Devo o melhor de mim, e algum do pior, aos meus professores. Tive de tudo. Afinal de contas, foarm cinco anos de escolaridade na França dos anos sessenta e mais de vinte em Portugal, de 1970 até ao final do meu estágio para a advocacia. Pelo meio, houve um (excelente) professor de guitarra portuguesa em Coimbra, na AAC, até eu concluir que precisava de pelo menos quatro mãos para tocar a Melodia nº 2, de Carlos Paredes, e acabar com o que se estava a transformar num embaraço para ambos. Houve também Marino Ferreira, que inventou do nada o Grupo de Xadrez da Guarda e me transformou, apesar da fraca matéria prima, num nos melhores jogadores nacionais (já não sou, mas a culpa não é dele). Ainda hoje recordo os seus métodos, totalmente autodidactas, simples mas eficazes. Conseguia manter a motivação a níveis que poucas vezes vi noutros professores. Como por exemplo Orlando de Carvalho, que conseguia o milagre de tornar a mais árida matéria jurídica numa experiência intelectual estimulante, ou Antunes Varela, que transformava em simples o mais complicado. Ainda hoje tenho remorsos de ter faltado a tantas aulas deles. E houve outros, desde logo no liceu da Guarda, como por exemplo Marília Raimundo (maldita a hora em que se meteu na política e se perdeu uma grande professora), ou, não posso esquecê-la e não a esquecerei até ao fim dos meus dias, a querida professora Ermelinda da minha quarta classe. Já estou a ser injusto, que os não nomeio a todos e devo tanto a todos eles. Mas não posso, tenho quarenta e oito anos e em mais de metade da minha vida fui estudante e tive muitos, muitos professores.
Tive-os também péssimos. Tive-os que faltavam muito, que apareciam embriagados nas aulas, que eram injustos na avaliação e sabiam pouco da matéria. Tive uma professora que me esbofeteou, em França, por eu tossir. Achava ela que eu, que estava com uma crise de asma, a provocava. Também nunca a esquecerei. Houve outros, nos velhos tempos do PREC, que achavam incorrecto, até socialmente injusto, eu ter melhores notas que os meus colegas. Outros ainda, demasiados, passaram em silêncio, como sombras, sem deixar rasto na memória.
Houve ainda uma professora, em Saint Denis, escola Victor Hugo. Era bonita e bem disposta. Vestia aquelas mini-saias do final dos anos sessenta e as cabeças viravam-se quando ela passava. Na sala ao lado, pontificava o temível “Pére-a-Mort”. Contavam-se histórias de miúdos mal comportados que ele pendurava de pernas para baixo na janela da sua sala, no terceiro andar da escola. Mas um dia, numa fria e escura manhã de inverno, estávamos todos no pátio da escola à espera da hora de começarem as aulas, alguém nos chamou a atenção e olhámos para cima, para a nossa sala. Estava apenas uma luz acesa e, à contra-luz, reconhecemo-los logo, estavam, beijando-se apaixonadamente, a nossa diáfana mademoiselle e Monsieur “Pére-a-Mort”. Nunca os esquecerei.
Por: António Ferreira