Apesar de não haver qualquer consequência positiva digna desse nome, muito se tem falado do interior nos últimos tempos. Os incêndios geraram promessas, compromissos políticos, piedosas intenções.
Certo é que no interior estamos despovoados, cada vez mais sós, entregues a nós próprios. As empresas não encontram racional para cá investirem, a solidariedade estatal é o que é. Faz o que faz, ajuda mas não resolve.
O nosso afastamento das questões que determinam o futuro do país começa em coisas tão subtis como a campanha para as últimas eleições legislativas. Nos distritos do interior foi igual aos círculos da imigração – chegou apenas pelos órgãos de comunicação social. Expoente máximo das democracias liberais, o processo eletivo tem de corresponder a uma efetiva transmissão de legitimidade através do voto para os eleitos. Esta legitimidade só existe se houver uma relação material mínima, de contacto, entre eleitores e eleitos. Ora isso foi precisamente o que não houve: os votos em Passos Coelho, António Costa, nos outros partidos, produzidos no interior do país traduziram, apenas, um vínculo virtual, quase unicamente televisivo, entre quem votou e quem recolheu esses votos.
Depois, a produção legislativa e a ação governativa ressentem-se da virtualidade dessa relação. Um exemplo: a criação recente da empresa pública para a gestão da floresta, a “Lazer e Floresta”, ou da Rede Nacional de Investigação de Montanhas – ambas vão ter a sua sede em Lisboa… Ou seja, duas entidades bem necessárias para o interior vão, pela força objetiva das coisas, ter necessariamente uma relação distante com o objeto do seu trabalho e, em consequência, vão falhar, no todo ou em parte, os objetivos para que foram criadas.
Vale a pena também referir os CTT e as consequências que a sua privatização provocou na Guarda, por exemplo. Depois de uma pequena subida inicial da qualidade do serviço, uma parte da cidade passou a ser servida por uma agência situada num terceiro andar sem elevador (no Bonfim). Apesar dos protestos, a desqualificação do serviço permanece.
Perante isto, assiste todo o direito e toda a legitimidade para que as pessoas do interior se questionem: será que deveremos considerar quem nos desconsidera? Quando um povo se resigna e conforma com o que existe, não reclama e não produz alternativas, está condenado a não ser respeitado.
Urge, pois, mudar. Desde logo, na atitude. E na exigência de respeito. Só é respeitado quem se faz respeitar.
Por: Acácio Pereira
* Dirigente sindical