Sexta, 13 Outubro de 2011. Um dia que perdurará na infâmia. Na política, como no futebol, o que é verdade hoje, amanhã é mentira. Assisto estupefacto a um roubo a um segmento da população portuguesa, os funcionários públicos. Passos Coelho, num ato de desespero financeiro, informa-nos, solenemente e com semblante carregado, que iremos ser chamados, mais uma vez, a remediar a situação insustentável a que o país chegou fruto, principalmente, dos desvarios do Sócrates e sua “entourage” parasitária nos últimos seis anos. Parcerias publico-privadas (PPP’s) para as vias de comunicação, saúde e educação, permitiram o jorrar de milhões de metros cúbicos de betão e betuminoso com a fatura a ser paga nas próximas décadas.
Questiono-me, enquanto me tento recompor, como irei fazer para continuar a honrar os meus compromissos. Como irão fazer milhares de funcionários públicos que se encontram em situação ainda mais desconfortável. Não há plano económico-financeiro familiar que resista a uma subtração tão radical. Todos fizemos contas ao assumirmos compromissos e todos contámos com catorze meses de salário, mudar as regras a meio do jogo, além de ser injusto é sujo. É o mesmo que, num jogo de futebol, o fora de jogo deixar de existir e, em consequência, os defesas deixarem de saber como defender. Quantos de nós usamos (usávamos) o subsídio de férias para efetivamente fazer férias? Ou o de Natal para comprar prendas inúteis? Parece-me mais provável que os mesmos sejam utilizados para fazer a revisão do veículo, comprar pneus, atestar a caldeira para o inverno ou comprar lenha, comprar alguma roupa e material escolar, enfim, um sem número de coisas imprescindíveis a um quotidiano com o mínimo de qualidade. E agora acabou! E quem pensar que estes salários alguma vez voltarão está, provavelmente, enganado. É a mudança de paradigma. Poupança a todo o custo para as tempestades que se avizinham. A EDP avisa-me que o meu custo certo mensal vai aumentar em vinte por cento em nome dos imperativos ajustamentos tarifários. As finanças preparam-se para me aumentar brutalmente o Imposto Municipal sobre Imóveis. Agora, para além do empréstimo da casa e do aumento dos bens essenciais, temos mais esta renda mensal que é o IMI (o que está a dar mesmo é ser-se inquilino). Como não há nada que esteja mal que não possa ainda ficar pior, esta espiral violenta de delapidação dos ordenados gerará menos consumo, logo, menos impostos e, consequentemente, mais défice e mais austeridade. O problema é que os grandes sumidouros do dinheiro público estão nalgumas autarquias, empresas municipais e PPP’s. Nestas os altos quadros e quadros intermédios continuarão, aparentemente, com mordomias como Visas dourados, carro de empresa/família, combustível e outras ajudas de custo, pelo que fica sempre a sensação de que o “normal” funcionário público e restante povo são a carne para canhão e que os sacrifícios de pouco irão servir para endireitar isto. É como tentar conter um rio com uma rede, a hemorragia continuará.
Há já algumas noites que faço contas de “sumir”, esperando que aquelas despesas extra (que acabam sempre por nunca o ser) na saúde, mecânica, seguros (para tudo e mais alguma coisa), entre outras, não ocorram. Confesso que ainda sou atormentado com aquelas palavras do Passos. Como irei fazer para dar educação universitária aos meus filhos? O que farei se me surgir uma doença grave? Tudo irá mudar, tudo irá piorar. Passaremos do gastar como se não houvesse amanhã, para o poupar para poder haver amanhã; das férias em “resorts” em Espanha para os parques de campismo; da reforma garantida para o trabalho até morrer; dos sapatos novos para as meias solas; da boutique para a costureira. Reutilizar passará a ser mais do que um imperativo ecológico, um imperativo económico. O aquecimento central passará a aquecimento individual (pantufa e robe), o carro todos os dias a carro partilhado ou transporte público. O povo português é engenhoso e adaptável, mas custa muito a quem já comeu “filet mignon” passar a roer coiratos ou, como diz o povo, “andar de cavalo para burro”.
Entretanto os abutres do FMI e respetivas potências financeiras preparam-se para se banquetear com o que restar das nossas empresas públicas e do nosso país. A nossa centenária nação deixará, tecnicamente, de existir, subjugada por outras nações e corporações. Portugal, “Rest in peace” (RIP).
Por: José Carlos Lopes