A tragédia do PS Guarda

“Onde estavam estes candidatos socialistas ou Santinho Pacheco quando neste jornal se defendia rigor na gestão, transparência nos actos e probidade nas contratações públicas? E onde estavam quando «esta comunicação social» era alvo de perseguição pelo poder autárquico?”

A análise e comentário aos resultados eleitorais têm sempre as mais diversas interpretações. Há quem não saiba perder e ponha as culpas nos outros! E há os que perante a derrota culpam a comunicação social! “Mate-se o mensageiro!!”

Na última edição de O INTERIOR o deputado Santinho Pacheco, enquanto colunista do jornal, escreveu na sua crónica, sob o título “Eleições: a comunicação social saiu a perder”, uma resenha sobre algumas das debilidades do poder local, a falta de escrutínio da assembleia municipal e o nepotismo e autoritarismo do poder autárquico, em especial dos presidentes de câmara. Para o deputado, e bem, o exercício do poder devia ser mais vigiado, ainda mais num tempo em que o municipalismo cresce e as autarquias têm mais responsabilidades e mais dinheiro. Santinho Pacheco apresenta uma panóplia de conclusões, óbvias, que qualquer cidadão poderia elencar ou subscrever. Porém Santinho Pacheco não é um cidadão comum, é deputado à Assembleia da República desde 2015, ou seja, há muitos anos que poderia ter sugerido e proposto que o parlamento legislasse sobre aquilo que agora descobriu que está mal no poder local – antes foi governador civil e, ainda antes, foi presidente da Câmara de Gouveia que perdeu em 2001 deixando a autarquia endividada (até o autocarro para transportar as crianças para a escola foi penhorado pelo tribunal), por isso, há muito que devia ter apresentado soluções de transparência e escrutínio dos poderes públicos.

O deputado e colunista podia, e devia, ter começado por fazer o “mea culpa” e assumir a sua impotência e incapacidade de mudar o que quer que seja e ser há muitos anos um protagonista do sistema que nos levou a este beco sem saída, em que uns comem à mesa do orçamento e os outros passam fome. E devia ter-se interrogado sobre a escolha do candidato (candidatos) à Câmara da Guarda pelo PS, de que será um dos responsáveis, que levou à maior hecatombe do partido socialista no concelho. Em vez de explicar a forma como a escolha foi feita (contrariando pressupostos socialistas – em plenário ou sufrágio), decidido pelos oligarcas do partido, de que é parte, num PS Guarda que recusa a renovação, que continua a ter os mesmos protagonistas de sempre e que aniquilou o debate interno – Santinho Pacheco considera que os jornalistas é que são os culpados. Mas onde andava o PS ao longo destes anos de domínio social-democrata? Onde estavam Santinho, Luís Couto e companhia ao longo dos oito anos de domínio laranja? Salvo umas palavras de circunstância e uns sound bytes para ecoarem nas rádios, o PS na Guarda desde 2013 não existiu. Onde andavam estes candidatos à Câmara da Guarda que deixaram Cristina Correia sozinha nos últimos anos a defender o PS na Câmara da Guarda? Que socialistas são estes que nunca ouviram ou falaram com as pessoas do concelho durante oito anos e vêm agora dar lições de imparcialidade e jornalismo à comunicação social?

A 18 de abril de 2019 publiquei aqui (https://ointerior.pt/opiniao/a-heranca-de-alvaro-amaro/) que a herança de Álvaro Amaro era negativa para o futuro e não era contestada, nomeadamente porque o PS «navegava à vista» e que «Álvaro Amaro fugiu!». O até então presidente da Câmara exigiu então ao seu sucessor e respetivos vereadores para emitirem um “Comunicado” por delito de opinião, assinado por Chaves Monteiro, Sérgio Costa, Lucília Monteiro, Victor Amaral e Cecília Amaro. Onde estava então o PS para defender a liberdade ou criticar o autoritarismo do dirigente social-democrata? Submetido por mim à ERC (https://ointerior.pt/politica/pe-p-pp-2019-250-diretor-jornal-o-interior-neutralidade-e-imparcialidade-das-entidades-publicas-comunicado-do-presidente-e-vereadores-cm-guarda/) esta, e depois a Comissão Nacional de Eleições, deliberou que os senhor presidente e vereadores deviam cumprir «os deveres de neutralidade e imparcialidade a que as entidades públicas e os seus titulares estão vinculados» sob pena de poderem incorrer «na prática do crime de violação daqueles deveres». Onde estavam estes candidatos socialistas ou Santinho Pacheco quando neste jornal se defendia rigor na gestão, transparência nos actos e probidade nas contratações públicas? E onde estavam quando «esta comunicação social» era alvo de perseguição pelo poder autárquico? E, ao escrevermos sobre a mordaça, o então presidente da concelhia do PSD, Luís Aragão, emitiu um comunicado onde, além de me deixar o repto para «se candidatar a presidente de Câmara», nos tentava silenciar (https://ointerior.pt/arquivo/guarda-amordacada/). E onde estavam, antes disso, quando por unanimidade, com o apoio de todo o executivo (do PSD e também dos então vereadores do PS), subscreveram outro comunicado contra «as críticas à Câmara da Guarda»? Como escreveu Baptista-Bastos, não há jornalismo neutro, «porque o jornalismo é, sempre e sempre, a oposição do direito e do facto contra os inimigos da liberdade de dizer».

Foi desta forma que o PS nos últimos oito anos se posicionou, indo a reboque dos acontecimentos, demitindo-se da sua função de oposição, excluindo os melhores e o jovens, escolhendo os que estavam no sistema ou os que já tinham traído o partido, associando-se a oportunistas, valorizando os interesses instalados, seja sobre a forma de fundações ou de tomada de poder em organismos públicos, tomando de assalto tudo o que era importante e substituindo a defesa do interesse comum pelo interesse de alguns. Foi assim que o PS bateu no fundo, com 17,9 por cento dos votos num concelho onde já dominou. Afinal, a culpa é da comunicação social.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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