Arquivo

Um vasto campo de estudo…

Anotações

Na Guarda, ao longo dos últimos anos, tem sido incrementado o debate sobre questões toponímicas, com particular incidência nesta cidade.

O Fórum sobre Toponímia, que no próximo mês de outubro terá nova edição, acentuou, desde o início, o muito que há a fazer no âmbito desta temática, bem como a diversidade de estudos por ela suscitados; teve, aliás, consequências práticas através do lançamento de um concurso de toponímia e a escolha do modelo de novas placas, como é do conhecimento geral.

A investigação em torno deste tema permite um enriquecimento cultural e o reforço da identidade citadina; por outro lado, não deixa de constituir uma atenção permanente perante situações que exigem uma adequada e correta intervenção.

Independentemente das conjunturas políticas e sociais, devemos pugnar por uma Guarda da memória, contribuindo para que a cidade preserve a sua história, dignifique os seus valores, honre os seus pergaminhos e saiba construir pontes sólidas para o futuro, fidelizando paixões, conquistando novos visitantes.

«As cidades são como os homens; têm ou não carácter – e a tê-lo importa preservá-lo», como escreveu Eugénio de Andrade. A Guarda é muito mais que o património edificado; é memória, é somatório de vidas, experiências, é (deve ser) um pulsar coletivo. É imperativo de consciência e cidadania assumir-se uma consciência critica, uma intervenção constante em prol do nosso espaço geográfico e afetivo, espaço de vivências.

«O passado é, por definição, um dado que coisa alguma pode modificar. Mas o conhecimento do passado é coisa em progresso, que ininterruptamente se transforma e se aperfeiçoa» e, como acrescentava Marc Bloch, «a incompreensão do presente nasce fatalmente da ignorância do passado»…

Ao longo do tempo foram muitas as alterações toponímicas introduzidas na nossa cidade. Como escreveu Pinharanda Gomes, «na Guarda, e no decurso do nosso século [vinte], tem-se cometido, repetidas vezes, aleatórias modificações de toponímicos, dificultando ainda mais as tarefas dos que, por exemplo, dedicados a pesquisas arqueológicas, poderiam atacar desde logo o sítio exato, caso a memória do nome se mantivesse».

Um dos casos mais evidentes é a Rua Francisco de Passos que continua a ser designada, pela generalidade dos guardenses, como Rua Direita. O seu nome evoca o Governador Civil da Guarda que desempenhou funções entre 11 de junho de 1926 e 25 de agosto do ano seguinte. Esta rua, recorde-se, constituiu a principal ligação da urbe medieval, unindo a cidadela do Torreão (também conhecida por Torre Velha da fortaleza, edificada provavelmente no século XII) à Alcáçova existente junto às portas da Covilhã (na zona em frente da Escola de Santa Clara).

As alterações toponímicas, como já aqui escrevemos noutra ocasião, poderiam ser minimizadas caso fosse inserida a anterior designação, como aliás acontece noutras cidades (e como está previsto nas normas relativas às futuras placas), sobretudo com um significativo passado histórico.

«Restaurar é restituir. A restituição da toponímia é um ato de honestidade cultural, de devolução do património à comunidade, de abandono de opções adventícias, por vezes decorrentes das situações políticas, e, por fim, de entrega aos arqueólogos e aos historiadores, de uma nova fonte documental para historiografia a fazer», tal como observou Pinharanda Gomes.

A toponímia da Guarda é um vasto campo para estudo e investigação e pode levar-nos à (re)descoberta de múltiplas facetas do seu passado, validado por mais de oito séculos de história, enquanto urbe.

É importante que sejam implementadas correções e suscitado o envolvimento dos cidadãos na salvaguarda destes «pontos de memória». Saibamos assumir a nossa responsabilidade coletiva, privilegiando todos os contributos idóneos em favor dos reais e verdadeiros interesses da cidade, de modo a que não se apague o espírito e a magia da Guarda.

Por: Hélder Sequeira

Sobre o autor

Leave a Reply