O Tribunal de Vila Nova de Foz Côa ordenou terça-feira, ao princípio da noite, a prisão preventiva de um dos dois homens detidos por suspeita de homicídio de dois militares da GNR em Freixo de Numão. O arguido que fica a aguardar o desenrolar do processo em prisão preventiva tem 49 anos e é o pai do jovem de 25 anos que provocou os desacatos na vila duriense que obrigaram à intervenção dos dois guardas, posteriormente mortos a tiro. Já o seu filho está indiciado pelo crime de posse ilegal de arma, tendo ficado em liberdade provisória, mediante Termo de Identidade e Residência (TIR). O interrogatório judicial dos dois arguidos durou mais de seis horas e só terminou perto das 20 horas. O arguido a quem foi aplicada a prisão preventiva foi transportado de imediato para o Estabelecimento Prisional Regional da Guarda, onde ficou detido.
Viveram-se momentos de grande tensão e muita confusão nas imediações do tribunal fozcoense, onde os suspeitos deram entrada ao princípio da tarde de terça-feira debaixo de insultos e tentativas de agressão. A GNR viu-se mesmo forçada a intervir para acalmar os ânimos exaltados dos populares, alguns dos quais ainda aguardaram à porta do tribunal pela saída dos arguidos. Longe dali, realizaram-se durante a tarde do mesmo dia em Cortes do Meio (Covilhã) e Poço Velho (Almeida) os funerais de Sérgio Russo, de 27 anos, e Francisco Inês, de 24 anos, respectivamente. Marcaram presença nas cerimónias o Ministro da Administração Interna, o comandante geral da GNR, os Governadores Civis da Guarda e Castelo Branco, bem como os comandantes da Brigada Territorial n.º5, da região Centro, e do grupo territorial da Guarda e Castelo Branco, para além de inúmeros colegas, amigos e familiares dos jovens guardas. Todos partilham a mesma indignação e o choque emocional dos habitantes de Freixo de Numão, onde poucos puderam conter a revolta causada pela tragédia e alguns defenderam uma justiça mais dura para estes casos. «Se estes homens mataram também deviam morrer. Ou então haviam de lhe cortar a mão com que dispararam, como fazem nalgumas nações», afirmou João Nicolau, enquanto um vizinho lamenta que os dois agentes não se tenham podido defender. «Eles deviam ter lá chegado e puxado logo da pistola. Mas se calhar nem tiveram tempo para isso», refere, adiantando que o jovem era «muito problemático» e que já tinha tido problemas com a GNR local.
MAI garante pagamento de subsídio de vida
A morte dos dois militares promete marcar a vida de Freixo de Numão, porque a tragédia aconteceu por ocasião das tradicionais festas da Nossa Senhora da Carvalha, imediatamente canceladas assim que se soube da notícia. Por estes dias ainda ninguém esqueceu o sucedido e não se fala de outra coisa na vila, visivelmente a recuperar do choque. Segundo a GNR, tudo aconteceu na madrugada de domingo após o jovem, que já tinha antecedentes criminais por porte de arma ilegal, ter provocado desacatos e disparado para o ar no recinto da festa. Sérgio Russo e Francisco Inês estavam «informalmente» no local e à civil, tendo-se um deles apercebido das ameaças a um jovem. Os dois agentes deslocaram-se então ao posto da GNR, para recolher as armas e os coletes de identificação, e seguiram até à casa do suspeito, «onde terão sido abatidos provavelmente sem terem tido possibilidade de defesa», acrescenta a Guarda Nacional Republicana. Os corpos só foram encontrados por volta das três da manhã, quando uma segunda patrulha chegou ao local e descobriu os dois militares mortos com tiros na cabeça, um no átrio acimentado da casa, «com indícios de ter sido arrastado», e outro no quintal das traseiras. De seguida, o cerco à casa foi montado pela GNR, tendo-se o filho entregue de imediato.
Mais tarde, cerca das 5h30, numa altura em que agentes da Polícia Judiciária já se encontravam no local, foi a vez do se entregar. Na habitação, as forças policiais encontraram ainda duas caçadeiras e um revólver de calibre 6.35, ilegal, que foram apreendidos. Aníbal Carvalho, comandante dos bombeiros de Foz Côa chamados ao local, adianta que os ferimentos «eram de tal maneira graves que um deles até ficou irreconhecível. Já não havia nada a fazer». O Ministério da Administração Interna esclareceu terça-feira que o subsídio de vida negociado com as associações profissionais entrou em vigor no dia no dia 18 de Agosto, o que significa que a lei vai ser aplicada neste caso mesmo sem estar regulamentada.
Uma medida que tinha sido reclamada pela Associação de Profissionais da Guarda (APG), que na segunda-feira exigiu o pagamento de compensações às famílias dos dois militares. «Negociámos um subsídio de vida que será atribuído às famílias de elementos da GNR em caso de morte. Esta promessa ainda não foi regulamentada, mas esperamos que isso não seja desculpa para que nada se faça neste caso», avisou na segunda-feira José Manageiro. O presidente da APG lamentou também que «não existam coletes à prova de bala para os militares em patrulha», devido à «falta de investimento» da tutela em equipamentos de protecção individual. «São mais dois elementos da GNR que, no exercício das suas funções, perdem a vida ao serviço da segurança das populações», lamentou, considerando ter chegado a hora do Governo «inverter a sua política relativamente às condições de segurança dos nossos agentes». Nesse sentido, a direcção da APG reclama o «reforço dos meios indispensáveis ao exercício da função policial».
Luis Martins