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«O número atual de vagas em Medicina gera médicos cuja formação fica incompleta»

Cara a Cara – André Fernandes

P- Porque defende a Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM) a redução das vagas em Medicina?

R- Trata-se de um problema de capacidades formativas. Não é possível garantir a qualidade da formação se o número de alunos, que são formados em simultâneo, for superior àqueles que efetivamente conseguimos formar. O ensino de Medicina obriga a uma grande componente prática, que exige experimentação e contacto com o doente. Todas as Escolas Médicas recebem atualmente um número de estudantes superior àquele para o qual foram projetadas, sendo que a capacidade de se adaptar à nova realidade foi já ultrapassada. Um estudo da ANEM indica-nos que, em anos clínicos, a média de estudantes por tutor no país é de 8, sendo que nalguns locais ascende aos 18! As “guidelines” internacionais indicam que este número deverá ser o mais baixo possível. Além de prejudicar a qualidade da formação, é também lesivo para a dignidade e privacidade do doente. Adicionalmente, existe um gargalo formativo no final do curso. Apenas entre 1.500 e 1.600 recém-graduados podem, também por uma questão de capacidade formativa, aceder à formação específica, e o número de estudantes que anualmente terminam o mestrado é superior. Isto irá conduzir invariavelmente à formação de médicos indiferenciados, sem especialidade, reprovável no atual contexto de prática médica. O número atual de vagas em Medicina coloca, portanto, em causa a qualidade da formação pré-graduada e gera médicos cuja formação fica incompleta.

P- Acha que há universidades a mais em Portugal a lecionarem Medicina?

R – Não, uma vez que as capacidades formativas das escolas médicas se encontram esgotadas. Reduzir o número destas apenas iria manter, ou mesmo agravar, este problema.

P- Como vê neste momento o ingresso dos jovens médicos na classe?

R- O contexto atual é certamente pior do que aquele a que nos habituamos a atribuir à Medicina nos últimos anos. Existem continuamente estudos que falam do “burnout” da profissão e nota-se uma enorme pressão económica para obter resultados a baixo custo, com sacrifício das condições de trabalho dos profissionais. Não sendo certamente a profissão que está em piores condições nos dias de hoje, é importante ter em consideração a sua exigência, quer a nível da formação quer do desempenho e a responsabilidade associada, quando avaliamos as condições da prática médica atual.

P- O que se pode fazer para melhor distribuir os médicos em Portugal?

R – Em primeiro lugar é necessário identificar quais são efetivamente as carências em cada região e em que especialidades. Com esse conhecimento poderemos promover ativamente incentivos para a colocação de médicos nessas áreas, ou uma maior capacitação dos serviços dessas áreas para atribuição de idoneidades formativas. A promoção ativa da formação pós-graduada em áreas carenciadas, além de garantir a existência de médicos internos durante pelo menos o período da sua formação, poderá também facilitar a sua integração posterior nessa região. Um maior investimento nas áreas carenciadas, no sentido de diminuir o fosso que possa existir em relação a áreas mais desenvolvidas, também aumentará a disponibilidade dos médicos nesses locais.

P- Quando terminar a sua formação pensa emigrar? Porquê?

R – Tudo dependerá das condições de acesso à formação e trabalho que me forem oferecidas. Naturalmente que gostaria de ficar no meu país, mas não o farei se não tiver acesso a uma formação especializada ou condições de trabalho que me permitam exercer Medicina em pleno e com qualidade.

P- Que projetos tem para o mandato à frente da ANEM?

R – A missão da ANEM é representar todos os estudantes de Medicina de Portugal, nacional e internacionalmente, assegurando a qualidade da educação médica e de saúde. Pugnamos pela defesa dos interesses dos estudantes e da qualidade da formação médica em Portugal, como por exemplo através da proposta apresentada sobre a necessidade de Planeamento Integrado da Formação Médica em Portugal. Adicionalmente organizamos anualmente inúmeros projetos orientados para a comunidade, nomeadamente atividades de rastreios e promoção da saúde da população, como o “Med On Tour”, ou de sensibilização para a Saúde Pública, Direitos Humanos e Saúde Sexual e Reprodutiva nas Escolas Básicas e Secundárias do país, com o projeto “Educação Para Todos”

Perfil:

Presidente da Associação Nacional de Estudantes de Medicina

Idade: 22 anos

Profissão: Estudante de Medicina

Naturalidade: Covilhã

Livro preferido: “O Lobo Branco”

Filme preferido: The Prestige

André Fernandes

Sobre o autor

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