Este verão, lembram-se?, ia ser o mais quente dos últimos cento e cinquenta anos. Estamos em ano de El Niño e as temperaturas médias têm vindo a subir descontroladamente. Revejo os dados e interrogo-me: se está assim tão quente, por que raios trago hoje, a um dia do início do verão mais quente de que vai haver memória, uma camisola vestida?
Até ao fim do ano a Delphi vai despedir na Guarda mais de quinhentos trabalhadores, com fundamento em falta de trabalho. Ontem, numa rádio local, ouvi um anúncio de admissão de pessoal da … Delphi.
Há dois anos começou a prever-se uma pandemia de gripe das aves, no pressuposto da inevitabilidade da mutação do vírus para uma estirpe que se pudesse transmitir entre humanos. Ia acontecer, mais tarde ou mais cedo. Antes previu-se o mesmo com a SIDA, que hoje, à excepção de África e de alguns países do leste europeu, parece estar sob controlo.
Em 1999 previa-se o final da civilização, tal como a conhecemos, pelo simples facto de os computadores e dos ships embebidos não estarem preparados para datas de quatro dígitos, pelo que em 1 de Janeiro seguinte não saberiam ao certo se estariam em 2000 ou em 1900. Atendendo a que praticamente todos os sistemas vitais dependiam já de computadores, tudo iria falhar.
Era também no final de 1999 que o mundo iria terminar, ao menos para várias e desvairadas seitas, com o advento do anticristo ou a segunda vinda de Cristo à terra ou a chegada de uma nave espacial de extra-terrestres, proveniente de Alfa de Centauro.
Passámos também há muito a data em que era suposto o petróleo acabar ou as viagens espaciais se tornarem rotineiras.
Tudo isto é verdade, no sentido de que nada de especialmente grave aconteceu, de que todas as previsões falharam, umas mais miseravelmente que as outras. E contudo, quem pode ter a certeza de que ainda esta semana o tempo não vai começar a ficar mais quente, ficando insuportável em poucos dias? Quem duvida dos futuros despedimentos na Delphi?
O efeito perverso de algumas previsões falhadas é ficarem boicotadas excelentes oportunidades para mudança de comportamentos de risco. Vão agora dizer, graças a este verão tardio, que o aquecimento global é uma treta. Ou que não há necessidade de gastar dinheiro à procura de combustíveis mais amigos do ambiente. A apoiar esta ideia há uma longa lista de previsões falhadas, não se fazendo a distinção entre o que não era de qualquer forma provável que acontecesse (o fim do Mundo) e aquilo que pode ainda acontecer, a qualquer momento (a pandemia de gripe das aves)
Pode ser, mas pode ser também verdade que continuamos agarrados a um mundo que já não existe e que pura e simplesmente recusamos admiti-lo. (A estação meteorológica em cima da minha mesa prevê sol para amanhã.)
Sugestões
Um livro: Mentiras Fundamentais da Igreja Católica – Como a Bíblia Foi Manipulada (Pepe Rodriguez, Terramar 2007). Uma leitura objectiva e cruel do livro mais lido e pior lido de sempre. Segundo o autor, não teria custado assim tanto a Deus, ou a quem ele inspirou para o efeito, começar a Bíblia com um relato cientificamente mais correcto da criação do Mundo, por exemplo explicando como foi desencadeado o Big Bang. Pelo menos os ateus teriam hoje menos argumentos.
Por: António Ferreira