A José António Saraiva

Conheci o José António Saraiva há uns 30 anos. Cruzámo-nos em diferentes momentos, entre a Lisboa das artes e da cultura e o contexto dos jornais. Ele era o circunspecto, altivo e soberano Diretor do maior jornal português, o “Expresso”, e eu o jovem que sonhava ser jornalista.

Na verdade, já o conhecia. Aprendi a ler o “Expresso” com ele, lá longe, no início dos anos oitenta. Adolescente, fui ganhando o gosto pelos jornais e pelo jornalismo enquanto interpretava a vida pública e a “Politica à Portuguesa” pela mão de José António Saraiva. E fui sonhando que um dia poderia analisar e comentar ou mesmo influenciar a sociedade como ele.

Por isso, quando há 25 anos tive oportunidade e o privilégio de colaborar com ele, de partilhar anseios (jornalísticos) e trabalhos, de discutir e aprender, foi uma enorme realização pessoal. A sua rara capacidade de interpretar a realidade e perceber o contexto editorial em que nos movemos fez dele uma personagem maior do jornalismo e da comunicação em Portugal.

Estivemos juntos, com o José Manuel Saraiva, o Afonso Camões e o Francisco Pinto Balsemão, na fundação da rede “Expresso”, de que o jornal O INTERIOR foi cofundador, seguramente o maior “abraço” editorial da imprensa independente portuguesa, e seguimos empenhados na afirmação do jornalismo sério, responsável e rigoroso. Dedicou a sua vida à imprensa e, mesmo nos últimos anos, com a doença a corroer-lhe as entranhas, nunca deixou de ser uma referência de dedicação e profissionalismo no jornalismo.

Depois de 22 anos a dirigir o “Expresso” (onde ingressou como colunista a convite de Marcelo Rebelo de Sousa) fundou o “Sol”, onde se despediu de todos no passado dia 28 de fevereiro, com uma premonitória crónica que o “Zé António” intitulou de «Não é uma despedida». Mas foi. Aí, José António Saraiva falou da liberdade, dos amigos, da imprensa escrita como referencial de credibilidade, «uma reserva de seriedade, um bastião». E da independência, nestes tempos difíceis para a imprensa, «onde só os jornalistas corajosos vão resistindo» e agradeceu aos leitores, assegurando que o tempo «dirá se tiver condições para voltar a escrever». Não teve.

Arquiteto, jornalista e escritor, José António Saraiva nasceu em 1947, em Lisboa, sendo filho de António José Saraiva, ensaísta, historiador e crítico literário, e sobrinho do historiador José Hermano Saraiva. Morreu esta quinta-feira, dia 6 de março de 2025, vítima de cancro.

P.S. À família enlutada, em meu nome pessoal e do Jornal O INTERIOR, apresento sentidas condolências

Luís Baptista-Martins

Jas

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

Leave a Reply