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Pois, Pois

A PROVA DE FOGO DE VALENTE. O Luís-Baptista Martins tem razão quando diz (última edição d’ O Interior) que o anúncio oficial da candidatura de Joaquim Valente revelou algum amadorismo. Para já, há de facto uma falta de imaginação que se traduz, por exemplo, numa abusiva colagem à recente campanha de Sócrates com o “Acreditar”. Acreditar em quê? No caso de Sócrates, percebia-se a mensagem: nós somos diferentes da trupe de Santana, somos sérios. No caso de Valente, quererá isso marcar alguma ruptura em relação aos mandatos anteriores do PS? Os recorrentes elogios a Maria do Carmo contradizem essa ideia e, por isso, este slogan gera confusão e não se percebe.

Os três vectores anunciados no seu discurso – estratégia para o crescimento e desenvolvimento; políticas sociais como âncora de coesão e qualidade de vida – são ainda vagos e pertencem ao discurso oficial do PS nacional para esta campanha. Nada de original, portanto. Aguardamos por isso por propostas mais concretas e, claro, pela lista, que deve ter caras novas misturadas com gente com experiência. Todavia, nenhum dos supracitados “vectores” passará de retórica se Valente não tiver a coragem e a força política para reorganizar toda a administração municipal, que é pesada, lenta e, por consequência, um entrave a qualquer tentativa de “desenvolvimento sustentado e sustentável”, para usar as suas próprias palavras. Será esta a sua grande prova de fogo enquanto presidente. É pela base que se tem de começar.

O CLUBE DE TODOS OS REGIMES. O dr. Salazar, que até nem gostava de futebol, usou e abusou do Benfica dos anos 60. Como os “vermelhos”, entretanto convertidos por ordem superior em “encarnados” – não fosse alguém confundi-los com os outros “vermelhos” –, se distinguiam da mediocridade reinante, o velho de Santa Comba quis transformar o SLB num símbolo do regime. Era a época dos três F’s: futebol, Fátima e fado, o chamado “ópio do povo”. Isto foi há cerca de 40 anos. Hoje, o SLB é um modesto clube em termos europeus. Lá fora, já ninguém o conhece, tirando talvez os mais velhotes. Acompanho futebol há 20 anos e não me lembro de um campeão nacional tão medíocre e com tanta falta de categoria. Não é, portanto, de admirar que nenhum sportinguista ou portista tenha, com honestidade, dado os parabéns a um campeão deste calibre, ainda por cima levado ao colo descaradamente pela comunicação social, a liga, a arbitragem e o diabo a quatro. Nada disto porém impediu uma verdadeira euforia nacional. Nunca vi tamanha excitação mediática. A RTP 1 (a tal do “serviço público”) teve sete (repito, sete) horas seguidas com directos dos festejos do título. Houve até debates – por favor, não se riam – a discutir os efeitos da vitória do Benfica sobre a produtividade nacional! Palavra de honra! E um jornalista da SIC falava disto tudo seriamente sem desatar às gargalhadas. É obra. Órgãos de comunicação social fizeram inquéritos, que, segundo os entendidos, mostravam que os adeptos encarnados andavam deprimidos e acabrunhados devido à longa travessia no deserto do seu clube do coração, o que se reflectia numa menor motivação no trabalho. Se isto é realmente verdade, que gente é esta? Onde é que trabalham para se poderem dar ao luxo de trabalhar menos se o SLB não ganha? Se isto é verdade, então, meus amigos, os benfiquistas são fracos mentalmente. Vão-se abaixo nas adversidades, não têm força para lutar quando as coisas correm mal, à semelhança aliás do seu clube. E a propaganda diz-nos que são seis milhões, ou seja, é o país em peso. Os outros clubes não devem ter simpatizantes, existem apenas para atrapalhar a caminhada para a glória do SLB, perdão, do “país”, da “nação”. O SLB é, definitivamente, o clube de todos os regimes. Com uma diferença: o de agora é muito pior do que o de há 40 anos.

Por: José Carlos Alexandre

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