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«O apoio ao doente, numa lógica de proximidade, é uma preocupação da Liga»

Cara a Cara – Carlos Oliveira

P- Que contributos vai trazer à luta contra o cancro no distrito a abertura da delegação na Guarda?

R- A abertura desta delegação teve em vista a descentralização de serviços da Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC). Nos últimos anos tem-se verificado um crescente aumento do número de utentes e de doentes que procuram os nossos serviços. Tendo a perceção de que os pedidos de apoio estão a aumentar, faria todo o sentido dar esta resposta à população do distrito da Guarda. O apoio ao doente, numa lógica de proximidade, é uma constante preocupação da LPCC, sendo que a criação desta resposta na Guarda irá certamente contribuir para melhorar a qualidade de vida do doente e da sua família. A Delegação vai ser essencialmente um ponto de proximidade e apoio, que contribuirá para a promoção da prevenção primária e secundária do cancro, o apoio social e a humanização da assistência ao doente oncológico.

P- Quais as atividades e valências previstas?

R- A Guarda já contava há 10 anos com o Movimento de Voluntariado “Vencer e Viver” (MVV) – apoio a mulheres com cancro de mama e seus familiares, passando agora a captar mais serviços para o doente oncológico e iniciativas de prevenção primária do cancro. Além do apoio emocional das voluntárias e dos materiais ortopédicos previamente existentes, estará também disponível um espaço de imagem onde as utentes poderão adquirir, a um custo mais baixo, próteses capilares, turbantes, lenços, etc. O MVV vai funcionar às segundas-feiras, das 14h30 às 16h30, e quartas-feiras, das 9h30 às 11h30. Com estas novas instalações, a cidade da Guarda ganha também uma extensão da unidade de Psico-Oncologia que providenciará consultas gratuitas de apoio psicológico especializado aos doentes oncológicos e familiares. Já o Grupo de Voluntariado vai desenvolver ali ações de sensibilização para a prevenção e diagnóstico precoce do cancro, de sinalização de situações de doentes oncológicos com carências socioeconómicas, de informação à população e de angariação de fundos, entre outras atividades.

P- Quantas pessoas já solicitaram apoio ou recorreram às valências existentes?

R- O Grupo de Voluntariado Comunitário (GVC) da Guarda, criado em 1973, tem uma média anual de atendimentos entre 90 a 100 utentes. Este recurso às nossas valências é importante. Como referi anteriormente, são objetivos deste GVC sensibilizar a população para a adoção de estilos de vida saudáveis; informar sobre a Instituição e seus serviços; colaborar no apoio social ao doente oncológico e sua família; na prevenção do cancro, como também angariar fundos através da organização do Peditório Nacional e de outras atividades. Os pedidos de apoio e o recurso às nossas valências refletem também o envolvimento da LPCC na comunidade. Destaco, por exemplo, a significativa participação nas caminhadas “Pequenos Passos, Grandes Gestos”, já que a iniciativa realizada na Guarda é a mais participada da região Centro. Desde 2010, estima-se que participaram nessas caminhadas na cidade mais alta mais de 8.000 pessoas e foram angariados cerca de 40 mil euros. Também no Peditório Nacional Liga, cujos donativos nos permitem custear os aspetos materiais de apoio ao doente e o desenvolvimento de iniciativas de promoção da saúde e prevenção da doença, assinala-se um amento em 2015 nos valores angariados. São números que expressam, sobretudo, o envolvimento da comunidade local nas ações e junto das valências da LPCC.

P – E que projetos tencionam desenvolver no distrito da Guarda?

R- A sensibilização, prevenção primária e deteção precoce do cancro são componentes chave da ação da Liga Contra o Cancro. Uma das vias para promover a adoção/modificação de comportamentos é a Educação para a Saúde que, pelo impacto positivo que pode ter na saúde das pessoas, deve ser um direito de todos os cidadãos em qualquer fase da sua vida. É por isso que, já no próximo 26 de fevereiro, o Núcleo Regional do Centro vai promover, na Delegação da Guarda, uma ação sobre “Cancro da Mama para Mulheres Cegas e Amblíopes”. Queremos aumentar e melhorar os conhecimentos sobre cancro da mama e sua prevenção junto destas mulheres e eliminar as barreiras suscetíveis de impedir a sua participação em processos de diagnóstico precoce. As nossas atividades têm o apoio do Grupo de Voluntariado Comunitário e MVV locais, outras das estruturas cujo envolvimento na comunidade a LPCC quer fortalecer. O nosso voluntariado é excecional. Estas pessoas são pilares fundamentais da instituição. Na LPCC o voluntariado representa o principal instrumento de humanização em oncologia, com todo o seu apoio de complementarização ao trabalho dos profissionais de saúde. Não só vamos continuar a formar os nossos voluntários – a importância dos aspetos formativos é um novo desafio do voluntariado em oncologia – como recrutar anualmente novos elementos. Aproveito para desafiar os leitores de O INTERIOR a conhecerem a nossa Delegação na Guarda e o extraordinário trabalho do Grupo de Voluntariado Comunitário da Guarda.

P- Localmente, quais são os principais constrangimentos para o trabalho do núcleo na região?

R. O êxodo rural e o decréscimo populacional são talvez os maiores constrangimentos à ação preventiva que a LPCC propõe, através do Programa de Rastreio de Cancro da Mama, na medida em que são influenciadores de menores taxas de participação. Hoje é consensual que o cancro da mama é um problema de saúde pública. Tem uma alta incidência e uma alta mortalidade, sobretudo na mulher. Atualmente, em Portugal surgem 6.000 novos casos por ano, ou seja 11 novos casos por dia, morrendo diariamente quatro mulheres com esta doença. O rastreio do cancro, cujo objetivo é reduzir a mortalidade através de um diagnóstico cada vez mais precoce da doença, é por isso uma forma fiável de detetar oportunamente, possibilitando tratamentos mais eficazes. Em outubro de 2015, a Liga assinalou 25 anos do seu Programa de Rastreio do Cancro da Mama. Desde o seu arranque identificaram-se na região Centro 6.935 casos, num total de 2,8 milhões de mamografias realizadas. Através da participação regular constata-se que a grande maioria dos tumores diagnosticados no rastreio são muito pequenos, muitas vezes não palpáveis e só vistos em mamografia ou ecografia ou em fase evolutiva não invasiva, permitindo assim tratamentos menos mutilantes e menos traumatizantes. Apesar de todos os constrangimentos inerentes à região, a Liga apela para que todas as mulheres residentes no distrito da Guarda, com idades entre os 45 e 69 anos, participem quando convocadas para o rastreio, que é realizado através de um exame simples e gratuito.

P- Qual é o panorama atual de doentes com cancro no distrito? E qual é a tendência?

R- No distrito da Guarda registamos por ano 400 novos casos de cancro. Este valor duplicou nos últimos 10 anos. Entre os cancros mais incidentes na região da Guarda está, em primeiro lugar, o cancro da mama/próstata, seguido do cancro colo retal.

Perfil:

Carlos Oliveira

Presidente do Núcleo Regional do Centro da Liga Portuguesa Contra o Cancro

Idade: 72 anos

Profissão: Médico Ginecologista

Currículo: Médico Ginecologista; Professor Catedrático aposentado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra; Presidente da Direção Nacional da Liga Portuguesa Contra o Cancro (Triénio 2010-2012); Presidente da Direção do Núcleo Regional do Centro da Liga Portuguesa Contra o Cancro (desde 2010); Presidente da Comissão Coordenadora da subespecialidade de ginecologia oncológica da Ordem dos Médicos.

Naturalidade: Ponta Delgada (Açores)

Livro preferido: “Guerra e Paz”, Lev Tolstói

 

Filme preferido: “A ponte do rio Kwai”

Hobbies: Filatelia (Medalha de Vermeil na Bélgica por selos sobre o cancro / sócio fundador da Seção Filatélica da A.A.C.)

Carlos Oliveira

Sobre o autor

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