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O espírito, a razão e o governo

Crónica Política

Neste Velho Portugal, feito de muitos servos e de alguns senhores, o Diário do reino e o Boletim dos Mercados não anunciam boas novas. Pelo menos para a imensa maioria.

Depois do óbolo dos vencimentos, dos subsídios, das portagens, dos impostos e da idade da aposentação, chegou a vergasta das pensões.

Tudo isto em nome das “reformas”, palavra que já fede. A nojo e a hipocrisia, pois tem

sido usada para legitimar a mais criminosa das roubalheiras. As “reformas” na ponta da língua estão para a crise como as indulgências da Igreja estavam em tempos para os pecados. Só que nessa altura as indulgências eram vendidas a quem as quisesse comprar. Hoje, as “reformas” são impostas a quem não as quer.

Recentemente, cerca de 15 mil pensionistas foram notificados pela Segurança Social do corte no valor da pensão que, nalguns casos, poderá cair para metade. Houve pensionistas que receberam a carta no próprio dia em que o corte foi efetuado! Esta tesourada, recorde-se, acontece em 2012, ano já de si muito penoso devido aos aumentos nos custos das rendas, dos transportes, da saúde e de outros bens essenciais.

A justificação governamental, de que se trata da aplicação de uma lei de 2007, não colhe. Desde logo por ter sido uma lei do PS, mas, recordemos, aprovada com os sacrossantos votos do PSD!

O argumento, estafadíssimo, é o de que são pensionistas «que recebem para lá da sua pensão um complemento». Curioso que não se vislumbre nenhuma medida que afete proporcionalmente as reformas douradas, nomeadamente dos políticos, que, como se sabe, nem sequer precisam de “complemento”!

Vergonhoso!

De acordo com a Comissão Europeia, dos seis países europeus mais afetados pela atual crise, Portugal é o único onde as medidas de austeridade estão exigir mais aos pobres do que está a ser pedido aos mais ricos.

O estudo não leva ainda em consideração as medidas implementadas na sequência do memorando assinado com a troika, nem tão pouco aquelas com que a nova maioria de direita atropelou ideologicamente tal documento. O que só nos pode fazer temer por aquelas que ainda estão para vir.

Há várias formas de pobreza. Até há uma coisa chamada pobreza de espírito. Mas, ainda que tenham origem diferente, conduzem sempre ao mesmo resultado final. Sim, porque um homem com fome, seja devido à sua pobreza ou à outra pobreza de alguém, não será nunca um homem livre.

Há quem diga que não precisamos de um programa contra a pobreza, mas de um programa contra os ricos. Eu não concordo. É que aos ricos, por vezes mais pobres do que os outros, não há programa que os salve!

Como dizia Luis Felipe Angell, a única coisa que os pobres têm é mesmo a razão. Este governo só está a tentar que também essa lhes seja sacada…

Por: Jorge Noutel

* Deputado do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal da Guarda

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