Nunca estivemos tão ligados e, no entanto, tão isolados. Perguntar a um jovem qual o meio que usaria para transmitir a outrem as suas ansiedades, medos, alegrias, frustrações, e outros estados de alma, teria como resposta mais que provável – o telemóvel ou a Internet.
É sabido que as principais operadoras de telemóvel arranjaram meios de viciar, de forma poderosa, jovens e adultos para garantirem lucros chorudos, como é o objectivo de qualquer empresa. O problema é quando o produto vendido, por permitir o seu uso e abuso, se torna um potencial problema de saúde pública. Vejamos o exemplo do jovem Luís, um pré-adolescente que deseja um telemóvel como o deserto deseja água. Os seus pais, crendo que dessa forma lhe poderão seguir os passos e combinar horas de recolha na escola ou no final das festas, que começa a frequentar, oferecem-lho. Para optimizar o magro saldo mensal que os seus progenitores lhe atribuem, o Luís escolhe uma operadora onde sabe que há um tarifário que lhe permite falar um número ilimitado de horas e enviar um número ilimitado de mensagens por mês. A troco de poucos euros mensais, o Luís vai poder comunicar com seus pais e amigos sem gastar nem mais um tostão. Maravilha! Mas serão tudo rosas? Serão mais
os espinhos. Milhões de jovens passam diariamente horas a falar, a mandar mensagens e a dormir com estes pequenos micro-ondas sempre ligados. Quais as consequências a médio e longo prazo das radiações que emitem? A poucos interessa divulgar os reais perigos, porque o que interessa sempre é o lucro e os impostos arrecadados com este negócio da China. Do meu modesto ponto de vista estamos perante um problema de saúde pública. Há estudos que apontam para uma relação directa entre o (ab)uso do telemóvel e problemas neurológicos ou oncológicos, entre outros, pelo que fomentar o abuso desta tecnologia por parte de crianças e jovens é, no mínimo, negligenciar-lhes a saúde. Estamos a criar uma geração que, por mais este motivo, terá uma qualidade de vida inferior à dos seus progenitores. A culpa também é dos pais e familiares. A desinformação leva-os a cair na oferta fácil e prematura de telemóveis a crianças de tenra idade (vem aí o Natal!), a paranóia da insegurança, inculcada pelos media, ajuda muito e a necessidade de se pertencer a um grupo acaba de compor o tóxico ramalhete. Pré-adolescente ou adolescente sem telemóvel é encarado como um “freak” cujos pais ainda devem viver na idade das cavernas. Sou professor e do que me é possível observar os telemóveis entraram, enquistaram e tomaram conta do quotidiano das nossas crianças e adolescentes com consequências graves para o seu desempenho escolar e social. É fácil encontrar jovens que, mesmo nas aulas com os telemóveis em silêncio, anseiam por uma mensagem ou enviam, à socapa do professor, outras e nos intervalos, preferem comunicar através de mensagens, em vez de privilegiarem a mais antiga forma de comunicação.
Mas não é só o telemóvel que está a transformar a forma como os jovens interagem. Numa turma duma escola do primeiro ciclo da Guarda alguém teve a ideia de dizer aos seus educandos para levarem os Magalhães para a escola para os utilizarem, pasme-se, durante o recreio. Desta forma, os corredores ficariam mais calmos e os putos passariam os intervalos a babarem-se para o teclado jogando no pequeno portátil. Foi catastrófico! Quem não levasse o Magalhães corria o risco de não ter ninguém para jogar à bola, à apanhada, andar à bofetada ou ir para os baloiços, como sempre se fez. Felizmente alguém se apercebeu dos efeitos nefastos desta ideia e, para bem dos catraios, restringiram o uso do Magalhães a uma vez por semana. Parabéns, voltaram as correrias e a alegria ao grupo.
Não há escola secundária neste país que não tenha jovens reunidos, nos intervalos, nas zonas de lazer agarrados a computadores e respectivos Messenger ou redes sociais da Internet. Em vez de comunicarem entre si, viram-se para o mundo exterior e estabelecem precárias e virtuais relações com “nicknames” sabe-se lá de onde. Sinal dos tempos. Estamos perante uma situação de patologia social grave que terá consequências funestas, pois criamos indivíduos que perante a fobia do contacto directo privilegiarão sempre um computador que, crêem eles, os liga ao mundo, mas, no entanto, os afasta de quem lhes é próximo. É o paradigma das sociedades futuras – jovens e adultos carregados de “gadgets” que lhes permitem o imediatismo relativamente a acontecimentos e pessoas do outro lado do mundo e, no entanto, profundamente solitários enfiados nas suas casas e/ou escritórios, tele-trabalhando, tele-divertindo-se, “tele-flirtando”, sem os prazeres proporcionados pelo contacto pessoal, com os abraços, os beijos, os risos, os choros e outras formas ancestrais de gregarismo. É o dealbar de uma sociedade Matrix onde tudo, mas mesmo tudo, será virtual.
Por: José Carlos Lopes