Para 2017 desejei que os meus conterrâneos escolhessem com discernimento e lucidez quem nos governaria nestes quatro anos. Hoje, reconheço que o povo, quando não é sábio, é prático. Num tempo em que à política só o nome se lhe reconhece, tomada que está por individualidades nada individuais, tudo se prefere em papéis tão pardos como os gatos, à noite. Optou-se, por isso, pelo novo, enfeitado, engalanado, muito festejado e disseminado através de panfletos. Belos panfletos que hão de ajudar a decorar a sacristia onde se acaba a marinar as maquiavelices da semana em lamúrias de circunstância. “A saúde está uma desgraça, construa-se um novo hospital!” “A educação não anda bem, municipalize-se!” “A segurança é o que se sabe, comprem-se mais pistolas!”
Cá do fundo, vou pensando com os meus botões que, de esmolas e lamúrias, há muito me fartei. Então, ninguém reparou na bela recuperação do edifício do sanatório da Serra para hotel? Agora, querem convencer-me da irrecuperabilidade dos edifícios do Sousa Martins para Hospital!… Pois, por mim, dispensava mais um monte de tijolos a roubar espaço ao parque que, pretensamente, alguns tanto apregoam querer defender. A propósito, quem, em nome da Natureza, com tanto alarido se levanta contra toda a obra urbana, julgou não vir o mesmo mal ao mundo, à Guarda, no caso desta obra? Eu bem que sempre desconfiei desta gente!
Ah, e a municipalização do ensino que, sendo propósito assumido de outros poderes, bem acarinhada me parece ser por estes? Embora inutilmente, digo já que não acredito em santos da casa, muito menos dos que se instalam na casa dos vizinhos. Se nunca os milagres feitos ensinaram quem quer que fosse, como é que os por fazer vão ensinar? Mas claro que eu ainda sou do tempo em que, para se ser colocado numa escola, bastava constar duma lista graduada. Fátuas hierarquizes que só servem para empecilhar os requisitos da vida moderna.
Quanto a pistolas? Bem, quanto a pistolas, prefiro não me pronunciar muito, porque confesso que delas pouco mais sei além de que servem para dar tiros. A maioria deles, direitinhos aos pés, é certo. A propósito, não confirmei ainda, mas o último caso das sociais almofadas com que nos pretendem acomodar, pareceu-me isso mesmo, um verdadeiro tiro no pé das IPSS…
Pelo sim, pelo não, deixo o meu contributo aos que, heroicamente, persistem numa de “Economia Social”: comecem por identificar um desvalido; depois multipliquem-no por dez, no mínimo, para ter um número razoável que justifique a constituição de uma associação; convençam a Comunidade de que não existe resposta social para tal problema e, se existir, que não é a adequada; apresentem-se na Segurança Social como os únicos capazes de colmatar tal lacuna; vão para a porta do híper vender, pedir, com um autocolante no peito e um saco na mão; aí, chamem um jornalista para explicar ao mundo que vos move o altruísmo e o espírito solidário (lembro que a ordem não é arbitrária). Pronto, por esta altura, é suposto que tenham já mobilizado gente muito importante para a causa. Como, por exemplo, políticos, a quem dá sempre muito jeito esse tipo de montra, empresários, sempre ansiosos por mais isenções fiscais, gente anónima, raros são os que se esquivam à possibilidade de lustrar a auto estima com as asas do saquinho… Depois de constituída, já nada deverá ameaçar a vossa associação, mas convém nunca esquecer de passar, periodicamente, de autocolante ao peito e saquinho na mão, pelas portas dos híperes.
Indo ao que me aqui traz, já que de lirismos estamos conversados, para 2018, além daquelas coisas todas do costume, desejo que os meus concidadãos – e quem os governa – sejam, acima de tudo, pragmáticos!
Fidélia Pissarra*
* Professora, inicia colaboração mensal com O INTERIOR