A Inteligência Artificial e a Rádio

Escrito por Hélder Sequeira

” Embora a IA possa ser um precioso auxiliar dos profissionais da rádio (a par de uma ajuda importante na estratégia de conquista de novos públicos e da fidelização de ouvintes), não podemos esquecer a essência da Rádio.”

A rádio continua a ter um papel fundamental na informação e, com distinta flexibilidade, na aproximação às pessoas, seja no meio urbano ou rural.
Como já escrevemos em anterior edição de O INTERIOR, essa proximidade dever ser incrementada cada vez mais, possibilitando uma constante auscultação de anseios, registando as perspetivas sociais, económicas e políticas, dando voz às pessoas, ampliando a notícia, levantando novas questões e problemas; importa que a rádio (e a imprensa) não se circunscreva apenas às agendas informativas institucionais.
Sabemos que o atual cenário, em vários planos, é de apreensão e de difíceis desafios para a comunicação social regional e, obviamente, para rádio – em particular – face ao crescendo de exigências legais. Aliás, é estranho, ou talvez não, que na recente campanha eleitoral pouco ou nada se tenha ouvido sobre a crise que afeta a comunicação social; crise que alguns analistas consideram se irá repercutir na redução do número de profissionais das rádios, mercê da implementação progressiva da inteligência artificial (IA) nas emissões diárias.
A Inteligência Artificial desenha novos caminhos ao nível da eficiência e assegurando múltiplas vantagens no plano da melhoria da programação e interação com os ouvintes; para além da automação das emissões radiofónicas, a IA apresenta-se como ferramenta de apoio na difusão de notícias, na definição da sequência musical das emissões e na oferta de conteúdo programático convidativo e diferenciado.
Através de algoritmos e modelos automatizados, a IA tem a capacidade de proceder à análise de uma enorme quantidade de informação, identificando padrões e desencadeando, consequentemente, procedimentos adequados. O acompanhamento constante das atualizações e publicações nas redes sociais pode ser efetuado de uma forma rápida, detetando tendências e assinalando notícias e temáticas que podem interessar aos ouvintes, despertando a sua atenção. Através de “software” adequado podem ser produzidas mensagens destinadas às redes sociais, assim como conteúdos adequados a plataformas digitais que ampliam o trabalho da estação emissora. Como escreveu Cristiano Stuani, a IA «pode utilizar-se para produzir textos e conteúdos para as redes sociais, personalizar anúncios e analisar dados de audiência, ampliando o alcance da marca e oferecendo publicidade mais relevante e efetiva para os anunciantes».
No último ano a Inteligência Artificial tem vindo a aumentar a sua presença e influência no mundo da rádio. Na Alemanha está a funcionar, no âmbito de um projeto da Antenne Deutschland (AD), o canal Absolut Radio AI que pode ser escutado em DAB +, sendo 100% produto da Inteligência Artificial.
Com o recurso à tecnologia designada por Radio.Cloud é elaborada toda a programação, inserida a voz e definidos os intervalos musicais ou publicitários, apostando num auditório da faixa etária entre os 14 e 49 anos. O “animador de emissão” tem o nome de kAI. Sobre este projeto, a diretora de programação da AD, Tina Zacher, afirmou a uma publicação da especialidade que a IA não irá substituir, nos próximos anos, os radialistas, mas «pode simplificar tarefas repetitivas, dando mais tempo para os profissionais da rádio serem criativos».
O debate em torno das implicações da Inteligência Artificial no meio rádio é atual e necessário, bem como a necessidade de um melhor conhecimento das aplicações disponíveis; ao nível da automação, utilização de voz, criação de cópias de conteúdos, novas fórmulas de atração de ouvintes. Acresce ainda a análise e a clarificação das questões éticas, do impacto no emprego, da salvaguarda de direitos de autor e direitos conexos, da distinção – perante o público ouvinte – de vozes criadas pela Inteligência Artificial.
Na área da indústria de equipamentos para radiodifusão não tem faltado quem argumente que o uso abusivo da Inteligência Artificial poderá criar situações indesejáveis; para outros ajudará a personalizar os conteúdos das emissões de rádio, a automatizar tarefas repetitivas e a melhorar a qualidade geral da programação. Sustentam, ainda, que a Inteligência Artificial pode viabilizar economia de tempo para as emissoras, ao assegurar conteúdos destinados aos períodos da noite e madrugada, criando rapidamente “podcasts” e outros materiais de áudio online para sites. Aliás, ao nível da produção de “podcasts”, há empresas que perspetivam, já o corrente ano, a disponibilização de tecnologia capaz de possibilitar a sua audição na língua que o ouvinte pretenda; naturalmente com as vantagens daí decorrentes e na expetativa de reforço da eficácia e receita das mensagens publicitárias.
A utilização da inteligência artificial em novos equipamentos, produtos, serviços e inovações abriu a discussão ao nível político e ético, entre outras esferas de intervenção. Vários especialistas, nesta matéria, fizeram já notar a existência de questões legais sobre os direitos de propriedade e autoria de conteúdos criados por Inteligência Artificial; alertando também para a urgência na clarificação da forma como as emissoras podem proteger, legalmente, os conteúdos próprios.
Noutras abordagens, e mormente sobre a problemática relativa à substituição dos animadores de emissão pela IA, é manifestada a opinião de que a Inteligência Artificial deve ser utilizada como ferramenta de ajuda à melhoria do fluxo de trabalho diário de apresentadores, programadores e jornalistas. O grande benefício da IA, neste contexto, será assegurar as notícias locais e a identidade da emissora fora do horário normal de trabalho, quando ninguém está presencialmente; como sejam os períodos da noite ou em turnos de fim de semana.
Conhecidos nomes do mundo da indústria da rádio consideram que as aplicações de Inteligência Artificial, usadas pelas estações emissoras, vão preencher lacunas ao nível dos recursos humanos, não implicando a sua substituição; reforçam a vantagem da criação de segmentos especiais em horários onde a presença do animador não esteja assegurada ou seja inviável. Nesses tempos da programação podem ser inseridas notícias da região, informações sobre as temperaturas e a previsão meteorológica ou, através de “software” específico, gerados “podcasts” sobre espetáculos, desporto, cultura, tradições locais/regionais, roteiros turísticos e outros temas do agrado do público.
Do outro lado no Atlântico, nos EUA, o RadioGPT (software com inteligência artificial vocacionado para a automatização das emissões de rádio) evoluiu já para um novo patamar com o Futuri AudioAI, produzido pela Futuri Media, oferecendo uma presença em direto ao longo das 24 horas e durante todos os dias da semana; garantindo, igualmente (e entre outras vantagens), a criação automática de podcasts e notícias para partilha.
Perante aquilo que atrás escrevemos, a discussão sobre a importância, vantagens e perigos da Inteligência Artificial deve merecer a nossa atenção. Embora a IA possa ser um precioso auxiliar dos profissionais da rádio (a par de uma ajuda importante na estratégia de conquista de novos públicos e da fidelização de ouvintes), não podemos esquecer a essência da Rádio.
A humanização deste meio de comunicação é fundamental e as pessoas não podem ser afastadas do seu processo evolutivo. A Rádio continua a ter futuro, apesar dos múltiplos condicionalismos e desafios.

Sobre o autor

Hélder Sequeira

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