Arquivo

«O município de Foz Côa não tem endividamento líquido e tem excedente de fundo de maneio»

Entrevista a Gustavo Duarte, presidente da Câmara de Vila Nova de Foz Côa

P – Até que ponto é importante a atribuição do Prémio de Arquitetura do Douro ao Museu do Côa?

R – É com muito prazer que vemos que o Museu teve mais um prémio. Já não é o primeiro, nem o segundo, já foi premiado na Alemanha e no Azerbaijão, pela Associação Internacional de Arquitetos. Esta é também uma forma das pessoas poderem visitar este ex-libris de Foz Côa na arquitetura. Aproveitando a realização do jantar vínico no Museu do Côa, esta é também uma forma de levarmos ao Museu as pessoas que vêm ao festival e que poderão aproveitar para ver in loco o edifício que ganhou o prémio de arquitetura do Douro 2013/2014. Além das paisagens, do Parque Arqueológico e do Museu do Côa, temos outro projeto que já está acabado e que também estou convicto de que irá ter bastantes prémios na área da arquitetura, o Centro de Alto Rendimento do Remo, no Pocinho. Já é capa nas maiores revistas de arquitetura da Europa e uma revista alemã classificou-o como um dos 100 melhores edifícios do mundo em 2013. Foz Côa é o único concelho com dois patrimónios mundiais e o futuro passa por aqui. É com o património, o turismo, os produtos endógenos e é esta simbiose do vinho, do azeite, da amêndoa, do xisto com a riqueza patrimonial, com estas belas paisagens e também com a simpatia e a hospitalidade das pessoas do Douro Superior que me fazem acreditar no futuro desta região e deste concelho.

R – O Museu do Côa não é apenas o resultado de uma boa intervenção arquitetónica mas também de uma habilidosa forma de fazer um edifício grandioso num território inóspito que quase nem se vê?

P – Este Museu, além da riqueza no interior, foi integrado na paisagem como um miradouro natural e as pessoas deslumbram-se. Quem faz os cruzeiros no Douro, quando começa a avistar o Museu, não fica chocado – ao contrário do que muitas vezes se vê por esse país fora e por este mesmo Douro, onde há alguns edifícios que podem chocar pela sua presença. Este é o segundo maior museu do país em área coberta mas está completamente integrado até pela cor amarelada do xisto e bem encastrado na encosta, pelo que passa completamente ou quase despercebido. Os arquitetos estão de parabéns e os prémios que o Museu do Côa tem recebido são de toda a justiça. Estou convicto que, e é esse o feedback que temos, quem nos visita vai bastante bem impressionado com esta obra.

P – Já há novidades em relação à conclusão das obras do Centro de Alto Rendimento do Remo?

R – As obras estão concluídas. O que falta é o mobiliário e a conclusão da piscina coberta. Já fizemos a reformulação da candidatura para ainda podermos ter acesso no atual quadro comunitário a verbas para aquisição de mobiliário e concluir a piscina. Espero que muito brevemente, ainda antes do verão, essa candidatura esteja aprovada para que o Centro de Alto Rendimento esteja aberto aos atletas de alta competição antes do fim do ano. Tem havido muita curiosidade e muita apetência por estas instalações, inclusive da Federação Internacional do Remo, com sede na Suíça. Já recebemos telefonemas a perguntar quando é que abre porque há muitas seleções interessadas em vir estagiar para o Pocinho. É outra infraestrutura que vai contribuir muito para dinamizar e trazer gente a esta zona. Para completar o “puzzle”, também posso dizer que foi recentemente apresentado pela equipa projetista a primeira versão dos estudos do Parque Temático. Está a avançar a parte dos estudos de mercado, de conteúdos e da localização, está candidatada e espero que num futuro próximo possamos dar o pontapé de saída.

P – Já está previsto qual será o investimento no Parque temático?

R – A equipa projetista foi visitar vários parques temáticos à Noruega, Dinamarca, em localidades da dimensão de Foz Côa, e a perspetiva que temos é de que se deve começar com os pés bem assentes e com uma coisa que possa ir crescendo. Para primeiro investimento ou primeira fase, os estudos apontam para cerca de sete a oito milhões de euros, mas também é um dado adquirido ser construído numa localização que permita aumentar futuramente. Há algumas coisas em aberto, se se aposta mais na parte mecânica dos equipamentos ou nos espetáculos. Há ainda muita coisa a afinar, mas a grande aposta será claramente o lazer, a evolução do homem desde o paleolítico, mas é evidente que, sendo um parque temático, os vinhos vão ter uma importância fundamental. Não tenho dúvida nenhuma disso, como até a própria geologia. A formação das gravuras e do território também vão ter alguma importância. Não podemos esquecer que estamos a quatro horas de automóvel de Madrid, há aqui um potencial a aproveitar que passa também pela vizinha Espanha.

P – Qual vai ser a localização?

R – A localização ainda não está definida mas provavelmente será próximo do Museu do Côa, que pode ficar ali também como uma referência daquele parque. Felizmente já temos algumas pessoas ligadas ao setor turístico interessadas e com curiosidade de ver o que vamos fazer e, inclusive, à partida, com disponibilidade para serem também parceiras neste investimento. Essa seria a “cereja em cima do bolo” e é para isso que trabalhamos. É evidente que não é fácil, mas é também de desafios que gostamos e vamos fazer tudo o que for possível, e as coisas estão a correr bem, para que neste mandato autárquico o Parque Temático seja uma realidade. Há algumas espécies de parques temáticos no país, mas como os projetistas tiveram oportunidade de dizer na apresentação, parque temático em bom rigor não há nenhum. Também aqui queremos ser pioneiros, como fomos na Internet e noutras coisas.

P – Foz Côa é um bom exemplo…

R – As pessoas gostam muito de se queixar mas no concelho de Foz Côa, mais do que queixar-nos, gostamos de fazer, de arriscar e de investir. Não é por acaso que nestes últimos quatro anos Foz Côa teve, pese embora todas as dificuldades conjunturais, o maior investimento de sempre no concelho. Em quatro anos investimos cerca de 20 milhões de euros. Ao contrário de muitos municípios da região, Foz Côa orgulha-se de não ter perdido nenhum serviço público. Antes pelo contrário, até ganhámos outros como a Loja “Ponto Já”, que já era um anseio de algum tempo. Temos tido também o reconhecimento internacional de vários prémios, como o de “cidade amiga dos idosos”. Também investimos muito na área social e os últimos dados estatísticos e oficiais dão-nos muita satisfação, desde os do nível de vida, de há um ano da Universidade da Beira Interior. Depois o do poder de compra, em que fomos o concelho que mais subiu no índice de poder de compra da região, segundo O INTERIOR.

P – O concelho também surge bem posicionado no índice das exportações?

R – Sim, recentemente tivemos mais outra boa referência no índice das exportações, que também soubemos através de O INTERIOR. Foz Côa é o quarto concelho do distrito e depois tive curiosidade de ir à página oficial do Instituto Nacional de Estatística e cheguei à conclusão que, por exemplo, em Bragança só a capital de distrito é que exporta mais e em Vila Real e Castelo Branco sucede praticamente o mesmo. E, na minha perspetiva, os 4,5 milhões de euros de exportações que o nosso concelho tem estarão vistos por baixo, porque nos vinhos há ainda muita exportação que está indexada a outras zonas como Gaia ou até Estremoz. Por isso, acho que este valor na realidade ainda é maior. Ainda assim, os dados do estudo dão-nos uma posição extremamente lisonjeira porque não podemos concorrer com a Guarda e Seia, que estão à frente, e mesmo a capital de distrito sabe-se que é quase exclusivo de uma empresa. Depois surge Celorico da Beira, mas a seguir a esses três concelhos aparece Foz Côa. Penso que estamos no bom caminho para que dentro em breve possamos subir exponencialmente na área do vinho e até mesmo do xisto. Sentimo-nos muito satisfeitos e orgulhosos com este volume de investimento e com o desenvolvimento que estes índices traduzem. Também nos orgulhamos muito de dizer que, em termos financeiros, o município de Foz Côa não deve praticamente nada a ninguém. Penso que não haverá muitos no país com uma situação desafogada como a nossa. Tentamos sempre mandar fazer e pagar porque também queremos ser dinamizadores do comércio e da indústria local, caso contrário pode ser um problema que criamos. Penso que daqui a um mês ou dois, se calhar, a Câmara de Foz Côa não deve um tostão a ninguém e isto também é importante. De acordo com o Revisor Oficial de Contas, nos termos do artigo 36 da Lei das Finanças Locais, o município de Foz Côa não tem endividamento líquido e tem excedente de fundo de maneio.

P – Como perspetiva o futuro?

R – Pela primeira vez, no próximo quadro comunitário haverá maior discriminação positiva em termos do interior e de certos investimentos que só serão comparticipados se forem localizados em determinadas regiões do interior. Isto vai fazer com que os investidores possam ter que optar por localizar a empresa no interior, pois os incentivos são maiores. Há aqui uma mudança de paradigma. Fico muito contente com estes índices que vamos vendo porque dão-nos algum conforto e, pelo menos, a ideia de que estamos no bom caminho. É por estes motivos que estou convicto que o futuro desta região vai ser muito promissor. Tenho contactos com vários operadores do Douro e alguns têm tudo vendido até 2017. Há um operador, talvez o maior do Douro, que no ano passado tinha sete a oito barcos semanais para Barca d’ Alva e este ano vai ter 10. Há aqui uma oportunidade que temos que agarrar e com estas condições, estes produtos de excelência e os rios Côa e Douro, penso que está aqui uma encruzilhada de futuro e potencialidades que poderão em breve vir ao de cima.

P – O turismo é um setor importante para o concelho?

R – Oxalá que a crise vá abrandando, há sinais ténues de que isso poderá acontecer, mas é evidente que isso também tem influência, pelo menos, no turismo nacional. A prova disso é o decréscimo de afluência dos turistas portugueses no centro de informação turística ou no Museu, mas, em contraponto, tem havido um aumento dos estrangeiros. Na Fundação Côa Parque vamos assinar em breve um protocolo com um operador australiano, que, a partir de 2015, se compromete a colocar aqui 2.500 pessoas por ano. Há boas notícias, há potencial, oxalá saibamos ser dignos dele e por isso é que digo que mais do que lamentar-nos há que trabalhar. O volume de obras que temos tido não era possível se não tivéssemos aproveitado da maneira que aproveitámos os fundos comunitários. O emprego também tem subido e de uma forma exponencial no setor dos vinhos. Segundo dados oficiais, o concelho de Foz Côa teve 11 milhões de investimentos nos últimos dois anos só na agricultura e essencialmente no vinho.

«A região do Douro Superior tem dos melhores vinhos do mundo»

P – Quais são os grandes objetivos e as suas expetativas para esta edição do festival?

R – Os objetivos passam pela dinamização e promoção deste produto de excelência que temos no Douro, bem como trazer pessoas ao concelho e à região. O Douro Superior é uma região privilegiada nesse aspeto, pois, fruto do seu microclima e dos solos xistosos, produzem-se aqui dos melhores vinhos do mundo. Nos festivais anteriores tivemos entre cinco a seis mil pessoas só no fim-de-semana. É uma aposta já ganha e queremos continuar nesta senda de ir aumentando, se possível, o número de visitantes. Vamos ter 72 stands com 59 produtores de vinho, 10 de sabores e três tasquinhas. Já estão praticamente todos os produtores de vinho do Douro Superior e não há muito mais por onde crescer. Este certame circunscreve-se apenas ao Douro Superior mas mesmo assim vamos ter um acréscimo de expositores, especialmente nos sabores. O Festival do Vinho vai ser inaugurado pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro, que também visitará o Museu. Vem inaugurar oficialmente o evento e também vai visitar outras infraestruturas do concelho.

P – Vai haver uma maior aposta nos sabores, desde a amêndoa aos doces?

R – Sim, desde o primeiro certame que também acolhemos alguns stands de sabores e de azeite, outro produto magnífico que temos na região. No ano passado já fizemos provas comentadas de azeite, que vamos manter. É um pouco integrar não só os vinhos mas também os sabores do Alto Douro. Vamos ter produtos endógenos, como a amêndoa, os fumeiros e alguma doçaria, mas é evidente que a alma deste festival é o vinho que é o produto desta região mais reconhecido no estrangeiro. Este ano vamos ter também algumas novidades. Pela primeira vez vamos fazer um jantar vínico na sexta-feira, dia da inauguração, pelas 21h30, com o chefe Marco Gomes, distinguido com o prémio “Garfo de Ouro 2014” pelo guia “Boa Cama, Boa Mesa” do jornal “Expresso”. Vamos conciliar a gastronomia local com os vinhos locais num momento de glamour que vai decorrer num ambiente apropriado e numa paisagem magnífica como é o Museu do Côa, com um chefe de moda que tem origens em Trás-os-Montes. Penso que pode ser a “noite de gala” deste festival e a nossa ideia é que traga gente, mas também que lhe dê aquele glamour que também às vezes é preciso nestes certames. Vamos ter também animação de rua, visitas a quintas e provas comentadas de portos, brancos, tintos e azeite. E ainda, como é habitual, um artista de renome, que este ano é a Mariza, que não necessita de apresentações. Estão criadas todas as condições para que seja um festival de excelência que possa promover e trazer gente ao Douro Superior.

P – O festival é também um momento em que as pessoas podem provar e adquirir os mais diferentes vinhos e produtos da região?

R – Exatamente, este certame permite a quem nos visita, por um lado, provar os vários tipos de vinhos que temos no Douro Superior, inclusive com as provas comentadas com especialistas na matéria para tentar desenvolver os conhecimentos, aprender como se serve um vinho, as temperaturas, etc. Todas estas provas são gratuitas, apenas sujeitas a inscrição. Quem nos visita pode desfrutar dessas provas, de visitas às quintas e também adquirir vinhos a um preço mais em conta porque durante o festival todos têm desconto.

P – O que mudou para que cada vez mais o Douro Superior esteja na moda, tanto em termos do produto final como de grandes produtores que andam a arar as terras áridas do Alto Douro?

R – O Douro tem três sub-regiões e a do Douro Superior é a que está neste momento na mó de cima pelas suas características próprias e por ter um clima tipo mediterrânico com pluviosidade muito baixa. É das zonas do país, a par de algumas partes do Alentejo, em que menos chove. Todas as características xistosas do solo, climatéricas e também de exposição das encostas fazem com que este vinho e esta região seja ímpar. No concelho, o único totalmente integrado na região demarcada, temos quintas emblemáticas, do tempo da Dona Antónia, como o Vesúvio ou o Vale Meão. Temos agora também produtores com prestigio noutras zonas do Douro que estão a comprar propriedades e a investir no Douro Superior. Por exemplo, a Quinta do Crasto que, não sendo originariamente do Douro Superior, já tem as suas plantações e as suas produções nesta região. Quem está dentro dos meandros do vinho sabe que o Douro Superior é uma região ímpar em termos de qualidade.

Luis Baptista-Martins / Ricardo Cordeiro

Sobre o autor

Leave a Reply