Está patente no Centro de Artes Visuais em Coimbra, uma exposição de fotografia dedicada aos anos 90. Intitulada “Esta terra é a tua terra”, apresenta mais de uma centena de fotografias realizadas por quinze artistas, portugueses e estrangeiros, sob diversas encomendas dos Encontros de Fotografia. O interesse da exposição torna-se assim plural: por um lado permite-nos aceder à coleção dos Encontros de Fotografia que não se encontra em exibição permanente. Com origem nos anos 80, enquanto festival dedicado à fotografia, ao longo das suas várias edições, os Encontros de Fotografia exerceram um papel determinante na fomentação, circulação e divulgação da fotografia artística em Portugal. Aí periodicamente se encontravam vários fotógrafos internacionais, alguns dos quais preponderantes na formação de futuros artistas e críticos portugueses. À medida que a organização (ligada à Associação Académica) foi conseguindo apoio de embaixadas, tornou-se possível enveredar também pela produção fotográfica e encetar uma política de encomendas, na esteira de vários projetos históricos, quiçá um dos internacionalmente mais conhecidos aquele realizado em plena Depressão norte-americana (Farm Security Administration, 1935-1942). Deste modo, a presente mostra assenta igualmente em pressupostos documentais, pois todas as obras – na sua grande maioria a preto e branco e de pequeno formato – foram concebidas sob a chancela dos Encontros de Fotografia, em jeito de registo visual das realidades sociais e territoriais do nosso país nos anos 90. Sérgio Mah, comissário da exposição, esclarece o propósito: “recentrar a vocação da fotografia enquanto meio privilegiado de aferição da realidade, como um médium destinado a apelar à memória dentro da actualidade e à compreensão da actualidade dentro da história.”
Tive oportunidade de visitar a exposição com os meus alunos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e fiquei particularmente satisfeita com o seu interesse e reações perante as obras. Pedi-lhes que escolhessem uma que mais lhes tocasse e que sobre ela tecessem alguns comentários. As escolhas recaíram sobretudo na sombria série de Paulo Nozolino dedicada aos toxicodependentes do Casal Ventoso. Mas houve um aluno que escolheu uma fotografia da artista espanhola Cristina Garcia Rodero, de um conjunto de 1996 fotografado nos Açores. Quando lhe perguntei por que escolheu aquela, a resposta foi simples: “Porque é o nosso país numa fotografia”: uma carrinha de caixa aberta, numa estrada no meio da paisagem, uma escultura de um santo e uma banda filarmónica.
Praticamente vinte anos passaram desde estes registos fotográficos. O mundo mudou, o país mudou. Reforçámos os laços europeus, renovámos as nossas cidades, construímos novos relacionamentos entre o espaço urbano e rural, qualificámos os nossos jovens, tornamo-nos destino turístico de eleição. Mas também conhecemos novas formas de terrorismo, atravessámos uma nova crise, voltámos a emigrar… Hoje, como há 20 anos, há muito a confrontar, repensar, redefinir. Mas será que ainda cabemos numa fotografia?
Tânia Saraiva
* Historiadora e crítica de arte. Professora universitária.