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O castigo dos bons que não fazem política é serem governados pelos maus

Opinião

Para ajudar a construir uma sociedade justa e livre, o ato de participar politicamente é uma necessidade. Pois, não basta dizer que todos são livres e iguais como fazem a maioria das constituições existentes, se não nos dispusermos a assegurar condições políticas e possibilidades económicas para que as pessoas possam efetivamente gozar de liberdade e igualdade. Não se trata de mera concessão de direitos, é necessário efetivá-los de facto, mantê-los ou aperfeiçoá-los. As questões sociais e políticas não podem ser tratadas como se fossem problemas técnicos e resolvidas por burocratas. Todas as questões sociais e políticas pertencem à sociedade e a ela compete decidir e resolver, sendo para isso imprescindível uma consciência crítica e participativa. Pois já Platão nos dizia que «o castigo dos bons que não fazem política é serem governados pelos maus».

Nos últimos tempos, usamos com frequência o termo cidadania em qualquer discurso ou diálogo trivial, pois devido ao seu significado abrangente, a sua conotação tende a ser adequada e oportuna em inúmeras situações. Mas a verdadeira cidadania, hoje, deve estar bem presente no ambiente de vida e de convívio entre os homens, típico e próprio de um Estado democrático de direito, na defesa de uma igual dignidade social e económica. Exigindo-se a todos, o direito de participação e o dever de contribuir para o progresso social.

As más políticas, os maus resultados económicos do país, a promiscuidade dos políticos e as relações perigosas dos serviços de informação com o mundo empresarial, bem como, tantos outros fatores e realidades que aqui poderíamos enumerar, propiciam um cenário de descrença e de afastamento dos cidadãos da esfera política, favorecendo a permanência de práticas sem ética pautadas em princípios particulares e individualistas.

Verifica-se assim que o alcance da cidadania depende muito da transformação das relações de poder, que têm produzido concentração de riqueza, de informação e de saber à custa da pobreza, da ignorância e da exclusão social de milhares de pessoas. Da mesma forma, essa transformação deve acontecer nas relações sociais, com o fortalecimento de organizações comunitárias e com o surgimento de novos estilos de gestão pública, de ação coletiva e de liderança, possibilitando a inclusão da população nos processos políticos decisórios. Neste âmbito, os partidos deveriam ter um papel preponderante, aproximando-se e abrindo-se à sociedade civil, sendo um motor de participação cívica com bons exemplos de vivência democrática.

Para isso são imprescindíveis líderes apostados na defesa e na prática dos valores republicanos, muitas vezes esquecidos, que exigem honestidade, transparência, solidariedade, ética e simplicidade de quem verdadeiramente lidera. Líderes apostados no trabalho de equipa e na defesa de ideais, capazes de motivar, unir e com saber e coragem para assumir as vitórias, mas também as derrotas.

Basta de líderes com carreiras vertiginosas conseguidas à sombra de conquistas pouco democráticas; basta do voto por compadrio; basta do apoio oportunista e basta de lideranças bacocas, que vazias de ideias apostam no “show-off”, preocupando-se apenas em encher autocarros, auditórios e o largo do terreiro de militantes, e outros talvez disfarçados de tal. Basta de líderes que fogem ao debate e ao confronto público das ideias. Basta de líderes que na secretaria procuraram afastar ilegitimamente o seu adversário.

Dos líderes partidários, para além da sua capacidade de liderança, espera-se competência, idoneidade e capacidade de projeto com objetivos e ideias claras que produzam resultados sólidos. Mas, hoje mais que nunca, exige-se de um líder partidário a capacidade de credibilizar a própria política, pois só assim será possível promover uma cidadania participativa imprescindível à vida interna e renovação dos partidos.

Por: Joaquim Nércio

* Militante do Partido Socialista, concelhia de Seia

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