As férias de Verão terminaram e o João, a Maria e o Luis, tal como todos os outros meninos têm de acordar cedo para ir para a escola. Terminou a falta de horários para jogar playstation ou navegar na internet. Agora todas as horas têm algo pré determinado para fazer, ou, mais ou menos…
João é um menino como os outros a quem não lhe é permitido crescer como a todos os outros…
João tem um enorme desejo! Conhecer outros meninos, poder jogar à bola, poder comer em grupo, poder ser parte de um grupo, mas não pode.
João reconhece os outros meninos, distingue-lhes as feições e os gestos, mas não os seus risos, as suas fantasias ou os seus medos. João sabe quantos colegas tinha no último ano mas contava-os da janela da SUA sala … o espaço onde ele podia sonhar, olhar, e fantasiar como marcar um golo fantástico na baliza do “chato do Pedro”.
Hoje, de regresso às aulas, uma lágrima cai-lhe pelo rosto ao vislumbrar a escola ao fundo da rua, sem saber ao certo o que o espera…
A Maria tem oito anos e este é o primeiro em que frequenta uma escola…
Com os seus pais, vai hoje a caminho do impossível. Está muito sorridente e excitada por ir conhecer novos meninos e aperta com muita força as mãos dos pais. Daqui a um ano já vai conhecer alguns…
Luís está irritado.
Nãaaaao! Luís não quer! – Diz ele repetidamente à porta do quarto, baloiçando-se frenético contra a parede.
A mãe do Luís, olha para o seu traquina e entrega-lhe o seu jogo favorito – “o jogo das tarefas diárias do Luís”. Luís olha para ele e vê que as tarefas mudaram. Agarra-o com mil perguntas na cabeça e pesquisa o jogo até perceber o que mudou e assim começa a ficar mais calmo.
Esta é a história de hoje do Luís! – Diz a mãe com toda a paciência do mundo. Então torna-se possível mostrar ao Luís e ao ente que vagueia constantemente a seu lado, o que iria realizar nesse dia.
Luís é um menino muito esperto. As contas para ele são canja e a internet um meio eficaz de despertar o seu interesse.
Este ano o Luís vai ter sorte. Na escola há um lugar para ele porque o governo ofereceu mais um computador…
Luís vai passar mais um ano, virado para o seu pequeno mundo com a companhia do seu ente. Não decidi ainda, se daqui a um ano, o Luís vai reconhecer alguns colegas, certo de que conhecer não vai de certeza.
João, Maria e Luís são três meninos, iguais a tantos outros que sonham vir a ser corredores de F1, astronautas, ou veterinários.
João, trocaria as rodas fininhas que empurra com as mãos, por pneus altamente motorizados.
Maria, esforçaria a sua condição de Down, para estar mais Up junto das estrelas.
Luís, dedicar-se-ia a outros entes mais palpáveis.
O fim desta história, fica por inventar. Vou esperar com esperança (e isto não é só um pleonasmo…) para o escrever um dia em que o presente, mais optimista, me traga um final feliz, sem alterar o tom realista.
Gostaria ainda de deixar uma nota final de reflexão:
Uma “escola inclusiva” segundo a declaração de Salamanca de Junho de 1994 (Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, organizada pela UNESCO) consagrou quatro princípios fundamentais: (1) o direito à educação é independente das diferenças individuais; (2) as necessidades educativas especiais não abrangem apenas algumas crianças com problemas, mas todas as que possuem dificuldades escolares; (3) a escola é que deve adaptar–se às especificidades dos alunos, e não o contrário; (4) o ensino deve ser diversificado e realizado num espaço comum a todas as crianças.
A “escola inclusiva” pressupõe o modelo de pertença a uma instituição, a uma casa comum. Passados treze anos pergunto-me, o que é feito dessa escola?
Por: Carla Madeira