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Retrato puro e duro da Beira Interior

Beira Interior tem territórios moderadamente inclusivos, envelhecidos e economicamente deprimidos, segundo estudo da Segurança Social

A Guarda, Covilhã e Castelo Branco são territórios moderadamente inclusivos e apresentam uma dinâmica que os aproxima das duas principais áreas metropolitanas do país, conclui o estudo da Segurança Social. «A concentração de serviços e centros de decisão tem repercussões no tipo de desenvolvimento e no tipo de integração alcançada, não sendo tão evidenciados os traços mais negativos dos constrangimentos», concluem os autores, destacando Castelo Branco como um dos concelhos que apresenta os valores «mais positivos» em termos da conclusão da escolaridade obrigatória por parte dos indivíduos com idades compreendidas entre os 18 e os 24 anos.

Nestes concelhos há dois tipos de dinâmicas que poderão constituir-se como motores de desenvolvimento e de promoção da integração. A Covilhã, por exemplo, é um município com cidade média com forte dinamismo demográfico, população qualificada, e bem equipados ao nível do saneamento básico e telecomunicações, o que a aproxima deste ponto de vista da dinâmica das capitais de distrito. Com um senão. É que verifica-se ali um dos casos «mais críticos» em termos taxa de desemprego de longa duração, embora seja na Covilhã que se regista o menor peso de beneficiários do Rendimento Mínimo Garantido face à população residente, à frente de Castelo Branco, mas ambos com valores inferiores a um por cento. Relativamente ao IRS per capita, todos os concelhos deste tipo apresentam em termos médios um valor de 393,8 euros. Um valor que está longe de se atingir no tipo dos territórios envelhecidos e desertificados (a média é de 242,23 euros), que corresponde aos espaços rurais (envelhecimento da população, concentração em pólos com menos de 5.000 habitantes, relevância do trabalho agrícola, peso diminuto da população qualificada e infraestruturas de telecomunicações deficitárias). Cumprem estes requisitos os concelhos de Almeida, Belmonte, Figueira de Castelo Rodrigo, Fundão, Gouveia, Manteigas, Mêda, Penamacor, Pinhel, Sabugal, Seia, Trancoso, Vila Nova de Foz Côa.

Sabugal é o oitavo concelho com menor IRS per capita no continente

Belmonte, Manteigas e Seia destacam-se, no entanto, devido a uma maior dinâmica demográfica e mais peso dos jovens. Os autores destacam ser nesta categoria que o isolamento das pessoas idosas é mais forte, com destaque para Penamacor, associado sobretudo à saída da população mais jovem. Nesse sentido, os concelhos de Fundão, Pinhel e Penamacor apresentam valores abaixo da taxa média de cobertura de equipamentos de apoio a idosos. Em contrapartida, Sabugal, Almeida, Seia registam os mais elevados. Seia é o concelho com a maior percentagem de famílias monoparentais (7,63 por cento), ultrapassando mesmo a média nacional. Já Manteigas é um dos concelhos em que se verificam mais situações familiares em que netos dependem de um dos avós. No caso da Mêda, o estudo constata que perto de 60 por cento das suas crianças de 0 a 3 anos estão em amas e creches. Um dado que lhe dá a liderança na categoria e no continente. É neste tipo de territórios que encontramos a mais baixa taxa de criminalidade do país, uma tendência explicada pelo empobrecimento destes concelhos.

Quanto à taxa de analfabetismo, mais de 32 por cento dos habitantes de Idanha-a-Nova são analfabetos, sendo este o concelho, seguido de Penamacor, em que este fenómeno atinge o valor mais elevado no continente. Cabe-lhe também a liderança no domínio do abandono escolar precoce, a par da Mêda. Do outro lado da serra, Seia apresenta uma taxa de desemprego acima da média nacional (11 por cento), enquanto Mêda, Pinhel e Trancoso têm os valores mais distantes da média do tipo. Manteigas é um dos concelhos com mais desemprego de longa duração, ao contrário de Pinhel, Figueira de Castelo Rodrigo e Trancoso. Por outro lado, o Sabugal é o oitavo concelho com menor IRS per capita no continente. Em contrapartida, Fundão e Seia são os municípios que têm mais percentagem de poder de compra. No que ao total de pensionistas na população empregada diz respeito, Penamacor tem quase dois pensionistas por cada pessoa empregada, enquanto o Sabugal regista os segundos valores anuais mais baixos de pensões processados no continente. Seguem-se Penamacor, Figueira de Castelo Rodrigo, Almeida, Mêda, Vila Nova de Foz Côa, Pinhel e Trancoso. Os valores médios de pensões processados correspondem a 2.707,31 euros, ligeiramente acima dos territórios envelhecidos e economicamente deprimidos (2.611,31 euros).

Fundão com menos RMG

Por sua vez, o Fundão é o terceiro do país com menos beneficiários do RMG, enquanto Almeida é o terceiro concelho do tipo com maior percentagem de população com deficiência face à população residente, correspondendo ao quarto lugar da hierarquia de concelhos com maiores valores de população com deficiência no continente. A conclusão nesta categoria é explícita: «Evidenciam-se aqui processos já consolidados de periferização. As situações de exclusão estão, essencialmente, associadas à pobreza e sobretudo aos pensionistas idosos e estes são territórios à beira da morte social». Uma ameaça que também paira nos municípios de Aguiar da Beira, Celorico e Fornos de Algodres, classificados como territórios envelhecidos e economicamente deprimidos. O primeiro é mesmo o nono nacional em termos de taxa de analfabetismo e tem mais de um pensionista por uma pessoa empregada, destacando-se o segundo quanto ao abandono escolar precoce com valores «pouco animadores» (2,8 por cento). Como se não bastasse, todos os municípios deste tipo registam os piores valores de IRS per capita, de beneficiários do RMG e do valor médio anual das pensões. Os autores do estudo concluem então que a exclusão nesta categoria «não é aquela que está associada ao corte dos laços sociais, mas sobretudo a que se prende com a insuficiência de recursos para suprir as necessidades e com a desqualificação».

Uma região dividida em três

Os territórios mais representados em Portugal são os moderadamente inclusivos, cerca de 30 por cento dos concelhos, seguidos dos envelhecidos e economicamente deprimidos (24,5 por cento) e dos territórios envelhecidos e desertificados (20,1 por cento). O estudo assinala um padrão caracterizado por níveis de inclusão «muito positivos» na educação (baixas taxas de abandono escolar e de saída antecipada) e na integração no mercado de trabalho (baixo desemprego) em 84 concelhos situados no litoral, entre a Área Metropolitana de Lisboa e a do Porto, e sedes de distrito. Um “oásis” que abarca 28,6 por cento da população residente.

Em contrapartida, cerca de um quarto dos concelhos do país estão marcados por «muitas e diversificadas» condições desfavoráveis, com destaque para os défices de integração familiar (idosos sós e famílias de avós com netos), de formação escolar, de integração no mercado de trabalho e de recursos económicos (elevado peso de beneficiários do RMG e muito baixo valor médio das pensões). Neste território ocupado pelos 68 concelhos identificados, onde está grande parte da Beira Interior, apenas residem 7,8 por cento da população do continente. Finalmente, a categoria dos territórios envelhecidos e desertificados corresponde a 20 por cento do território continental, com 56 concelhos, e a 4,9 por cento da população residente. As características deste tipo traduzem-se em traços de exclusão, «efectiva ou potencial», que se relacionam com o envelhecimento da população – institucionalização, idosos a viverem sós, analfabetismo, deficiências e grande desequilíbrio entre o número de pensionistas e de população empregada. Os sinais positivos associam-se apenas à fraca criminalidade, às condições de habitação e à prestação de serviços de acção social.

Luis Martins

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