Para além das comunicações difíceis, as “sociedades de fronteira” deparam-se com os problemas relacionados com os conflitos entre os estados. E nesta zona da raia a proximidade da fronteira de outro reino pesava como grande fardo. Com efeito, as frequentes guerras entre os reinos ibéricos provocavam grande destruição entre as povoações da fronteira que sofriam os primeiros embates dos conflitos e arcavam com a responsabilidade da primeira linha de defesa.
Tendo consciência destas pesadas tarefas, os monarcas procuraram beneficiar os concelhos da fronteira isentando-as de algumas contribuições, obrigatórias para a maior parte do reino. Por vezes concediam largos privilégios que beneficiavam as populações em tempo de paz, nomeadamente nas feiras e nas portagens. Por essa razão, no primeiro foral atribuído à Guarda, cujo aniversário se comemorou no passado mês de Novembro, isentava-se os “homens da Guarda” de “portagem em todo o reino”. A portagem incluía o pagamento de imposto sobre as mercadorias entradas no concelho e a isenção deste imposto constituía uma importante regalia medieval atribuída a alguns concelhos da raia beirã.
Muito antes da fronteira ter sido definida politicamente separando, na Idade Média, o reino de Leão e de Portugal, já esta região da actual raia e do interior beirão era uma zona de “fronteira”. Foi-o na época pré-romana quando esta área constituía uma fronteira entre os Vetões e os Lusitanos.
Na época romana esta região manteve-se na “periferia” em relação à capital da província da Lusitânia, estabelecida em Mérida, mas a fronteira administrativa desta província fixou-se mais a leste, na actual região de Ávila.
Depois da queda do império romano a actual raia foi “fronteira” entre o reino Suevo, com capital em Braga, e o reino visigótico, com capital em Toledo. Depois da conquista da Península Ibérica pelos muçulmanos a situação não se alterou. Antes, pelo contrário: acentuou-se decisivamente o isolamento da região que, praticamente, se “fechou” aos contactos exteriores.
Actualmente, apesar dos esforços realizados nos últimos anos, esta região continua a ser uma “periferia” distante dos principais centros desenvolvidos. No entanto, já não se pode considerar o “Purgatório” e muito menos o Inferno de que falava Fernand Braudel quando se referia à vida nas zonas periféricas.
Por: Manuel Sabino Perestrelo