Arquivo

O ar do tempo

Editorial

1. Com o resultado das eleições legislativas há muitas pessoas que fazem extrapolações para outras eleições, nomeadamente para as autárquicas. Confesso que eu próprio, em sufrágios pretéritos, também fui tentado a fazer esse exercício, mas hoje não caio nesse erro: cada ato eleitoral tem as suas caraterísticas, o seu tempo, a sua contextualização e não se repete. O que é verdade é que muitas eleições se podem ganhar ou perder pelo “ar do tempo”, e este é laranja.

Na Covilhã, Carlos Pinto tem dominado de forma clara nas autárquicas. Nas legislativas, o PS resistiu e ganhou com um resultado muito acima da média nacional. Não é por isso que o PS poderá pensar que irá vencer nas autárquicas. Para isso terá de trabalhar muito, mesmo sendo certo que Pinto não será o candidato e o PSD tem dificuldades em escolher uma alternativa, mas quem tem o poder parte em vantagem, e na Covilhã o PSD tem o poder local e vai passar a ter o nacional.

Na Guarda, Joaquim Valente foi eleito pela máquina bem oleada do PS local e em nome da amizade com José Sócrates e dos benefícios que resultariam dessa proximidade. A máquina socialista está mais bem oleada que nunca, como se viu nas últimas autárquicas, nomeadamente graças aos muitos empregos que foram arranjados, mas já sobre os resultados da proximidade a Sócrates não é conhecida qualquer vantagem específica dessa amizade – e, por favor, não me falem do hospital, pois, e bem, o governo PS avançou com novos hospitais em vários pontos do país e até a moribunda cidade de Lamego tem em construção o seu novo hospital. O da Guarda é o cumprimento de uma velha promessa em que, não esqueçamos, os governos anteriores andaram a «arrastar os pés», mas que mais tarde ou mais cedo teria de acontecer, obrigatoriamente – em seis anos de governo Sócrates e câmara Valente, a Guarda não recebeu mais nenhum investimento digno de registo.

2. A vida financeira das autarquias está cada vez mais complicada. As promessas obrigam a determinados investimentos, muitas vezes sem critério, e a capacidade de gerar receitas é cada vez menor – com a crise, a construção, grande fonte de dinheiro nos cofres dos municípios, está praticamente parada por todo o lado e não há novas urbanizações ou empreendimentos para render milhões em licenças, assim, as câmaras municipais não conseguem inventar soluções e atrair novas receitas.

3. A Câmara da Guarda, como noticiou em exclusivo este jornal na passada edição, entrou no clube das autarquias que excedem o limite de endividamento de médio e longo prazo. No imediato a situação não é negra, mas, este “excesso de dívida” irá aumentar as dificuldades e os condicionalismos no futuro. Este ultrapassar o “limite de endividamento” significa um passar por cima das regras de gestão rigorosa das finanças públicas que é exigida a nível nacional e que algumas autarquias ainda não compreenderam. E, pior, significa matar o futuro da cidade e do concelho.

4. Em Pinhel, após o encerramento da fábrica de calçados Rohde, a autarquia teve oportunidade de adquirir por “pouco” dinheiro as instalações, não o fez. Foram compradas por um empresário local, que as tentou depois vender… à Câmara de Pinhel, com o triplo de mais-valias. A autarquia decidiu não comprar – e ainda bem – para não gastar “muito” dinheiro e opta agora por as arrendar por… 20 mil euros por mês. Assim, por ano, o município de Pinhel vai pagar por ano 240 mil euros de rendas, para ali poder organizar algumas atividades, feiras ou outros eventos. Em projetos de desenvolvimento do concelho, se houvesse imaginação e critério, com esse dinheiro a autarquia poderia candidatar empreendimentos estruturantes de um milhão de euros.

PS: A não perder, no próximo sábado, no café-concerto, uma conversa com Gonçalo M. Tavares.

Luis Baptista-Martins

Sobre o autor

Leave a Reply