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Seis Ideias à Procura de Um Autor

Observatório de Ornitorrincos

Na década de 1920, Luigi Pirandello deixou seis personagens à procura de um autor numa peça surpreendentemente chamada Seis Personagens Em Busca de Um Autor. Na década de 1960, quarenta anos passados, eu não tinha ainda lido esta peça. Também não era nascido, mas não quero estar agora aqui a arranjar desculpas.

Enquanto reflectia sobre o assunto para o Observatório desta semana pensei: “Um bom escritor humorístico devia dar mais atenção ao Pirandello.” E depois acrescentei ao meu próprio pensamento: “Mas como não há nenhum que dê, vou eu falar nele.”

O teatro do Pirandello é importante por três ordens de razões (as razões devem vir sempre em trios de ordens, porque a razão, se estiver desordenada e aos pares, pode parecer escuteiros a vender senhas). Primeiro, é teatro sobre a própria linguagem do teatro. É como fazer um discurso vazio sobre o não dizer nada, mas ao contrário. (Aponte estas pérolas e use-as nas noites de esplanada. Em breve ninguém quererá falar consigo, o que é bom quando estamos a tentar comer um pires cheio de tremoços sem nos engasgarmos.) Segunda razão, as peças de Pirandello são uma análise psicológica e humorística da interacção humana. E ninguém nega, seja lá por que razão for, que estas análises são mesmo importantes. Eu já soube estas razões, mas ficaram num caderninho preto confiscado pela polícia onde eu tinha apontado, numa recolha sistemática, todos os sítios da internet dedicados a donas de casa com seios razoavelmente enormes. O conhecimento, em Portugal, é impedido pelo obscurantismo das forças policiais, e tudo porque, alegam eles, “as fotografias eram tiradas sem o conhecimento das pessoas”. Ora bolas, tanta coisa que nos acontece sem que demos dá conta… A terceira razão da importância do teatro do autor italiano – continuo a falar de Pirandello e não de, por exemplo, Topo Giggio – é que as suas peças são representadas em teatros onde o público se pode sentar e ver o espectáculo descansado. O leitor dirá agora que as outras peças também se representam em teatros com cadeiras. É verdade, respondo eu. E o leitor perguntará então que importância especial tem isso para o teatro de Pirandello. Eu peço agora ao leitor que se cale um bocadinho, que há aqui gente que precisa de acabar de escrever um artigo para o jornal. O leitor está sentadinho refastelado com o jornal na mão, mas eu estou aqui a tentar acabar o meu raciocínio e não me dá jeito ser interrompido constantemente por leitores mais armados aos cucos.

Esta pequena apresentação do teatro de Luigi Pirandello, Nobel da Literatura que almoçava e jantava sempre que vinha a propósito, introduz a minha intenção de apresentar quer ao público inteligente quer ao que lê esta coluna todas as semanas – e embora isto pareça um insulto e o seja realmente, não há ninguém a quem efectivamente se aplique – uma reflexão apócrifa intitulada “Seis Ideias Em Busca de Um Autor”.

Estas ideias são pontos de vista caídos em desgraça e que hoje em dia ninguém gosta de declarar publicamente a sua perfilhação. As ideias são:

– A Constituição Europeia pode ser um calhamaço inútil mas foi um francês que escreveu Em Busca do Tempo Perdido;

– Rapazes e raparigas entre os 16 e os 25 anos não são nenhumas crianças, podem fazer tudo como os outros, incluindo trabalhar, ter juízo na mona e dizer mal do governo;

– Beber leite pelo pacote e limpar “aquilo” aos cortinados pode causar enfartes do miocárdio nas mulheres (se elas virem);

– A Cova da Moura é um bom bairro para apreciadores de paint ball mais realista.

– As canções dos Delfins e do Pólo Norte deviam ser exportadas e eles deportados;

– Tirar macacos do nariz no café também não é nenhum horror.

Quem quiser, pode aproveitar e desenvolver para quando for convidado a participar no Prós e Contras.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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