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Tradição cumpriu-se em Aldeia Viçosa

“Magusto da Velha” conta com 309 anos de história

A tradição voltou a cumprir-se em Aldeia Viçosa. Na passada quarta-feira, voltaram a chover castanhas da torre sineira da igreja matriz da localidade e nem a tarde gélida afastou as centenas de pessoas, na sua maioria moradores e naturais da aldeia, que anualmente, no dia 26 de Dezembro, acorrem ao “Magusto da Velha” para ver cumprir este antiquíssimo ritual.

A tradição conta com 309 anos de existência e, ao que tudo indica, «é para continuar», afirma Baltazar Lopes, presidente da Junta. Actualmente, a freguesia do concelho da Guarda tem direito a uma renda perpétua de 14 cêntimos por trimestre, deixada por uma benemérita abastada do vale do Mondego. O montante é pago pelo Instituto do Crédito Público, que já quis comprar esta herança por cerca de três mil euros. Contudo, ninguém quis vender a renda, por forma a preservar a tradição que remonta a 1698 e que «as pessoas querem que se mantenha», garante o autarca. Assim, este ano “caíram” do céu cerca de 150 quilos de castanhas e foram bebidos outros tantos litros de vinho. «Há muitas pessoas que não passam o Natal na Aldeia Viçosa, mas que não faltam ao “Magusto da Velha” porque é uma tradição que diz muito à freguesia», refere Baltazar Lopes. É o caso de Elisa Gonzaga, natural da aldeia, que sempre que pode não perde um magusto. «O “Magusto da Velha” é um dia tão ou mais importante que o Natal», afirma. A residente na aldeia conta que «desde criança» que assiste à tradição e procura «sempre apanhar umas castanhas». Este ano, Elisa Gonzaga fez, também, questão de levar consigo a neta, que rapidamente se “perdeu” entre as restantes crianças para apanhar o maior número possível de castanhas.

O ritual consiste em atirar mãos-cheias de castanhas do alto do campanário para o adro da igreja, onde os habitantes se acotovelam para ver quem apanha mais e depois assá-las na típica fogueira de Natal que ainda arde ali ao lado. Pronta está também uma barrica de vinho para ajudar as bocas mais secas. E há muitas, sobretudo por causa das “cavaladas”, que mais não é do que saltar para as costas de quem se põe a jeito ao baixar-se para apanhar castanhas. É uma brincadeira pouco católica praticada pelos homens e que faz rir as mulheres. No entanto, os praticantes já escasseiam e poucos foram aqueles que, este ano, foram apanhados desprevenidos. Outro momento alto acontece quando o maior sino da torre dá uma volta completa. Uma tradição que tem que ser repetida 26 vezes, devido ao dia em que é realizado o “Magusto da Velha”. Porém, esta não é a data original, já que a “esmola” que a “velha” ordenou que fosse dada devia concretizar-se na «primeira oitava de Natal» (dia 1 de Janeiro). Contudo, assim é no dia seguinte ao Natal desde que uma misteriosa benemérita doou aquelas iguarias aos habitantes da Vila do Porco, como então se chamava a localidade. Em contrapartida, exigiu apenas que se rezasse todos os anos um “Pai Nosso” em sua memória. Esta parte do testamento pode já não ser cumprida com rigor, mas o resto pratica-se com afinco desde, pelo menos, o ano de 1698. Trata-se da data da primeira alusão ao “Magusto da Velha” e consta do “Livro de Usos e Costumes da Igreja do Lugar de Porco”, escrito pelo padre António Soares Albergaria Meireles.

Tânia Santos

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