A primeira coisa a dizer é que no ‘Face Oculta’ toda a gente é inocente até prova em contrário, aliás como em todos os processos.
Mas, ou esta suspeita da PJ é inventada – no que não acredito – ou, independentemente de se apurar quem está e não está criminosamente envolvido, podemos retirar certas conclusões preocupantes.
Na compra e venda de sucatas começa logo por haver um indício estranho: negócios feitos com empresas onde o Estado se conta entre os principais accionistas que, aparentemente, dão muito dinheiro a ganhar a um empresário cujas empresas têm 16 contra-ordenações ambientais (entre 2003 e 2009), além de estarem envolvidas em diversos processos judiciais.
Não é razoável empresas onde está envolvido dinheiro dos contribuintes lidarem com empresários assim. Mais: quadros dessas empresas receberiam dinheiro e presentes diversos desse prestador de serviços, apesar de todos eles seguramente saberem que, se “não há almoços grátis”, muito menos há Mercedes ou relógios de marca.
Haverá também administradores nomeados pelo Estado que serão convivas desse empresário que colecciona contra-ordenações e processos. E existirá mesmo quem sendo muito próximo e amigo de gente bem colocada no Estado e no Governo está acusado de, a troco de dinheiro, abrir portas ao dito empresário.
Independente dos nomes mais ou menos sonantes que venham a ser considerados culpados, esta história é já um sinal claríssimo do modo como as empresas estatais, ou onde o Estado tem grandes interesses, tratam o nosso dinheiro. Apesar de, há mais de 10 anos, existirem denúncias sobre a forma como sucatas têm vindo a ser negociadas, ninguém terá averiguado ou querido saber.
Pelo contrário, o negócio rolou até que alguém na PJ começou a puxar as pontas do novelo.
Enfim, gestores nomeados pelo Governo, quadros que são da sua confiança e diversos pequenos, médios ou mesmo grandes boys parecem achar normal conviver com pessoas de conduta duvidosa que lhes oferecem dinheiro, presentes, favores.
“Está tudo podre”, eis a frase que se ouve. É este, de facto, o melhor resumo do ‘sucatagate’.
PS: Como declaração de interesses direi que Armando Vara me moveu um processo – o único em que fui pessoalmente visado em mais de 30 anos de carreira. Acusa-me o ex-dirigente do PS por, em Fevereiro de 2008, ter escrito, como opinião, que o código ético dos políticos deveria reprovar condutas como a sua. Vara pede-me 150 mil euros por ter ficado magoado com o texto. Eu reafirmo-o integralmente.
Por: Henrique Monteiro
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