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«Necessitamos de pessoas com sentido de missão, de amor, de coragem e de responsabilidade»

Cara a Cara – Daniel Lucas

P – Quais são as principais necessidades da Aldeia SOS? E carências?

R – A Aldeia SOS vive, como as diversas instituições, uma fase com mais turbulência. A crise económica nas famílias é uma realidade, e também afeta associações e instituições como a nossa. Ao contrário da imagem que podemos transparecer, diria muitas vezes enviesada, temos grandes necessidades. Nomeadamente de bens alimentares, de parcerias para minimizar custos de serviços; e de novos sócios e amigos que possam apoiar esta grande obra. Desde as condições físicas dos lares até à intervenção em psicologia, terapias e atividades extracurriculares, tentamos dar aos nossos residentes qualidade na intervenção formal e informal. Além disso, temos 17 colaboradores que dão resposta a este grupo de crianças/jovens diariamente. Tudo somado, é preciso uma gestão muito séria e minuciosa para que não falte nada. Todos os donativos, seja em bens alimentares, roupa, entre outros, são sempre recebidos por nós. Assim como auxiliamos os ex-residentes sempre que precisam, para que não se sintam abandonados nem sem retaguarda. Outra necessidade é a contratação de novas Mães SOS, que são colaboradoras remuneradas, com contratos de trabalho, formação interna e externa regular. Necessitamos de pessoas disponíveis, com sentido de missão, de amor, de entrega, de coragem, de compromisso, de responsabilidade e que saibam sentir a nossa essência com muita dedicação. Tem sido um desafio nos últimos 15/20 anos pela dificuldade de candidatos para este projeto. Quem estiver interessado pode procurar informações no site (www.aldeias-sos.org) ou mesmo na Aldeia SOS, na Guarda, e conhecerem a nossa obra.

P – O que é hoje a Aldeia SOS da Guarda em termos de acolhimento? Quem são os utentes?

R – Contextualizando os vários sistemas, previamente há o encaminhamento destas crianças que continua a ser feito através dos tribunais e/ou das Comissões de Proteção de Menores através de acordos de promoção e proteção realizados entre as partes. Quando a situação é decidida de forma harmoniosa e existe bom senso por parte da família biológica, a Comissão irá, em conjunto, decidir a favor do bem-estar da criança, ou, de maneira mais coerciva, através dos tribunais. A decisão é sempre tomada pelo superior interesse da criança. A essência das Aldeias de Crianças SOS continua a ser um modelo terapêutico familiar para crianças desprotegidas e em perigo. A nossa intervenção rege-se pelo modelo pedagógico das Aldeias SOS que assenta em quatro princípios: a MÃE – Cria uma relação afetiva com cada criança que lhe é confiada, providenciando-lhes a segurança, o amor, a ternura e a estabilidade de que necessitam. Como uma profissional em cuidados infantis, ela vive juntamente com as crianças, guia-as no seu desenvolvimento e gere o seu lar com independência. São senhoras disponíveis que dedicam a sua vida a cuidar destas crianças necessitadas, como filhos, constituindo o centro do trabalho pedagógico das Aldeias SOS. IRMÃOS E IRMÃS – Rapazes e raparigas de diferentes idades vivem juntos como irmãos e irmãs. Os irmãos biológicos nunca são separados. Estas crianças e a sua mãe SOS desenvolvem laços afetivos que duram uma vida inteira. A CASA – O lar familiar, com a sua própria rotina e ritmo, onde as crianças estão em segurança e sentem que pertencem a uma verdadeira família. A ALDEIA – As famílias SOS vivem em conjunto, formando um ambiente de convívio e ajuda mútua, partilhando experiências. Através da sua família, aldeia e comunidade, cada criança aprende a participar ativamente na sociedade. A aldeia é a ponte para a sociedade. Na aldeia, existe uma equipa educativa constituída pelo diretor, assistente social, psicólogo, auxiliares, educadores e voluntários que apoiam as mães SOS na sua missão. As crianças e jovens levam uma vida normal, vão à escola, aos centros de formação profissional, à paróquia, praticam desporto, convivem com as crianças e jovens da sua comunidade. Os residentes destinam-se a crianças até aos 12 anos de idade, que por alguma razão não podem continuar a viver com as famílias biológicas, no entanto, há crianças/jovens com mais idades porque estão inseridas numa determinada fratria e nós defendemos a não separação de irmãos. Estes residentes vêm de todo o país mas, devido à gestão de vagas que é centralizada no distrito (Guarda), damos sempre prioridade às necessidades locais. Relativamente às Mães SOS, há neste momento a possibilidade, depois de um processo interno e avaliação externa, de haver duas novas figuras. O Pai Social ou Casal Social, em que neste caso, um deles é colaborador da Aldeia e o outro trabalharia fora da Aldeia SOS. Contamos ainda com uma equipa técnica de psicólogo, assistente social, educadores e outros ajudantes não técnicos.

P – Têm capacidade para acolher mais crianças ou já atingiram o limite?

R – Encontram-se na Aldeia 26 crianças/jovens. Temos acordo com a Segurança Social para 26 utentes. No entanto, temos capacidade para acolher 30 residentes.

P – Relativamente a pedidos para acolhimento, têm tido uma evolução ou uma estagnação?

R – Infelizmente há ainda muitas famílias que não conseguem dar uma resposta adequada aos seus filhos. Os problemas atuais não são os mesmos de há 25 ou 30 anos, quando, sobretudo, existiam muitas crianças órfãs ou abandonadas. Atualmente, são crianças que sofrem de algum tipo de negligência por parte dos pais ou cuidadores.

P – Que projetos têm neste momento?

R – A nível nacional, e na Guarda a funcionar em pleno, temos o Acolhimento Residencial (Aldeia SOS) e o Centro de Apoio Familiar SOS da Guarda (CAFAP – Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Familiar). Esta última valência visa a prevenção e o fortalecimento da família. O Centro Familiar SOS da Guarda intervém com famílias desafiadas, colaborando com elas no sentido de restabelecer o equilíbrio familiar. Esta é uma resposta com três eixos de intervenção: Preservação familiar, Reunificação familiar e Ponto de Encontro Familiar. É um serviço de apoio especializado às famílias com crianças e jovens, vocacionado para a prevenção e reparação de situações de risco psicossocial mediante o desenvolvimento de competências parentais, pessoais e sociais das famílias.

P – Até hoje quantas crianças já passaram pela Aldeia SOS da Guarda?

R – Por esta Aldeia já passaram cerca de 50 crianças. Alguns, ainda com alguma dificuldade de integração, como acontece com vários jovens adultos deste país, reconhecendo muitos deles que saíram muito cedo daqui. Outros são pais e mães, já com famílias constituídas, integrados em pleno na comunidade, com uma vida ativa, quer profissionalmente como em fóruns associativos.

Perfil:

Diretor da Aldeia SOS da Guarda

Idade: 37 anos

Naturalidade: Orjais (Covilhã)

Currículo: Colaborador 2003 – 2007: ADM Estrela; 2008 – atualidade: Aldeia de Crianças SOS; Formação Académica: Educação de Infância (IPG); Serviço Social (IPL) e estudante de Psicologia (UBI)

Hobbies: Música, Benfica

Daniel Lucas

Sobre o autor

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