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O inacreditável

Bilhete Postal

Escrevo com o sangue da revolta, empunhando a caneta que leva gente de Tottenham ou de Madrid, ou grega às ruas. A revolta dos que cumprem e se empenham, a revolta dos que trabalhando não encontram saída, a revolta dos que têm de dar aulas na indisciplina, dos que têm de aceitar a ignomínia de subsídios a quem não cumpre. A revolta de quem vê inspeções ao lado de tudo o que afinal importa, a violência de quem percebe que da justiça não vêm as linhas de conduta. Escrevo porque me apeteceu beber desse copo vermelho em que a cólera se expõem e em que os músculos se retesam, as mãos suam e os socos se distribuem. Indignado das reformas que pedi e ninguém quis fazer. Indignado das injustiças que relatei e simpatias, acordos sujos, amizades interesseiras branquearam. Bebi do copo em que se fala da Parpública (Decreto-Lei n.º 209/2000, de 2 de Setembro) da Estamo (Número de Pessoa coletiva 503 152 544) e de indemnizações na TAP, CGD, REN e tantas siglas onde se acoitam indignidades e se delapida o património do Estado e se penitencia os contribuintes a coimas e taxas e humildade no pagamento. O inacreditável é haver 80% dos custos com saúde atribuídos a uma minoria de instituições (como S. João, Sta Maria, HUC, CHC) e todas elas se terem esquivado a investigações externas e haver Hospitais distritais fiscalizados 6, 7 e 10 vezes. Um Estado que utiliza as suas inúmeras entidades fiscalizadoras de modo peculiar e que não foi capaz de reformar o tempo de resposta da justiça. Neste copo de que bebi está a doença da revolta, o fanatismo de quem se farta, a demência de quem um dia sai à rua. No copo havia mais siglas, BPN, BPP, EDP, Águas de Portugal. Inacreditável quererem privatizar um bem público. A água, o Sol, a Lua, o vento, são de todos nós. A eletricidade das barragens pagámos quando elas se construíram com os nossos impostos. Algo já pagámos nestas centenas de anos em que nos cobraram impostos. Pagámos as estradas, os campos, os direitos dos trabalhadores. Muito de tudo isto pagámos com sangue, com mortos e com transparência.

Hoje, o Estado deve-nos inspeção às instituições maiores, a quem gasta o dinheiro público, deve-nos explicação firme sobre as dívidas e onde foram construídas. Hoje, o destino é perceber os direitos inconfessáveis de uma REN ou de uma Parpública. Queremos nomes. Querermos ver os seus gestores no Prós e Contras, em entrevistas duras mas limpas. O inacreditável é o silêncio, a ausência de investigações e a ausência de decisões. Melhor, elas existem, mas onde não há qualquer vantagem, como aquele ridículo dos 5 ou 14 segundos da resposta do INEM, no Portugal onde podemos estar 12 anos à espera de uma decisão jurídica. Tenho de tomar menos disto ou ainda dou umas bengaladas num gestor qualquer.

Por: Diogo Cabrita

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