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O embuçado que deu brado nas toiradas…

Agora Digo Eu

A abolição, pura e simples, das toiradas em Portugal, proposta pelo PAN, tinha rejeição assegurada pois todos os interesses tauromáquicos e o comércio que lhe está associado é deveras superior a qualquer padrão ético.

Para a direita, a que ultimamente tem por aliado o PCP, «as touradas são um legado histórico, social e cultural» e, que reconhecidamente todos percebemos que são um espetáculo violento que implica sofrimento, sangue e morte.

Se por um lado a Assembleia da República aprova legislação prevendo penas para quem abandone e pratique maus tratos em animais, que dizer quando obstinadamente se espeta uma série de ferros pontiagudos no lombo de um touro? É esse o conceito histórico de cultura de Suas Senhorias ou é efetivamente a contradição de todas as contradições?

O tema toiradas não é novo. Tem história e barbas brancas. Assim, a 19 de setembro de 1836, a rainha, Dª Maria II assina um decreto proibindo as corridas de touros em Portugal. Claro está que nem um ano passou e o decreto foi revogado pela lei de 30 de junho de 1837 autorizando as touradas, mas sem touros de morte.

A lei nunca foi cumprida e já em plena República o governo viu-se obrigado a legislar atribuindo penas e multas aos prevaricadores, conforme disposições do Decreto 5:650, de 10 de maio de 1919, para se perceber que poucos ou quase nenhuns ligaram à legislação, o que fez com que o governo, através da portaria 2:700, de 6 de abril de 1921, determinasse que as polícias cumprissem as disposições do decreto de 1919.

Mesmo assim os toiros continuaram a ser mortos nas praças, de norte ao sul de Portugal, e, em abril de 1928, o decreto 15:355 referia taxativamente «Em todo o território da República Portuguesa ficam absolutamente proibidas as touradas com touros de morte». Exceção feita por uma permissiva e oportunista “lei de exceção” em 2002, que a direita e o PCP aplaudiram. A direita, porque é essa a sua filosofia e está sempre à rasca no Alentejo, necessitando de apoios e votos e, o PC, logicamente, para tentar manter o status.

Em 1980, a UNESCO declara «a tauromaquia é a terrível e venal arte de torturar e matar animais em público. Desnaturaliza a relação entre o homem e o animal, afronta a moral, a educação, a ciência e a cultura». Também a Declaração dos Direitos do Animal, datada de 15 de outubro de 1978, no seu artigo 3º refere que “nenhum animal será submetido a maus tratos nem atos cruéis» para mais adiante, no artigo 10º, adiantar «nenhum animal deve ser explorado para divertimento do homem» e acrescentar no artigo seguinte: «Todo o ato que implique a morte de um animal, sem necessidade, é um biocídio, isto é um crime contra a vida».

Cabe aqui e agora interpretar as estatísticas da Associação Prótoiro e verificar que em 2017 realizaram-se, em todo o território nacional, 205 espetáculos tauromáquicos, numa área de intervenção de apenas 80 municípios, com a presença de um total de espectadores que pouco ultrapassou os 400 mil.

Se assim é, e a acreditar nos números da tal dita associação, conclui-se que apenas 4% da população portuguesa esteve presente em praças de toiros e há cada vez mais Câmaras Municipais a impedirem este triste e bárbaro espetáculo.

Manda o bom senso que não haja necessidade de aprovar outra, e, quiçá, nova legislação, pois para além de serem cada vez menos adeptos, é só mesmo impedir a transmissão televisiva para que a divulgação deste deplorável e estúpido divertimento não chegue a casa de todos nós. É uma sugestão e seguramente um retrocesso nas pretensões “culturais” dos adeptos da tal dita afición.

Vem aí o mês de agosto. Mês de todas as festas. Festas em honra do santo padroeiro, com missa, procissão, a normal permissividade católica, apostólica, romana, banda, bailarico, boa comida, muita bebida e, claro está, toiros no largo ou na praça.

A tradição tem destas coisas. A tradição vence porque é tradição. Porque é mais forte. Porque tem raízes, tem fé e porque para além de ser proibido proibir, só desta maneira, o tal embuçado há de neste verão, neste mês de agosto, continuar a cantar de galo no seu já tradicional, típico e muito bem aceite brado nas toiradas…

Por: Albino Bárbara

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