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«O desafio da certificação dos produtos tem que ser assumido por todos»

Cara a Cara – Entrevista

P – A Feira do Fumeiro é uma aposta já consolidada?

R – É, de facto, um evento que se consolidou e que vai de encontro a uma preocupação nossa, que é apoiarmos sectores de actividade estruturantes e com um peso muito significativo na economia da região. No entanto, do ponto de vista financeiro, não é um evento que tenha interesse para a associação, pois perdemos sempre dinheiro. Este ano não foge à regra, já que o orçamento é de cerca de 34 mil euros e teremos que assumir, seguramente, um défice de 17 mil euros. Mas isso não é impeditivo de organizar este certame, porque é importante promover todo o sector agro-alimentar, ligado aos saberes fazeres tradicionais, aos enchidos, fumados, queijaria, lacticínios, doçaria e vinhos. Numa região como a nossa, a estratégia de desenvolvimento passa claramente pelo apoio a este tipo de empresas assentes em produtos endógenos, que os distinguem como produtos com personalidade própria. Por outro lado, em Trancoso, temos neste momento duas salsicharias industriais, cinco artesanais licenciadas e duas unidades industriais de lacticínios e 32 queijarias artesanais. Deste sector dependem directamente cerca de 200 pessoas, o que é interessante, e há algumas empresas com volumes de produção muito significativos. Temos indicadores do sector segundo os quais o concelho produz cerca de 1.200 toneladas de enchidos e fumados, o que corresponderá a 60 por cento da produção total da NUT III Beira Interior Norte, que produzirá pouco mais de duas mil toneladas.

P – Mas este evento serve também para atrair visitantes à região?

R – Não fazemos esta feira a pensar nos consumidores locais. Se assim fosse, o certame não faria sentido. O nosso objectivo, daí a promoção nacional, é trazer até nós alguns fluxos turísticos que se deslocam para este tipo de iniciativas, mas que vêm também para visitar a região. Aí é que estará a mais-valia, já que estamos a promover os nossos produtos tradicionais junto de consumidores das grandes áreas urbanas do litoral. Este ano, o ministro da Agricultura, que é natural de Almeida, visitará a feira no sábado.

P – Pelos dados atrás referidos, este sector agro-industrial é bastante dinâmico e tem alguma capacidade de penetração no mercado nacional. A que se deve esta situação?

R – Há algumas unidades com uma presença interessante. Hoje em dia não é difícil encontrar no mercado nacional, sobretudo nas grandes cadeias de distribuição, mas também no estrangeiro, produtos da Probalta, da Matibom e, seguramente, da Casa da Prisca. Este sector promove, fundamentalmente, a nossa identidade e, na sua grande maioria, trabalha com matéria-prima local, o que é uma garantia de qualidade. Há agora um vasto caminho a percorrer, que é o da certificação. Nesta matéria, a nossa região tem muito a fazer e este desafio tem que ser assumido pelos produtores e associações de desenvolvimento e empresariais, porque uma certificação de denominação de origem permite mais-valias significativas na sua colocação no mercado. A AENEBEIRA está empenhada nisso, mas haverá que reintroduzir algumas raças autóctones, que estão hoje ausentes e dispersas. Estamos, por exemplo, a tratar da certificação das sardinhas doces de Trancoso, enquanto especialidade tradicional garantida, cujo processo já foi apresentado à entidade competente no Ministério da Agricultura mas está pendente porque há nova legislação comunitária que ainda não foi transposta para a ordem jurídica nacional.

P – Acha que vai ser fácil fazer essa certificação?

R – Penso que sim, porque o nosso objectivo é defender os produtores da região e a legitimidade do produto em relação a um caderno de encargos que garante que aquela é, de facto, a receita original e não uma imitação.

P – Qual é este ano o número de participantes na feira?

R – Vamos ter cerca de 90 expositores, o maior número de sempre, registando-se um reforço em todas os sectores. Reduzimos a área de cada stand e anulámos uma tasquinha, tendo-se conseguido espaço para mais 18 stands no Pavilhão Multiusos. Acreditamos que esta opção vai tornar o certame mais atractivo. Por outro lado, é a confirmação de que esta é uma aposta ganha junto dos agentes económicos. O que nos deixa particularmente satisfeitos.

P – Esses participantes vêm de onde?

R – Como é óbvio, há uma preferência especial para os produtores da Beira Interior Norte, mas também acolhemos agentes das regiões vizinhas como o Douro, Serra da Estrela, Cova da Beira e Dão Lafões. Aliás, recusámos muitos interessados oriundos de outras zonas do país por entendermos que a sua participação neste tipo de evento não faz sentido.

P – Tem uma noção dos negócios efectuados durante a feira?

R – É uma feira de venda directa e penso que houve anos muito bons. 2005 terá sido o melhor, pois houve expositores de enchidos e fumados e queijarias artesanais com resultados perfeitamente extraordinários. Lembro-me de uma queijaria artesanal, já com alguma dimensão, que vendeu 200 queijos nesse certame. Fundamentalmente, o nosso objectivo é divulgar, promover este tipo de produtos e vender. Penso que os agentes económicos com uma maior vocação para o mercado e menos para o auto-consumo estão connosco e apostam claramente nesta feira.

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