Todos os cinéfilos conhecem o portal The Internet Movie Database (www.imdb.com), porventura o melhor site sobre cinema de todo o espaço virtual (existe também o allmovie.com, mas não possui informação tão detalhada e abrangente). Ora, no Imdb podemos consultar várias listagens com muita informação sobre um determinado filme, géneros cinematográficos, épocas específicas da história do cinema, realizadores, actores, produtores, etc. Nesse site estão enumeradas diversas listas catalogadas por géneros (os melhores westerns, por exemplo), por década ou realizador. A lista que sempre me pareceu mais interessante e curiosa é a lista dos 250 Melhores Filmes de Sempre, votada pelos cibernautas. Isto é, não se trata de uma lista elaborada por grandes historiadores do cinema ou críticos credenciados. São mesmo os amantes de cinema, milhões deles espalhados pelo mundo mas juntos nesta era cultural globalizada, que votaram nesta lista. Listas são listas, meros indicadores subjectivos de preferências cinematográficas, mas a tal lista especial revela algumas subtis curiosidades que não passam ao lado até do cinéfilo mais desatento: em primeiro lugar do top está o filme “Os Condenados de Shawshank”. O filme de Frank Darabont é um bom filme, mas merecerá o primeiro lugar da lista dos melhores filmes de sempre, à frente do primeiro “O Padrinho” ou de “Casablanca”? Isto quando constatamos que existem muitas obras-primas listadas para lá do centésimo lugar. Veja-se o caso do magistral “Manhattan” de Woody Allen que figura no… penúltimo lugar da tabela (249ª posição)!
Para cada filme existe uma votação que vai de 1 valor (péssimo) a 10 valores (genial). Se virmos com atenção esta votação, não deixa de causar perplexidade alguns dados. Pegando no exemplo do filme que está em primeiro lugar do top, com uma média de valores de 9,1, vemos que há 185 mil cibernautas que votaram na nota máxima (10), mas também houve 22,293 espectadores que votaram na nota mínima (1). Dito de outro modo, para 22 mil pessoas que aparentemente gostam de cinema, a obra de Francis Ford Coppola é simplesmente um objecto execrável. Para pegarmos num filme mais consensual da história do cinema, “Citizen Kane”, de Orson Welles (classificado num modesto 29º lugar quando nas listas de críticos profissionais aparece quase sempre em primeiro!): há pelo menos quatro mil cinéfilos que detestaram o filme cilindrando-o com nota 1. Mesmo o “Pulp Fiction” de Tarantino (situado numa honrosa 6ª posição) regista nada menos do que 8,500 detractores puros e duros. Estas votações não têm, obviamente, validade científica e rigorosa, mas não deixam de ser sinais interessantes sobre a forma como se interpreta e avalia um filme. E reforçam a ideia de que perante um objecto artístico tido como referência absoluta, não existe unanimidade valorativa.
Ou seja, mesmo diante de supostas obras-primas da 7ª arte, aquelas obras-primas que qualquer cinéfilo julga intocáveis do ponto de vista da crítica negativa, há sempre quem as considere obras medíocres. Percebemos que em arte não existem consensos totais e absolutos. O que prevalece é a subjectividade do olhar, a diferenciação interpretativa no acto de fruir um dada expressão artística (o cinema, neste caso). Afinal o que gera estas discrepâncias críticas relativas a um mesmo fenómeno artístico (seja cinema, pintura ou literatura)? A formação cultural do espectador? As suas referências no mundo da arte? Os seus gostos culturais? A sua sensibilidade estética? A sua capacidade de análise e de discernimento? Creio que o pintor Georges Braque resumiu eficazmente esta problemática quando um dia afirmou: “Na arte só uma coisa importa: aquilo que não se pode explicar.”
Por: Victor Afonso