Quando ainda havia governo na Bélgica, um primeiro-ministro disse que a Europa era um gigante económico, um anão político e um verme militar.
Esta semana o gigante deu um ar da sua graça. O Tribunal Europeu de Primeira Instância rejeitou um recurso da Microsoft contra a decisão da Comissão Europeia, em 2004, de multar a companhia em 497 milhões de euros (a maior multa imposta pela Comissão) e obrigá-la a corrigir práticas comerciais, nomeadamente a vender Windows sem Media Player e fornecer a concorrentes códigos secretos que lhes permitam pôr no mercado “software” compatível com Windows. A Microsoft tem dois meses para recorrer mas, pelo menos por agora, não parece inclinada a fazê-lo. A Comissão Europeia exultou: “Esta sentença confirma a objectividade e a credibilidade” da política de concorrência da União, disse o seu presidente. “Essa política protege os interesses do consumidor europeu e garante concorrência limpa entre empresas”. Várias organizações europeias de protecção ao consumidor e algumas associações de produtores de “software” exultaram também. Outras, sobretudo nos Estados Unidos, ficaram indignadas, por entenderem que Comissão e Tribunal estavam a punir uma empresa que triunfara e que decisões assim eram travões ao progresso. (Debate comparável está em curso a propósito do apoio dado por bancos centrais à banca privada apanhada pelos créditos mal-parados do mercado imobiliário americano, entre os que aprovam esse apoio e os que o condenam, por entenderem que capitalismo sem risco não é capitalismo).
No caso do açambarcamento do mercado pela Microsoft, acho que a Comissão tem toda a razão – e reafirma de caminho o seu peso no mundo. Tinha-o mostrado já quando Mario Monti era comissário da concorrência e se opusera à fusão de dois gigantes industriais americanos, General Electric e Honeywell. A operação fora aprovada pelas entidades reguladoras dos Estados Unidos, mas a Comissão Europeia dissera que não e a operação não se fez. O castigo a Microsoft é ainda mais espectacular. Tanto poder resulta de os Estados membros da União Europeia terem decidido tratar a concorrência em comum, bem como o comércio externo. Fizeram-no no começo, quando eram só seis. Se agora os 27 fossem capazes de fazer o mesmo com a energia e o ambiente, outro galo cantaria aos europeus.
Isto, quanto ao gigante económico. O anão político está atrapalhado com o Kosovo e arrisca-se a cair em buraco parecido com o da Croácia em 1992. Se não houver agora acordo entre as partes, a coisa sensata a fazer é adiar por uns meses a independência do Kosovo. Mas por influência americana alguns acham que não. Para falarem ‘com uma só voz’, os outros são capazes de ir por eles e, em nome da Europa, armar mais um enorme sarilho nos Balcãs.
O verme militar continua fraquinho, mas isso não faz grande diferença porque a NATO está de boa saúde e, embora alguns políticos de vez em quando se distraiam, os militares nunca se esquecem dela.
Por: José Cutileiro