No dia 13 de março um grupo citadino-litoral, autointitulado Movimento do Interior, veio à Covilhã para, segundo eles, ouvir as pessoas sobre as soluções para o Interior do país. Não eram mais de cinquenta, contando já com o grupo excursionista, e não fosse algum destaque dado na comunicação social e ninguém teria dado por eles. Tivesse sido uma iniciativa dos sindicatos e não faltariam quem dissesse que tinha sido umas pequenas dezenas, mas, como eram eles, logo houve quem dissesse, sem convicção, que eram perto de cem. Ainda bem que a comunicação social nos deu conta do evento e das suas profundas e muito radicais reflexões, já que dos relatos comunicacionais podemos retirar os seguintes:
1. O dr. Álvaro Amaro, presidente da Câmara da Guarda, que ainda recentemente admitiu mudar a sua militância partidária para Coimbra, dizia, com ideias ZERO, que somos todos culpados do estado a que chegou o Interior. Calculo que disse isto sem corar (na rádio não se vê), pois ele sabe muito bem que não somos todos culpados. Ele sabe que culpados são o PSD e o PS que governaram (ou melhor, desgovernaram) este país alternando-se no poder umas vezes sozinhos, outras vezes juntos e outras vezes com a muleta do CDS-PP. Ele saber sabe, mas, pensando que está a lidar com tolos, vai metendo tudo no mesmo saco para ver se passa por entre os pingos da chuva. Não esqueçamos que Silva Peneda, Miguel Cadilhe, Álvaro Amaro, Jorge Coelho tiveram responsabilidades governamentais e os seus partidos têm mais de 40 anos de governação e foram estes partidos do centrão que nos lançaram na situação em que nos encontramos.
2. O dr. Silva Peneda, multifacetado cavaquista, com aquele ar de sabe-tudo, confrontado com a questão dos custos de contexto para as empresas, como é o caso das portagens, sublinhou que a sua abolição pode não ser uma medida exequível e disse ainda: «A nossa atenção está centrada em medidas que possam ter impacto imediato. Nós cingimo-nos àquilo que pode ser praticável e isto vem a respeito das portagens. Elas existem porque foi assinado um contrato entre o Estado e algumas entidades privadas e abolir as portagens significa rever esses contratos todos. Há entidades privadas que podem não querer e podem recorrer aos tribunais. É muito bonito dizer que vamos abolir mas é uma questão que não tem uma solução no imediato». Ou seja: o tal movimento citadino-litoral já fez a sua escolha: entre alivar a população e as empresas do Interior do custo das portagens e o lucro das concessionárias da A23 e da A25 escolheu os lucros das concessionárias. Estamos devidamente esclarecidos. Com amigos destes o Interior não precisa de inimigos. Dias depois, na SIC, o dr. Jorge Coelho, citadino com larga experiência e farto rendimento em empresas de construção de obras públicas e também concessionárias de autoestradas, agora apresentado como empresário do queijo (o jeito vem-lhe do limiano. Lembram-se?), lá estava a perorar sobre o Interior e as soluções para o desenvolver. Falou, falou e falou e apenas duas ideias lhe saíram: o interior precisa de medidas RADICAIS e FORTES (em maiúscula para saírem mais sonantes) e o que é preciso é começar. Quanto a propostas concretas pouco mais de ZERO. No meio de tanta verborreia oca lá saiu a confirmação do que já sabíamos: o tal movimento citadino-litoral do Interior tem o alto patrocínio do Presidente da República e o apoio do primeiro-ministro. Mais claro não podia ser.
Não foi nada que não soubéssemos já! Todos sabemos que ainda não havia movimento e já o “selfie man” Marcelo os estava a receber para os incumbir da tarefa, não fosse o “diabo tecê-las” e as pessoas do Interior se agigantassem na exigência de medidas concretas e eficazes. Todos sabemos também que, imediatamente a seguir, o vertebrado Costa se disponibilizou para receber os “sábios contributos” de tão distinto grupo citadino-litoral. Não é por acaso que Álvaro Amaro, presidente dos Autarcas Sociais-Democratas, integra o núcleo duro de Rui Rio na direção do PSD e também não é por acaso que no movimento citadino-litoral também está o presidente dos Autarcas Socialistas. Tudo em família como se vê. Fica assim demonstrado que eu tinha razão quando afirmei que este dito movimento mais não visava que reeditar o centrão dos interesses e dos negócios, agora a pretexto de medidas para o Interior e quando disse que não pode salvar o Interior quem o lançou na desgraça. Percebe-se hoje melhor a razão da demissão da professora Helena de Freitas da coordenação da Unidade de Missão para a Valorização do Interior e a razão por que António Costa nada fez para a manter e a razão por que nada faz para relançar a UMVI e fazer da urgente revisão do Programa Nacional para a Coesão Territorial PNCT) um objetivo político estratégico do Governo. Digam o que disserem, façam o que fizerem, o Interior só tem futuro com políticas centradas no investimento económico e no emprego seguro e com direitos. Tudo o resto são panaceias, é aquilo a que já estamos habituados: Estudos; comissões e outras ilusões que têm sido uma mão cheia de nada.
O Interior dispensa os messias que sabem tanto de Interior como eu de lagares de azeite. É que só pode defender o Interior quem verdadeiramente o sente, o sofre e o constrói todos os dias.
Por: Luis Pereira Garra
* Coordenador da União dos Sindicatos de Castelo Branco
Comentários dos nossos leitores | ||||
---|---|---|---|---|
|
||||
|
||||