Manuel Almeida, que renunciou recentemente ao mandato de vereador na Câmara de Celorico da Beira, não poupou ninguém na hora de explicar os motivos que o levaram a cessar funções e despediu-se com duras críticas ao actual executivo e à concelhia social-democrata local. Nada de novo dizem alguns dos visados, para quem o cabeça de lista da coligação PSD-PP nas últimas autárquicas já devia ter renunciado há mais tempo. «Saio com o apoio dos munícipes», garante, prognosticando que «algo de muito estranho» irá acontecer nas próximas municipais.
Com António Caetano e Armando Neves, respectivamente presidente e vice-presidente da Câmara, eleitos pelo MPT, na mira e Joaquim Valente, único vereador do PS, em segundo plano, Manuel Almeida desferiu na passada quarta-feira vários ataques contra os «mandaretes do poder local», os «cavaleiros da triste figura» e os «escolásticos» de Júlio Santos. Os primeiros foram mesmo responsabilizados pelos «sete pecados mortais» da Câmara de Celorico da Beira, desde a variante «megalómana», à «espiral» de dívidas a fornecedores, passando pela empresa municipal, a Celflor ou a Fundação de Celorico da Beira, mas também o endividamento nas «margens do incomportável», o futuro parque industrial, «onde um terço dos terrenos pertence à fundação», e a «ausência» de projecto para o município. «Tudo continua por esclarecer, há uma incapacidade total para o saneamento financeiro da autarquia, mas os escolásticos de Júlio Santos não se revêem neste cenário», acusa, sublinhando que «se a gestão do anterior presidente foi desastrosa, delapidadora e ruinosa, esta vai pelo mesmo caminho». Só falta mesmo que Caetano assuma a «responsabilidade política» deste cenário, porque «o vice-presidente de então é hoje o presidente», insiste.
Manuel Almeida lamenta ainda que, passados dois anos, ainda não tenha havido inspecções da IGAT à fundação e à empresa municipal. No primeiro caso, receia que possa haver «acordos por debaixo da mesa», enquanto no segundo duvida que o executivo tenha «coragem política» para reestruturar a empresa municipal, que «dá emprego a muita gente. Já em relação à concelhia local do seu partido, o ex-vereador admite terem sido abertas «feridas insanáveis e inultrapassáveis», sobretudo depois de ter pedido a demissão dos dirigentes e anunciado a sua candidatura à presidência daquele órgão. Um «cartão amarelo» para que a concelhia «se renovasse, abrisse ao diálogo e começasse a preparar as próximas autárquicas», refere, lembrando que a estrutura celoricense do PSD tem poucos militantes e «quatro ou cinco dirigentes», dois dos quais – António Araújo e Fernando Veiga – estão agora «na oposição» no executivo camarário. Nesse sentido, Manuel Almeida confessa que faltou o apoio político da concelhia, tanto assim que na última Assembleia Municipal os deputados do PSD votaram favoravelmente uma moção do MPT de repúdio ao ex-vereador.
«Aquilo foi uma verdadeira palhaçada, porque perderam duas horas a discutir Manuel Almeida», lamenta, admitindo que esperava mais de António Araújo, seu parceiro de vereação: «Votou sempre ao meu lado, mas era preciso outro tipo de solidariedade quando alguns indivíduos atacaram o PSD», queixa-se. Outros motivos de queixa terá ainda de Armando Neves, a quem acusa de ter sido «infamante, pecaminoso e triste» em reacção às declarações do ex-vereador, que em Agosto último insinuou em tom cáustico que «com Joaquim Valente os putos vão sempre à frente», numa alusão indirecta ao vice-presidente. «Foi humor britânico. O que queria dizer era que no tempo de Júlio Santos havia liderança, agora é uma anarquia, do género todos ao molho e fé em Deus», justifica-se.
«Já devia ter renunciado há mais tempo»
«Ainda bem que renunciou e já o devia ter feito há mais tempo, porque nestes dois anos não contribuiu em nada para a resolução dos problemas dos celoricenses», reagiu Armando Neves ao teor das declarações de Manuel Almeida. O vice-presidente estranha as críticas feitas na passada quarta-feira e recorda que em Janeiro deste ano o ex-vereador «teceu os maiores elogios» ao executivo. «Estas afirmações provocatórias já não são novas, ele estava a mais no executivo e já é passado. Desde Junho que a sua ausência às reuniões foram uma constante», acrescenta Armando Neves, que desafia o seu substituto a ter uma postura «mais coerente que a de Manuel Almeida desde Janeiro de 2002». Mais irónico, António Caetano socorreu-se também ele do «humor britânico» e considerou que o ex-vereador do PSD «é como aquelas estacas que se plantam para enraizar, mas como não enraizou acabou por ir embora». O actual presidente refuta as acusações, nomeadamente as que se referem à fundação. «Essa entidade é proprietária de seis hectares em 60 do novo parque industrial, mas nós não a reconhecemos e aguardamos que o Ministério da Administração Interna faça o mesmo, apesar de temer que haja talvez uma presumível conivência para lhe dar o reconhecimento tácito», conta o autarca, estranhando que este processo já se arraste há três anos. Contudo, António Caetano recusa-se a identificar quem ou como acontecerá essa alegada conivência, dizendo apenas que pode haver «algumas barreiras naturais que dilatem os trâmites legais». Até há hora do fecho desta edição, não foi possível conhecer a opinião de Joaquim Valente.
Luis Martins