excedente de IMI que não deviam pagar? Viagem tão estranha como essa ideia peregrina das “boas práticas”… Turísticas, gastronómicas? E a recusa do consistente apoio da DGArtes à programação do TMG terá tido, nesta mesma linha, como motivação encher o TMG de espetáculos popularuchos e de música pimba pagos pelo município para consolo das massas e recompensa eleitoral? Será que desistiu de governar a autarquia e a transformou numa agência de eventos?
Confesso que começa a formar-se na minha mente a ideia de que estamos perante um comportamento político padrão que investe na política pelo seu lado menos nobre e menos útil. “Pão e circo”, diziam os romanos. Parece ser esse o modelo do senhor presidente da Câmara.
Pois que fique bem ciente que o PS não pactuará com este modelo de gestão política autárquica e que tudo fará para que seja reposta uma gestão que se centre nos problemas reais dos munícipes. Os problemas que enunciei acima e que deveriam merecer todo o tempo do senhor presidente em vez de o gastar em passeatas com eventuais futuros apoiantes nas próximas eleições. O que temos aqui parece ser um problema de foco e de ideia acerca do que é a política e para que serve. Sim, parece-me que o problema é mesmo esse.
Uma coisa é certa: a política não deve ser desperdiçada a gastar recursos do município para que os dirigentes de ocasião se perpetuem no poder. Não, o que eles devem é gerir o município de modo a dar resposta aos reais problemas dos munícipes. E, sinceramente, não me parece que seja o que está a acontecer no nosso município com a atual gestão representada pelo senhor presidente Sérgio Costa.

* Deputado do PS na Assembleia da República eleito pelo círculo da Guarda e presidente da concelhia do PS da Guarda

Sobre o autor

António Monteirinho

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