Arquivo

Nascer longe

Editorial

1. Mais uma vez, a sobrevivência das maternidades do interior está em causa. O ministro da Saúde foi categórico ao afirmar que as maternidades com menos de 1.500 partos por ano serão para encerrar. E será no Interior que mais maternidades irão encerrar. Esta situação é, em primeiro lugar, resultado da elevada desertificação e da baixa natalidade, que na Beira Interior é de 1,7 por casal, ou seja, nem sequer chega aos 2,1 da taxa de reposição, mas também da falta de uma política de natalidade em Portugal (a situação das famílias agravou-se inclusive com o ignóbil corte do abono de família).

Nas maternidades da Beira Interior nenhuma, isoladamente, consegue atingir os 1.500 partos. A Guarda tem uma enorme descida nos últimos anos, Castelo Branco regista uma ligeira descida e a da Covilhã cresce. Esta situação, evidencia que, ao contrário do que aconteceu no centro hospitalar da Covilhã, na Guarda tem havido erros e uma enorme falta de planeamento. Se no ano passado 188 mães do distrito da Guarda preferiram parir na Maternidade de Viseu, este ano, em seis meses, já houve 103 grávidas do distrito que escolheram o S. Teotónio para realizarem o parto. Os responsáveis da ULS da Guarda deveriam refletir a forma incompetente como deixaram degradar um serviço essencial como o da Maternidade ao ponto de não ser a primeira escolha para muitas das mulheres da Guarda e do distrito. Essa falta de planeamento e de qualificação do serviço vai ter consequências complicadas. Pouco haverá a fazer para salvar a Maternidade da Guarda – é tempo de mobilização política e cívica para tentar minimizar as consequências da inércia, da inabilidade e da incúria da direção do Hospital Sousa Martins e dos poderes instituídos da cidade.

2. Há perto de 400 mil “sócios-gerentes” em Portugal. E apesar de nunca se falar dos seus direitos, são os responsáveis por grande parte da dinâmica da nossa economia, pela criação de emprego e riqueza. Mais de metade é responsável por pequenas e micro empresas, com dois ou três trabalhadores, na área dos serviços, no comércio, em pequenas indústrias. E são contribuintes essenciais na sustentação da Segurança Social (juntamente com todas as outras empresas que pagam 23,75 por cento sobre o salário de cada trabalhador, claro). E com os trabalhadores que pagam 11 por cento do seu salário para terem proteção social e direito à reforma. Os “sócios-gerentes” pagam de taxa social única 10 por cento, sobre o respetivo salário, mais 21,25 por cento, sobre o seu próprio salário, que é responsabilidade da empresa (de que são sócios e gerentes). Ou seja, o sócio-gerente paga para Segurança Social 31,25 por cento do seu rendimento. Ora, os trabalhadores com menor proteção social são precisamente os que têm o estatuto de “sócio-gerente”: não têm qualquer apoio de âmbito material de proteção. Perante a crise muitos pequenos empresários claudicam face às dificuldades e encerram os seus negócios sem ter qualquer direito social – descontaram mais do que qualquer outro trabalhador (31,25 por cento do seu rendimento), mas ficam desempregados sem direito sequer ao subsídio de desemprego. Talvez por isso se fale muito de empreendedorismo, mas são cada vez menos os que estão disponíveis para empreenderem o que seja. (Declaração de interesses: sou sócio-gerente da empresa proprietária deste jornal).

Luis Baptista-Martins

Sobre o autor

Leave a Reply