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Um mar de amores

Bilhete Postal

Um homem só, com uma casa no meio de um prédio enorme rodeado de outros prédios enormes, que de noite cintilam de tantas janelas que se apagam e outras se acendem, formando um centro urbano impreciso pela escuridão com gente incógnita vizinha de outras anónimas e muitas outras desconhecidas. Uma cidade de cimento grande, de sons permanentes, de sirenes constantes, de solidão fixa e contundente atrás das janelas cintilantes. Um mar de gente em apartamentos de um só, um mar de janelas que não têm pátios, que não vêem jardins. Um oceano de amores não existentes, de paixões sem encontro, de vectores sem destino, de gente a olhar as notícias e as novelas nos ecrãs. E o corpo que sente as vontades, como sente as dores e as fomes e os medos e os calores, e as ausências. O corpo só que pede outro num mar de vazios por trás da janela. E ele que se chega à janela e acena com a mão para o prédio enorme que está à frente e acena outra vez e repete o aceno mais uma e outra vez até que da colmeia em frente acenam pessoas imensas de cada apartamento de um só e ficam todos a ver que se chegam aos vidros dos prédios enormes frente a uns e outros, tão longe que não se vê o rosto, acenando-se todos num mar de amores sem encontro. Lembrava-me Chicago e sonhei-a assim entre janelas cintilantes e acenos múltiplos distantes.

Por: Diogo Cabrita

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