Jesué Pinharanda Gomes vai ser distinguido, no próximo dia 20 de março, pela Universidade da Beira Interior (UBI) com o grau de Doutor Honoris Causa.
Como esclarece a UBI, a concessão do grau de Doutor Honoris Causa destina-se «a homenagear personalidades eminentes, nacionais ou estrangeiras, de reconhecido mérito nos domínios do ensino, da ciência, da cultura, da arte e das atividades sociais, que tenham contribuído para o engrandecimento de Portugal ou da Universidade». De facto, Pinharanda Gomes é uma figura destacada da nossa cultura, com uma vasta obra, em várias vertentes.
«Ao longo de décadas, Pinharanda Gomes foi e, felizmente, continua a ser, um dos mais prolixos hermeneutas da História e tradição do nosso pensamento filosófico. Investigador e sistematizador nato, jamais se deixou prender pelas etiquetas de historiador, ou de filósofo que também o é. Com a Universidade tantas vezes de costas voltadas para ele, jamais negou auxiliá-la, colaborando junto desta, sempre que solicitado, revelando continuadamente os mais nobres valores associados a uma integridade ética e humana, definidora apenas dos grandes Mestres». Estas palavras de José Almeida estão contidas no artigo “Para uma visão de Pinharanda Gomes sobre o Galaaz de Portugal”, que integra o conjunto de trabalhos inseridos num livro dedicado à obra e pensamento deste filósofo, ensaísta e investigador. “Pinharanda Gomes – A Obra e o pensamento, estudos e testemunhos” é a publicação que reúne as intervenções e testemunhos apresentados num colóquio promovido, há alguns anos atrás, pelo grupo de investigação “Raízes e Horizontes da Filosofia em Portugal”, do Gabinete de Filosofia Moderna e Contemporânea do Instituto de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
Natural de Quadrazais, concelho do Sabugal, onde nasceu em 1939, Pinharanda Gomes comentava-nos há alguns anos que, literariamente falando, é natural da Guarda; embora realizado em Lisboa, como nos dizia, foi na cidade mais alta de Portugal que lançou as primeiras raízes.
Numa das suas obras, Pinharanda Gomes escreveu que, «na esquina do tempo, e tendo saído da Guarda há muitos anos (parece que temos o destino da emigração) foi-nos concedida a graça de permanecermos fiel à mátria». Essa fidelidade tem sido constante, exemplar, de uma grandeza própria de personalidades de enorme saber e erudição mas simultaneamente simples, humanas e profundamente solidárias com a sua terra de origem.
A sua presença, frequente, em iniciativas realizadas no interior ou as intervenções proferidas sobre temáticas e personalidades ligadas à nossa região comprovam isso mesmo. Pinharanda Gomes «constitui, hoje, um exemplo vivo de um estudioso desinteressado, sem prebendas nem honras institucionais, fazendo do estudo erudito uma vocação de vida», como escreveu Miguel Real num dos textos publicados na obra atrás mencionada.
No conjunto vasto de títulos publicados por Pinharanda Gomes avultam três áreas: os contributos na História da Filosofia; as monografias da história da Igreja e os estudos regionais; este insigne homem de cultura tem-se afirmado um defensor convicto, e incansável, do nosso património histórico-cultural e outrossim dos valores humanos, mormente desta zona raiana.
Estamos perante um intelectual que honra o seu concelho, a Guarda, o país e todo o espaço da lusofonia. Em entrevista que nos concedeu, há alguns anos atrás, e que foi publicada na revista “Praça Velha”, Jesué Pinharanda Gomes questionado sobre qual das facetas (historiador, filósofo, crítico literário, ensaísta e conferencista) melhor se enquadrava no perfil de homem de cultura, realçava que tinha alguns livros de filosofia pura, nomeadamente o seu livro de estreia, “Exercício da Morte, O Pensamento e Movimento” – que é uma introdução, uma ascese filosófica – e que «naturalmente deveria ser por aí que eu deveria ter caminhado, e também o “Dicionário de Filosofia Portuguesa”, ou “Entre Filosofia e Teologia”. Ora o que acontece é que no mundo não estamos sós, estamos com os outros e, ou porque somos solicitados pelas pessoas, ou pelos temas, todos acabamos por nos dispersar por outras coisas; comigo aconteceu um pouco isso. Como desde muito cedo – ainda na Guarda – tive uma vocação para a pesquisa, quando fui para Lisboa, e passei a dispor de mais fontes documentais, iniciava muitas vezes a investigação de um tema; depois, à medida que investigava esse tema surgia documentação sobre outros e custava-me abandoná-la, pelo que tomava notas e assim foram surgindo estudos diversos, em várias disciplinas. Contudo, penso que pelo número de livros e estudos publicados, cabe-me muito melhor a classificação de historiador da cultura com a tónica na história da Filosofia portuguesa e também na história da Igreja contemporânea, da época moderna».
Pinharanda Gomes concluía depois que é «um hermeneuta da cultura, quer dizer, procuro interpretar os seres, os factos e as coisas do âmbito cultural, sobretudo do pensamento, mas de modo a preenchê-las com o meu próprio significado».
Este pensador evidenciava, ainda, a área da “historiografia filosófica” por ser neste âmbito onde tem «produzido maior quantidade de trabalhos de fundo».
Contudo, o seu labor, nesta matéria, não se tem circunscrito às edições já conhecidas: «Há uma atividade que não vem muito a público e que diz respeito às centenas de verbetes» que tem escrito para dicionários e enciclopédias, quase sempre assinados, ou com as letras P.G.
A atribuição do grau de Doutor Honoris Causa a Jesué Pinharanda Gomes é, pois, um justo reconhecimento pelo trabalho que tem desenvolvido, em prol da investigação e da cultura.
Por: Hélder Sequeira