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Prestar contas II

Vox Populi

O relatório de Gestão da Câmara Municipal da Guarda, pela qualidade que apresenta, merece de novo a nossa reflexão. O seu conteúdo, cumpre bem o estipulado pela legislação e chega a ser pedagógico quando é preciso, para que todos o possam ler, entender e comentar. Alguns, que deviam estudá-lo atentamente, não o fazem e é pena.

Os recentes comunicados e as respectivas reações, exigem mais este trabalho, ainda antes de podermos analisar também as empresas municipais. Na página 14 do referido relatório pode ler-se, quanto a despesas orçamentadas, as definições:

– Cabimentado – é a cativação de determinada verba, visando a realização de uma despesa.

– Compromissos – são a assunção face a terceiros da responsabilidade de realizar determinada despesa.

– Realizado – é a contabilização dos bens, serviços e outras despesas que são devidas a favor de terceiros.

O Pago, não carece de definição, mas obviamente só se pode pagar o que foi realizado.

Vejamos então o que podemos retirar das contas, se utilizarmos os conceitos lá definidos.

Para se perceber melhor, lembramos os valores globais orçamentados para despesa, que, para 2004, foram 75.890.052 euros; para 2005 88.449.451 euros e para 2006 76.445.262 euros (o tal que por ter descido em relação ao ano anterior, teve o voto favorável até da oposição – benefício da dúvida). Destes valores, que se presumia irem ser gastos, como ficaram as coisas?

Ano 2004 – cabimentaram 58.956.120 euros (77,7%), realizaram (leia-se contabilizaram) 47.020.792 euros (61,95%) e pagaram 30.082.776 euros (39,6%). A diferença entre o cabimentado e pago foi de 28.873.344 euros – decidiu-se assim, solenemente, em sessão de Câmara, comprometer/prometendo gastar quase o dobro do que viriam a ser capazes de pagar.

Ano 2005 – cabimentaram 65.308.868 euros, realizaram 51.240.788 euros e pagaram 30.481.676 euros. A diferença entre os mesmos é de 34.827.192 euros – já bem superior ao dobro do que foram capazes de liquidar.

Ano 2006 – cabimento 67.490.759 euros, compromissos de 60.613.954 euros, realizado 54.774.299 euros e pago 30.321.732 euros. As diferenças aqui são:

1 – Entre cabimento e pago é 37.169.027 euros, o que significa que decidiram, em reunião de Câmara, cativar mais 122,58% do que seriam capazes de vir a pagar. Depois não estranhem as reacções, em particular das Juntas de Freguesia.

2 – Perante terceiros (fornecedores), comprometeram-se (assumiram responsabilidades) com quase o dobro (+ 99,9%) do que seriam capazes de pagar.

3 – Realizaram, ou seja contabilizaram, mais 24.452.567 euros (+ 80,64%) do que era a sua capacidade de liquidar.

4 – Do que previam gastar em orçamento – recordo 76.445.262 euros –, comprometeram-se com 79% disso e realizaram (contabilizaram, ou seja, já está facturado) 71% do que afirmaram querer gastar, mas só pagaram 39,66% dessa mesma intenção.

É assim que a economia local fica mais pobre, porque entre facturado e pago só no exercício de 2006 ficaram em dívida 24.452.567 euros. Se nos lembrarmos de que quem fornece, também tem fornecedores, e trabalhadores, e obrigações com o Estado (o IVA, por exemplo, tem que ser entregue em dois meses, por regra), facilmente se conclui, que a Câmara da Guarda tolhe o desenvolvimento, em vez de cumprir a sua missão de ajudar ao mesmo desenvolvimento.

É assim que a dívida, já contabilizada, representava em 31/12/2006 o valor de 46.878 858,91 euros, ou seja 9,4 milhões de contos, sendo que, a acreditar na recente entrevista do senhor presidente da Câmara ao jornal “Diário das Beiras” (8/5/2007), a dívida já será de 49 milhões de euros. Ou seja, cresce por mês cerca de um milhão de euros.

Como estancar esta sangria e ao mesmo tempo contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos guardenses seria a questão. A resposta não está na nossa mão, mas devemos, por compromisso cívico e pelo exercício responsável de cidadania, avisar desde já os incautos e dizer que “O REI vai nu….”

Será que não merecemos melhor? Será que estamos condenados a esta forma “socialista” de gerir a nossa autarquia?

Sei que não, o tempo será bom conselheiro….

Por: J. L. Crespo de Carvalho

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