por Pedro
Desde os primórdios da sua existência que o Homem manifestou a necessidade de conhecer e explicar tudo o que via, tudo o que sentia, tudo o que o rodeava, tudo. Contudo, o predominante obscurantismo inicial inviabilizava a satisfação de tal curiosidade. Ora, julgo ter sido neste contexto que foi sendo criada uma das maiores obras-primas da História da Humanidade: a Religião. Não se tratou de algo pensado nem propositado, creio, mas algo acidental, de todo inevitável. As perguntas do Homem careciam de respostas críveis, aceitáveis. A Religião concedia-lhas.
A princípio rudimentar, esta constituía-se como uma espécie de mundo paralelo, sem elos de conexão diretos com a sociedade, sem representantes, sem profetas. Resumia-se, simplesmente, a rituais, que condicionariam o sucesso de determinadas práticas, e a explicações ideais do desconhecido. Com o passar dos tempos, presenciou-se uma notória evolução da Religião motivada pela evolução da humanidade. Observava-se, assim, uma simultaneidade entre a aproximação da Religião à perfeição, justificada por uma quase irrepreensível contextualização, e o decréscimo das iniciais questões irrespondíveis. Os profetas passaram a ser uma realidade e a sua influência na sociedade algo notável, abrangendo temáticas tão importantes e intrincadas como a dualidade ética/moral, o bem e o mal, a vida e a morte. Desta forma, foi incutida na sociedade uma série de pensamentos que causavam insegurança, receio, temor, acabando aquela por se refugiar em orações, promessas, dádivas. A inicial relação espontânea e facultativa pendia para algo simbiótico, quase obrigatório, como que dependente. Foi deste modo que, durante vários séculos, a Religião, criação humana, condicionou o desenvolvimento e progressão do Homem, incutindo uma perspectiva imutável e perfeita do mundo, que não poderia nem deveria ser alterada.
Nos últimos tempos, séculos, tem-se vindo a constatar uma evolução totalmente contrária. Os progressos científicos e tecnológicos, de que somos permanentemente alvo, têm-se sobreposto e têm diminuído a Religião, tornando-a menos crível, aceitável, praticável, na medida em que apresenta explicações divergentes. Toda esta situação culminou num natural afastamento da sociedade, mais instruída e informada, de tudo aquilo que não está cientificamente provado, de tudo o que corresponde a meras crenças. Ainda assim, constatamos frequentemente que, por mais descrente (ou, até, crente na inexistência de algo superior) que alguém seja, em situações adversas, limite, fora das suas capacidades, essa mesma pessoa reza, ora, pede auxílio a uma entidade superior, divina. Assim se justifica a indubitável importância da Religião.
Ainda que constituam tentativas diferentes de explicar tudo o que sucede, verificamos uma assombrosa diferença entre Ciência e Religião. Ao contrário da Ciência, que se encontra dotada da capacidade de alterar todos os seus princípios se tal for legítimo, a Religião é estática, limitada, conservadora, não sendo passível de desenvolvimento e evolução, por alegada perfeição inicial. São, definitivamente, estes aspetos caracterizadores da Religião que a tornam intolerante. Digo intolerante não só em relação ao progresso externo mas também a nível interno, não conseguindo uma convivência pacífica entre as diversas manifestações religiosas.