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Vem aí o Verão

Promete o Presidente da República, em entrevista ao jornal “Público” e a propósito dos incêndios de Verão, não se recandidatar se «falhar tudo outra vez». Admite na entrevista que se fez muito para evitar novas tragédias e que ele próprio promulgou toda a legislação que lhe chegou às mãos e tinha esse objetivo.

Nota-se trabalho nas bermas das estradas, junto às povoações, nos pinhais e eucaliptais. Este ano não se poderão imputar tão facilmente as culpas à falta de limpeza das florestas e das matas, mas há outras causas e pouco se sabe.

Os fogos de origem criminosa são uma das causas e os criminosos são conhecidos ou estão apontados. Uma recente reportagem da Ana Leal, na TVI, indicava suspeitos do incêndio do pinhal de Leiria e explicava o sucedido: como tinha sido combinado, por quem, onde, como iria ser obtido o lucro, o que estava previsto ser feito nos leilões da madeira ardida para obrigar a baixar o preço. De certeza que a Polícia Judiciária está já a investigar e podemos acreditar que neste ano de 2018, por medo ou porque está demasiada gente atenta, haverá menos incêndios de origem criminosa que em anos anteriores.

Outra causa é o aumento das temperaturas provocado pelas alterações climáticas e, quanto a isto, pouco há a fazer a curto prazo. Vai haver muito calor e pouca humidade, vai haver quem limpe matos à última hora, por medo das coimas ou dos incêndios e libertar faíscas no processo, vai haver loucos ou criminosos mais atrevidos, vai haver cigarros a voar das janelas dos carros, garrafas ao sol e pinheiros a escorrer resina à espera de uma causa de combustão.

Tudo isto vai acontecer sobretudo no nosso interior despovoado, sem populações vigilantes e jovens, onde continuam a plantar-se pinheiros selvagens e eucaliptos. Enquanto houver esses desequilíbrios, demográficos e naturais, ou todas as outras razões, como a falta de meios, a incompetência dos decisores, a descoordenação entre organismos, vão arder as florestas, por mais que mudemos de presidente da República ou de governo.

A constatação de que é em Portugal que há mais área ardida todos os anos, proporcionalmente ou em valores absolutos, deveria levar-nos à conclusão de que os incêndios são o sintoma de problemas muito profundos da nossa organização como país, mas tem levado apenas a cuidados pouco mais do que paliativos. Parece por vezes que o grosso dos esforços da nação se destina a salvar bancos e a enriquecer multinacionais e ex-ministros, ou a encher de infraestruturas e serviços a estreita faixa ao longo do litoral onde se refugiou a maior parte da população. O resto bem pode arder e, ou tudo muda, ou vai continuar a arder.

Por: António Ferreira

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