É inegável que o produtor Arthur Freed, juntamente com o talento dos realizadores Vincente Minnelli e Stanley Donen e dos atores Judy Garland, Fred Astaire e Gene Kelly, conseguiu, numa perspetiva generalista, a melhor colheita de musicais clássicos.
Porém, inquieta-me saber que os também bons produtores Jack Cummings e o Joe Pasternak, bem como os realizadores e estrelas a eles associados, estão a correr o risco de entrarem num rio bravo sem retorno, ficando esquecidos para todo o sempre. Há musicais a serem descobertos, reivindicados. Há maravilhas ocultas que não me canso de procurar e desvendar. Pasternak tinha o lema “nunca fazer pensar uma audiência” e, inegavelmente, levou à letra tal premissa, dado os seus filmes na MGM estarem repletos de uma aura kitsch apetitosa, embrulhada por uma estética opulenta, banhada em technicolor e envolta por um belo laço cor-de-rosa. Depois da sua estupenda etapa monocromática com Deanna Durbin na Universal, Pasternak, já em casa do Leão, conseguiu extravagantes proezas com os seus musicais operáticos, deixando brilhar na sua total plenitude Kathryn Grayson (que eleva a sua voz trémula no clássico “Anchors Aweigh”) e a melhor cantora Jane Powell, que ainda está connosco e que nos deixou, a meu ver, encantadoras interpretações em musicais adolescentes como “Holiday in Mexico” e “A Date with Judy”.
A simpática June Allyson, a nadadora Esther Williams e a “sexy girl next door” Gloria DeHaven são outras estrelas que conseguiram brilhar sob a mão de Pasternak e que, tal como o produtor, merecem ser reapreciadas. Cummings deixou-nos filmes mais emblemáticos, respeitados, como “Three Little Words”, “Kiss Me Kate” (Grayson nunca esteve tão bem), o clássico “Seven Brides for Seven Brothers” (embora seja o mais conhecido filme de Powell, o meu favorito é mesmo o injustamente subvalorizado “Two Weeks with Love”) e o melhor filme de Elvis Presley, “Viva Las Vegas” (acompanhado por uma belíssima e energética Ann-Margret). É interessante constatar que os filmes mais conhecidos de Grayson e Powell foram produzidos por Cummings e não pelo seu principal “mentor”, Pasternak.
Não nos esqueçamos de celebrar igualmente diretores que trabalharam frequentemente com Pasternak ou Cummings, como Henry Koster, Norman Taurog, Richard Thorpe, Charles Walters e George Sidney. Pessoalmente, aprecio mais os musicais de Walters e Sidney aos de Minnelli. É certo que não têm o mesmo nível artístico mas, caramba, têm uma mão cheia de filmes agradáveis, refrescantes, alguns deles verdadeiros clássicos. Foi Walters quem pôs Williams a nadar com o Tom e Jerry e Garland a interpretar o seu icónico “Get Happy”. Sidney, um dos meus realizadores de eleição, fez Sinatra e Hayworth brilharem em “Pal Joey” e, conseguindo acompanhar os novos tempos, deixou Elvis menear as ancas naqueles tumultuosos anos 60.
Vivemos numa época de mediocridade assombrada por um fantasma pseudointelectual e pretensioso que valoriza um filme apenas se ele for “chato” (porque isto é sinal de alta cultura). Nada mais revoltante. Há filmes “lights” encantatórios e devemos ter capacidade crítica para os valorizar. Afinal, o cinema é essencialmente entretenimento.
Miguel Moreira