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Verdade e consequência

observatório de ornitorrincos

Estou profundamente preocupado com o aquecimento global: nunca mais cá chega. A verdade é que já estamos em Junho e o sol só agora começou timidamente a aparecer. De calor não há sinal. Logo este ano que gastei centenas de euros nos vídeos, livros e toalhas de praia do Al Gore sobre o aquecimento global. Estamos a falar de um senhor que convenceu metade dos eleitores americanos a votar nele para presidente e o resto do mundo que tinha ganho essas eleições. Como é fácil imaginar, muito mais rápido convenceu o meu frágil e crente espírito que de agora em diante uma tarde de verão na província seria equivalente a uma torradeira ligada. De tão persuasivo, desfiz-me de todos os aparelhos de aquecimento, eléctricos e a gás e comprei um bote de borracha para enfrentar a subida dos mares nos dias de trabalho. Al Gore pode ser bom a perder eleições com espectacularidade, mas a prever o tempo não é melhor que as meninas da meteorologia. Aliás, em vários aspectos é mesmo bastante pior. E mais gordo. Nesse registo meteorológico prefiro Mário Crespo, que debita efemérides enquanto as nuvens gotejantes surgem no mapa de Portugal. Com quem é que uma leitora gostaria mais de saber? Com um homem derrotado por George W. Bush num estado habitado por cubanos e reformados ou com alguém que nos informa que a 3 de Junho (dia em que escrevo) faz 60 anos o telescópio instalado no Monte Palomar? Eu preferia, sem margem para dúvidas, sair com qualquer uma das meninas que apresenta o boletim meteorológico, de preferência em canais de televisão da Eslováquia.

Após escrever o parágrafo anterior, embrulhado num edredão, vestido com um robe e camisola de lã, procuro nas televisões internacionais um bocadinho de meteorologia, mas encontro apenas o treino da selecção nacional, emitido em directo por vários canais. Não sei ao certo os canais que transmitiram tão decisivo encontro da nossa história contemporânea, mas vi imagens dele na RTP, na TVI, na Sport TV, na MTV e no canal de Caça e Pesca, embora no caso deste apenas mostrassem Jorge Ribeiro sentado no banco a escolher minhocas. No fundo, como dizem os psicólogos, um jogo treino entre os titulares e as reservas é um “confronto connosco próprios”. Quando Cristiano Ronaldo fintou Ricardo e marcou um golo, criou-se em mim uma profunda tensão interna, pois não sabia se haveria de festejar o golo do craque ou praguejar por mais uma fífia do guarda-redes. Com essa indecisão, deixei-me estar quieto, para o frio não entrar.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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